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Pablo De Santis reconstrói a Buenos Aires da década de 50 para servir de pano de fundo à história de Santiago Lebrón | Daniel Mordzinski/ Divulgação
Pablo De Santis reconstrói a Buenos Aires da década de 50 para servir de pano de fundo à história de Santiago Lebrón| Foto: Daniel Mordzinski/ Divulgação

"Calisser nunca me falou da bebida, nunca me disse que a partir daquele momento podia e devia bebê-la. Naquele dia deixou a garrafa como por descuido, e depois apareceu outra no meu quarto. Na época eu chamava a garrafinha de "Beba-me", recordando as aventuras de Alice; só mais tarde descobri que os antiquários a chamavam de elixir."

Trecho de Os Antiquários, de Pablo De Santis.

  • Romance:Os Antiquários. Pablo De Santis. Tradução de Ivone C. Benedetti. Alfaguara, 198 págs. R$ 29,90.

O argentino Pablo De Santis bebeu da fonte do realismo mágico, marcante na literatura latino-americana das décadas de 60 e 70, e de Drácula, de Bram Stoker, para compor o ótimo Os Antiquários. A mistura de acontecimentos irreais com uma base histórica sobre a Buenos Aires da década de 50 compõe a narrativa bem estruturada de De Santis.

O escritor constrói os personagens e os ambientes de forma competente, mas não deixa de surfar na onda vampiresca, que tomou conta da literatura mundial nos últimos anos e desencadeou sucessos como Crepúsculo, de Stephenie Meyer, e suas cópias. A composição do texto prende o leitor e deixa uma dúvida: seriam os antiquários seres que sobrevivem à passagem dos anos por guardar relíquias antigas?

Santiago Lebrón, o personagem que narra a própria história, conta como chegou em Buenos Aires aos 20 anos para trabalhar com um tio no conserto de máquinas de escrever. Vira jornalista e se vê envolvido numa trama política, sendo cooptado para trabalhar para o governo argentino como informante do Ministério do Oculto. Reviravoltas, perseguições e Lebrón é salvo pelos antiquários, virando um deles.

Aí De Santis mostra a influência da literatura fantástica de Gabriel García Marquez e Julio Cortázar na narrativa. Usa uma história inverossímil, mas que seria até possível nas repúblicas latinas de meados do século passado – gastar dinheiro público para espionar supostos dons especiais de algumas pessoas –, para criticar governantes. A trama se passa durante o governo de Juan Domingo Perón, presidente argentino (1946-1955) que marcou e influencia até hoje a política daquele país.

Em nenhum momento De Santis cita Perón e o golpe que o derrubou do cargo é contado sem muitos detalhes no livro. Para quem conhece a história da Argentina, seus traumas, vai perceber a possível intenção do autor: falar de forma genérica sobre o passado que, como ele, assombra o país ainda hoje. Afinal, vemos a presidente Cristina Kirchner usar de expedientes muito parecidos com os de velhos caudilhos argentinos.

Vampirismo

A influência de Bram Stoker é perceptível em Os Antiquários pelo uso das características que criaram o mito do vampiro: a necessidade de se alimentar de sangue e a intolerância à luz do sol. Um romance impossível entre Santiago e Luisa – filha do Van Helsing portenho, professor Balacco, que persegue os antiquários – também está lá, mas com um desfecho diferente ao de Drácula e Mina, no original de Stoker. GGG

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