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"And the Oscar goes to... Two Sons of Francisco". Ouvir essa frase é, a partir de agora, o sonho do diretor Breno Silveira e da dupla sertaneja Zezé di Camargo e Luciano. A obsessão brasileira pelo Oscar deve vestir a camisa (verde e amarela, claro) de 2 Filhos de Francisco, cinebiografia dos cantores, fita selecionada pelo Ministério da Cultura na quinta-feira passada para concorrer a uma indicação de melhor produção estrangeira na maior festa do cinema mundial.

Como aconteceu nos últimos anos, o escolhido para tentar a disputa à estatueta dourada é um campeão de público: 2 Filhos de Francisco vai ultrapassar três milhões de espectadores neste fim de semana, assim como os recentes selecionados Cidade de Deus (2002), Carandiru (2003) e Olga (2004). Mas quais são os critérios para determinar que produção irá representar o Brasil no badalado Oscar?

A organização do processo está a cargo atualmente do Ministério da Cultura (MinC), através da Secretaria do Audiovisual – a tarefa era exercida anteriormente pela hoje esvaziada Ancine (Agência Nacional de Cinema), ligada à secretaria –, que forma a comissão de seleção. Até o ano passado, o júri era composto por cinco pessoas, representantes de diversas áreas da atividade cinematográfica – como produtores, organizadores de festivais, cineastas e críticos. Para 2005, houve uma sensível mudança: são sete os convidados e eles são apenas críticos de cinema – Andréa França, Jaime Biaggio, João Carlos Sampaio, Maria do Rosário Caetano, Paulo Santos Lima, Rubens Ewald Filho e Sérgio Moriconi.

O Caderno G conversou com três profissionais participantes de júris anteriores, que confirmaram que a comissão é soberana em sua escolha, não havendo interferências ou indicações do MinC (ou Ancine, anteriormente) para determinado tipo de filme a ser escolhido. O trio revelou os bastidores das seleções, comentando também as respectivas opções e a obsessão brasileira pelo prêmio. Pela diferença na composição dos convidados e pelos filmes concorrentes, as situações foram bem diferenciadas.

José Geraldo Couto, crítico de cinema da Folha de S. Paulo, participou do júri no ano passado (formado ainda pelos cineastas Carla Carmurati e Paulo Caldas, o distribuidor Luiz Severiano Ribeiro e o produtor e diretor André Sturm), que escolheu Olga, de Jayme Monjardim, como representante brasileiro. "Duas pessoas já tinham voto fechado em Olga, com o pensamento de que ele tinha mais chances no mercado externo e que iria agradar mais à Academia. Não havia nenhum filme forte naquele ano, nada que unisse os outros três para se opor e fazer frente à essa opinião sobre Olga. Daí ficou uma discussão que não saía do lugar e eles acabaram vencendo pelo cansaço.", diz o jornalista, ressaltando que, apesar do ocorrido, a votação foi limpa, sem contestação.

Luiz Carlos Merten, crítico de O Estado de S. Paulo, conta que também houve muita discussão para se definir o selecionado de 2001 – o grupo ficou dividido entre Bicho de Sete Cabeças, da estreante (na época) Laís Bodanzky, e Abril Despedaçado, de Walter Salles (que já havia conseguido a indicação final de melhor estrangeiro de 1998 com Central do Brasil), o contemplado. "Na época, uma revista semanal falou na ‘farsa do Oscar’, no ‘jogo de cartas marcadas’ para escolher Abril Despedaçado, mas foi uma batalha épica, a comissão rachou completamente", confirma ele, que preferia a fita de Bodanzky. "Nem me lembro qual foi o critério de desempate. Mas lembro que, naquele tempo, já havia essa obsessão do Oscar e perguntava-se qual filme teria a cara da premiação. E isso não tem nada a ver, alguns filmes que têm ganho essa categoria não tem a cara do Oscar, como (o bósnio) Terra de Ninguém", continua, ressaltando uma discussão que acaba vindo à tona nas comissões de seleção.

Para o crítico da Folha, tentar escolher um filme para agradar à Academia é algo muito complicado, pois não se pode adivinhar o que os seus membros vão pensar. "E isso geralmente nivela a seleção por baixo. O primeiro critério deveria ser a qualidade. Depois, caso haja um empate entre dois ou mais filmes da lista, poderia se pensar naquele que poderia ter chance no mercado americano. Essa idéia de tentar agradar é uma armadilha. Vamos começar a fazer filmes cada vez piores, comerciais, só para agradar a Hollywood?", questiona, lembrando também que os grandes momentos de prestígio do cinema nacional não foram com produções realizadas pensando-se no Oscar, como na fase do Cinema Novo.

Esdras Rubim, produtor de cinema e ex-diretor do Festival de Gramado, que participou em 2002 da comissão que selecionou, de forma unânime, Cidade de Deus, de Fernando Meirelles, diz que existe um clima meio ufanista, de Copa do Mundo, em relação ao tema. "Mas não tem nada a ver, ganhar o Oscar não vai modificar em nada o dia-a-dia do cinema brasileiro e quem participa diretamente da área sabe disso", revela. "Isso não é importante, mas o cinema brasileiro deveria ganhar um Oscar de uma vez para esquecerem disso. Mas o prêmio não vai avalizar nosso cinema, não vai resolver nossos problemas", completa Merten.

Nas entrevistas, o trio apontou 2 Filhos de Francisco como favorito à indicação, o que acabou se confirmando. A fita de Breno Silveira é um filme popular, tem apelo comercial, mas foi muito elogiada pela maioria da crítica. "2 Filhos é a mostra de que se pode fazer um filme popular digno, sem grandes concessões ao mercado", comenta Couto. Resta saber agora se a opinião do pessoal da Academia será a mesma. Os cinco concorrentes a melhor filme estrangeiro – e todas as outras indicações – serão divulgados em janeiro de 2006.

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