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O dramaturgo Artur Azevedo escrevia comédias populares a partir de suas observações sobre a vida burguesa carioca do fim do século 19. Mas, fazia rir sem perder a elegância e com uma boa dose de sarcasmo desferido contra a sociedade. É visível sua admiração pelo escritor francês Honoré de Balzac, que fez desfilar em suas obras uma vasta lista de tipos reunidos em sua Comédia Humana.

As Três Viúvas de Artur, adaptação que o projeto Aprendiz Encena, de Recife, trouxe ao Festival de Teatro de Curitiba, nos dias 25 e 26, como parte da Mostra Oficial, nasceu como uma homenagem ao dramaturgo, irmão mais velho de Aluízio Azevedo (O Cortiço). Por isso, segue à risca o estilo da época, sem se preocupar com inovações vanguardistas.

O que não impede que seja criativo. O espetáculo atualiza o "datado". Faz o público rir justamente porque se identifica com os conflitos entre homem e mulher, que, se não fosse pela ambientação de época, poderiam se passar em qualquer tempo.

O acerto talvez se deva ao processo de criação da montagem, baseada no equilíbrio entre a experiência de excelentes atores pernambucanos e a ousadia de diretores que dão suas primeiras investidas na função.

A subversão da hierarquia ator-diretor produziu uma montagem que impressiona por ser absolutamente despretensiosa e, ao mesmo tempo, comovedoramente honesta. Hilton Azevedo, ator de uma das três peças curtas reunidas no espetáculo, disse em entrevista ao Caderno G, publicada na edição do último domingo: "Sem querer ser cantores que atuam, tentamos ser atores que encantam, com muito trabalho e prazer pelo fazer teatral".

E não há como não se encantar pela alegria dos atores no palco, que cantam, entre uma peça e outra, músicas executadas ao vivo pelo maestro Deneil Laranjeira. Ele é responsável por deliciosas intervenções musicais que fizeram a platéia relembrar com saudosismo – e até cantarolar em uníssono com os atores – canções do repertório nacional como Chiquinha Gonzaga, Sinhô, Ernesto Nazareth, Catulo da Paixão e Zequinha de Abreu.

Há momentos bem charmosos. Uma vinheta, criada coletivamente pelo grupo, abre e fecha o espetáculo. No fim da primeira peça, "Amor de Anexins", a atriz Hermila Guedes e o ator Alfredo Borba cantam juntos uma estrofe mais ou menos assim: "De vocês esperamos muitas palmas/ metade para nós/ metade para o autor". Na segunda peça, "Uma Consulta", a platéia se delicia assistindo as silhuetas do casal protagonista (Fátima Aguiar e Mário Mirando) trocando suas roupas para inverter os papéis: ela passa a ser ele, o advogado que se finge de doutor, e ele é ela, a paciente. Revelam, assim, suas verdadeiras intenções em uma cena que, à época, deveria ter sido bem picante, mas que mesmo hoje em dia ainda não perdeu a graça por conter frases impagáveis como "Como vou dizer por aí que fui auscultada por... um advogado!". GGG1/2

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