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Esboço de Caruso mostra Mario Prata usando um roupão, um dos prazeres descobertos pelo escritor no Spa São Pedro, de Sorocaba | Reprodução
Esboço de Caruso mostra Mario Prata usando um roupão, um dos prazeres descobertos pelo escritor no Spa São Pedro, de Sorocaba| Foto: Reprodução

Dias atrás, Mario Prata estava incomodado. Ele saiu para jantar com uma amiga e mal conseguiu disfarçar o desconforto. A amiga percebeu o sofrimento estampado no rosto do escritor, que acaba de publicar uma nova edição de Diário de um Magro pela Planeta, e perguntou qual era o problema afinal?

E o que o incomodava eram as meias.

É que, vivendo em Florianópolis há dez anos, ele embarcou em um estilo de vida muito diferente do que levou até os 50 anos. "Eu não vestia meias desde agosto", diz Prata, em entrevista por telefone, de sua casa na praia, usando um par de crocs nos pés.

Essa seria uma situação surreal para o Mario Prata de 1996, que fumava dois maços e meio de cigarro e bebia uísque como se fosse chá. Ele começou a fazer terapia, mas teve de parar quando virou amigo do terapeuta. "Nós começamos a beber juntos", explica.

Até vir o convite do amigo Fernando Morais, o biógrafo de Paulo Coelho. O jornalista havia encontrado Antonio Fagundes e ficou impressionado com a saúde do ator que tinha acabado de fazer O Rei do Gado (1996-1997), em que apareceu com muitos quilos a mais. O segredo de Fagundes tinha nome de santo: o Spa São Pedro, em Sorocaba (SP).

Convencido pelo ator, Morais resolveu experimentar, mas não iria sozinho. Então ligou para Mario Prata, que, carregando a crise da meia-idade, topou. "Foi um presente que nos demos", explica Prata. Os dois tinham livros nas listas dos mais vendidos no país: Morais com Olga e Prata com Benedito.

Depois dos primeiros 15 dias no Spa, Prata nunca mais seria o mesmo. O entusiasmo com a experiência o levou a escrever Diário de um Magro, publicado pela primeira vez em 1997. O livro se tornou o maior sucesso editorial de sua carreira, vendendo mais de 120 mil exemplares.

Quando teve a ideia de escrever o livro, imaginou uma edição pequena para circular entre os pacientes do Spa. A primeira tiragem, de mil exemplares, foi assim e se chamava Me Ajuda São Pedro.

A Globo, editora de Prata na época, quis publicar uma versão comercial para colocar no mercado. Ela sofreu algumas alterações, saiu como Diário de um Magro e nunca parou de vender. Na época, celular ainda não era uma praga e as palavras "obesos" e "obesidade mórbida" ainda não eram tão ouvidas quanto agora. No texto, por exemplo, Prata defende o uso de "gordo" e "gorda". "A palavra ‘obeso’ é horrível", diz.

Na nova edição, os 15 dias do subtítulo foram substituídos por "15 Anos num Spa". Uma impressão que ainda se insinuava no final dos anos 1990, hoje, é senso comum: a de que o Spa não serve apenas para pessoas que querem perder peso. Num lance visionário, Prata já defendia a importância de se cuidar da cabeça e não apenas do corpo. Quer dizer, visionário em termos. Ele escreve: "Depois fiquei pensando bem e acho que alguém já disse isso. Um romano: Mens sana in corpore sano!", ou "mente sã em corpo são". "Se não tiver cabeça, não adianta", diz.

Como o título diz, Diário de um Magro funciona como um registro do cotidiano no Spa. A experiência de Prata como cronista – ele colaborou durante anos com O Estado de S.Paulo – cria um texto de leitura compulsiva. E há episódios impagáveis. Ele e outro paciente olhavam para a professora de ginástica "gostosinha" quando Prata chamou atenção para alguns atributos da moça, ao que o homem respondeu: "Prefiro um bacalhau na brasa".

Encantado pelo Spa e animado com o plano de escrever um livro, Prata liga para Paulo Caruso e convence o cartunista a ir para o São Pedro e a produzir as ilustrações do livro. Me Ajuda São Pedro foi criado para ser moeda de escambo, com Prata e Caruso trocando o trabalho por duas semanas de hospedagem.

As ilustrações saíram na primeira edição. Agora, porém, a Planeta conseguiu os cadernos que Caruso preencheu naquele período e publica uma série de esboços geniais na reedição. É impressionante ver como Caruso era capaz de dar conta de uma cena complexa com pouquíssimos traços.

Na última década e meia, Prata foi ao Spa São Pedro 104 vezes, às vezes ficando duas semanas, às vezes um dia ou dois. Há sete anos, ele vendeu o apartamento que tinha em São Paulo para viver só em Florianópolis e, quando precisa ir até a capital paulista, prefere se hospedar no Spa. "Assim os filhos não brigam", diz. Bom ser um pai querido assim.

Prata está envolvido com o gênero policial, escrevendo e lendo muito. Ele virou um entusiasta das livrarias e sebos virtuais. Uma de suas favoritas é a Atheneo, de Buenos Aires, de onde mandar vir títulos ainda não traduzidos no Brasil.

Ele é capaz de listar sete autores suecos de livros policiais, sem contar Stieg Larsson (da trilogia Millenium); diz que o seu escritor policial favorito é Lawrence Block (O Ladrão Que Achava Que Era Bogart) e tem centenas de volumes do gênero na estante. Para ele, o que move um romance policial é o enigma, numa espécie de duelo do leitor com o autor. No caso do Diário..., a chave está no bom humor e a relação com o autor é de cumplicidade.

Serviço

Diário de um Magro, de Mario Prata. Planeta, 144 págs., R$ 24,90.

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