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Felipe Hirsch faz texto situado entre polaridades, como morte e vida, ser e não ser, domínio e descontrole | Leonardo Aversa/Agência O Globo
Felipe Hirsch faz texto situado entre polaridades, como morte e vida, ser e não ser, domínio e descontrole| Foto: Leonardo Aversa/Agência O Globo

Hirsch monta duas óperas e planeja filme

Até 2013, uma série de projetos divide espaço na mente de Felipe Hirsch e na agenda da Sutil Cia. de Teatro. Criado em Curitiba em 1993, o grupo completará 20 anos de trajetória e, como presente, planeja uma temporada carioca e paulista de um de seus maiores sucessos, Avenida Dropsie (2005), a estreia de Trilhas Sonoras de Amor Perdidas no Rio, prometida para o mês de janeiro no Teatro Ipanema, além de um espetáculo inédito, ainda sem título.

Passada a es­­­­­treia de O Livro de Itens do Paciente Estevão, Hirsch mergulha na direção de duas novas óperas, Violanta, de Erich Korngold, e Eine Flo­­­ren­­­­tinische Tragödie ("Uma Tra­­­­gédia Florentina"), criada por Alexander von Zemlinsky, que estreiam no dia 12 de outubro no Teatro Municipal de São Paulo.

E, em novembro, o encenador se lança à direção de seu segundo longa-metragem. Inspirado no romance Jerusalém, de Gonçalo M. Tavares, o projeto conta com Mariana Lima, Alice Braga e participação de Fernanda Montenegro no elenco.

Serviço

O Livro de Itens do Paciente Estevão

Espaço Sesc (R. Domingos Ferreira, 160 – Copacabana, Rio de Janeiro), (21) 2547-0156. De quarta a sábado, às 19h. Domingos, às 17h. R$20, R$10 (meia entrada) e R$5 (associados SESC Rio). Até 5 de agosto. Classificação indicativa: 18 anos.

O diretor Felipe Hirsch para o ensaio, sobe ao palco, ajeita um biombo de vidro, ajeita um pouco mais, mais um pouquinho... Pronto. Ele desce, segue até a mesa de controle e dispara a trilha. Guilherme Weber entra em cena, dá o texto, a música ainda explode alto, a luz não segue o combinado, e o diretor interrompe: "Vamos fazer de novo".

O Livro de Itens do Paciente Estevão estreou na semana passada no Espaço Sesc, no Rio de Janeiro, e não tem previsão de chegada a Curitiba, onde a Sutil Cia. de Teatro começou carreira nos anos 1990 (leia mais no quadro abaixo). Nos ensaios, o diretor mantinha a calma e o controle, apesar da ansiedade diante da infinidade de detalhes a serem testados e acertados para esta que considera a sua mais "desafiadora e complexa" montagem, tanto por sua duração – cinco horas, com um intervalo de 20 minutos – como por sua temática – centrada na polarização entre vida e morte, ser e não ser, domínio e descontrole. "É o espetáculo mais rico que a gente já fez", frisa Hirsch.

"Não sei como ele vai se relacionar com o público, mas não temos dúvida de sua força. A gente simplesmente criou uma obra e incluiu tudo de que ela precisava, o tempo que fosse necessário, por acreditar que o teatro pode ser um veículo para um trabalho de fôlego como esse."

Reconhecido pelo apuro estético de seus espetáculos – do texto à encenação, da luz (de Beto Bruel) ao cenário (dele e de Daniela Thomas), assim como as trilhas sonoras, seu xodó –, Felipe Hirsch sabe que é impossível ter controle de tudo, mas nem por isso desiste.

Diagnóstico

O que se vê é um diretor mais experiente e sereno, mesmo diante de uma obra centrada num protagonista que espelha uma situação análoga a um dos momentos mais delicados da sua vida. "Há cerca de dois anos passei por uma situação quase surrealista: a espera de um diagnóstico que demorou muito a ser concluído", conta o diretor. "Vivi durante mais de seis meses sem saber se o que eu tinha era algo muito grave ou uma coisa boba. Então, toda essa incerteza gerou uma série enorme de conflitos, que me fez refletir sobre a morte. Geralmente nos referimos à morte como doutores, distanciados, e eu decidi que era hora de encarar todas essas variadas possibilidades de lidar com a morte que esse personagem apresenta."

Inspirado no romance O Paciente Steve, de Sam Lipsyte, o protagonista em questão chama-se Estevão, um publicitário que se vê sob os cuidados de uma junta médica que tenta – infrutiferamente – solucionar o seu caso. Diagnosticado com uma doença misteriosa, o paciente é apenas informado de sua condição terminal, e fica à mercê da incerteza quanto aos porquês do caso, sem qualquer expectativa de vida.

"A notícia de que ele vai morrer um dia de alguma coisa indefinida causa um trauma tão grande que ele não percebe que esse diagnóstico é o mesmo que acontece com todo mundo", diz Hirsch. "Todos sabemos que vamos morrer um dia de alguma coisa, e ninguém sabe até quando poderá viver. Essa é a condição normal de qualquer ser vivo, mas ele passa a somatizar essa informação, esse pânico diante da morte."

A partir daí, Estevão envereda num périplo em busca de redenção, marcando num livro os tais nove itens que destrincham sua obstinada via-crúcis contra a morte. "Ele não quer morrer, então passa a escrever esses itens, que são as cenas que se desenrolam do diagnóstico em diante", diz o ator Leonardo Medeiros, que vive o protagonista. "No fim, acho que a peça fala desse medo irracional que toma conta das pessoas."

Na pele de Medeiros, Estevão mergulha numa espiral de lembranças e questionamentos existenciais, que trazem à baila sua condição de empregado burocrata e mau pai, o fracasso de seu casamento, a morte de seu melhor amigo, a internação de sua filha numa escola para crianças sem afeto, entre outras violentas memórias que só ganham "amparo" no Centro de Recuperação de Almas, uma comunidade fundada por um perverso terapeuta, Adolfo Henrique (Guilherme Weber), que se vale de violentos procedimentos – tortura e rituais de renascimento – como base de sua doutrina.

No elenco estão ainda nomes como Georgette Fadel, Danilo Grangheia, Isabel Teixeira, Márcio Vito, Maureen Miranda e Pedro Inoue.

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