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Simone (esq.) e Daniella vivenciam uma forte relação filial | Orlando Azevedo/Divulgação
Simone (esq.) e Daniella vivenciam uma forte relação filial| Foto: Orlando Azevedo/Divulgação

Só uma peça que fala das coisas mais cotidianas seria capaz de arrancar de uma senhora, que foi ao teatro pela segunda vez na vida, a expressão: "Não sei se eu entendi. Mas acho que é sobre mim".

Aconteceu num ensaio aberto de Laços Delicados (veja serviço completo no Guia Gazeta do Povo), texto francês que aborda o tema enganadoramente simples do relacionamento entre mãe e filha, cuja tradução e adaptação curitibanas estreiam hoje no Miniauditório do Guaíra.

Não se trata de uma história linear, e sim de fragmentos de lembranças, que as atrizes Daniella Prestes e Simone Klein vivenciam em cenas ininterruptas, demarcadas apenas por alguns movimentos entre elas, seus figurinos e duas cadeiras.

"Foi um trabalho mais de tirar coisas, para não interferir com o texto, que é muito delicado", explica a diretora Silvia Monteiro, que conversou com a Gazeta do Povo.

A ideia de montar De Si Tendre Liens, da francesa Loleh Bellon, veio de Daniella, que propôs o trabalho a Silvia há cinco anos. Agora, devidamente traduzido por Norberto Pavelec, professor da Aliança Francesa em Curitiba, a obra ganha adaptação local, profundamente baseada no trabalho das atrizes.

Do original, foi retirada a carga trazida pelo tempo histórico do pós-guerra – período que teve influência na obra de Bellon. Ainda assim, é possível perceber nas entrelinhas alterações na sociedade francesa – como a mãe que engravida muito jovem e sua filha que, anos mais tarde, questiona se deve levar adiante sua própria gravidez.

Entre idas e vindas dessa história filial, passam-se 50 anos. É interessante notar a passagem do tempo na interpretação das atrizes, que ora endurecem, ora se enternecem ao envelhecer.

Claustrofobia

A atuação se passa apenas no proscênio do pequeno teatro, num enxugamento cênico capaz de tornar o clima ainda mais claustrofóbico. Na parede que comprime as personagens, há sombras do passado na forma de desbotamentos.

Quando as palavras não cabem, Silvia se utiliza do teatro físico, em momentos da peça que remetem mais à imaginação provocada pela subjetividade da memória do que à realidade vivenciada.

As atrizes utilizam inúmeros e simbólicos gestos. O cuidado da mãe com a filha – e depois da filha com a mãe – é expresso em atos como o ajuste de um xale. Ele pode ser jogado no ombro ou ajeitado com vagar, cada vez com um significado.

Movimentos e frases que se repetem, com décadas de distância, criam um efeito de espelhamento, na opinião de Pavelec. Nessa economia de palavras e cenários – afinal, a ideia era tirar coisas excedentes – os figurinos se destacam pela versatilidade e o parentesco que sugerem. São vestidos com detalhes femininos, parecidos entre si, mas com detalhes que ganham relevância de acordo com o trecho.

Escrita na década de 1970, De Si Tendre Liens foi adaptada no Brasil pelo menos uma vez, em 1989, com Irene Ravache e Regina Braga nos papéis de mãe e filha.

Entre outros trabalhos, Silvia Monteiro já adaptou peças que recorreram à abstração, como Quero Falar Mas a Tempestade Não Deixa e O Sofá.

Serviço: Laços Delicados - Miniauditório do Teatro Guaíra (R. Amintas de Barros, s/nº), (41) 3304-7982. Direção de Silvia Monteiro. Com Simone Klein e Daniella Prestes. 4ª a sáb., às 21h, e dom., às 19h. R$20 e R$10 (meia-entrada). Até 6 de maio. Classificação indicativa: 18 anos.

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