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O cineasta José Padilha dirige cena da sequência de Tropa de Elite, cujas filmagens terminam amanhã | Alexandre Lima/Divulgação
O cineasta José Padilha dirige cena da sequência de Tropa de Elite, cujas filmagens terminam amanhã| Foto: Alexandre Lima/Divulgação

Rio de Janeiro - Auditório do Palácio Gustavo Capanema, no Centro do Rio. O prédio de Oscar Niemeyer pode ser uma obra-prima da arquitetura brasileira, mas o calor é infernal no mezanino, e agravado pela potência do gerador que lança luz lá para dentro. José Padilha finalmente abre o set de Tropa de Elite 2 para a imprensa. Ele termina a filmagem amanhã. As grandes cenas de ação ficaram para trás e a cena rodada no último Domingo de Páscoa passa-se no presumível 3.º Congresso de Direitos Humanos.

O professor Fraga faz sua exposição sobre a conta perversa que caracteriza o Brasil atual. O personagem é interpretado por Irhandir Santos, já visto em Besouro como Noca de Antonia, inimigo do herói. Na plateia, formada preferencialmente por jovens – Fraga é professor de História, no curso de jornalismo –, está o personagem real, que o inspirou: sociólogo e deputado Marcelo Freixo.

O discurso de Fraga reproduz palestras de Freixo. O Estado brasileiro gasta uma miséria com escola e saúde. Para manter uma criança na escola, despende oito vezes menos do que para manter um preso (somente) no sistema carcerário. Além de caro, ele é inoperante. Pior – opera em sentido contrário. O sujeito que rouba um celular sai lá de dentro formado em crimes muito piores (e mais violentos). E a população carcerária não para de crescer. Hoje, são mais de 400 mil encarcerados.

A conta é perversa – a população brasileira dobra a cada 50 anos; a carcerária, a cada 8. "E ainda tem gente que diz que o Brasil é o país da impunidade. Pode ser para uma determinada faixa, mas não para os pobres", Fraga sintetiza em seu discurso. O sistema carcerário reproduz a sociedade que o criou. Fraga mostra a maquete de Bangu 2, onde estão presos os 40 homens considerados mais perigosos do Rio. Os 40 ladrões? "Ali Babá está lá fora", ele diz. A plateia ri, e vai rir nas sucessivas vezes em que o plano será repetido.

A conta perversa – nesse ritmo, em 2081, a população brasileira será de 570 milhões de habitantes e 510 milhões estarão presos nesses condomínios fechados – e Fraga aponta para a maquete.

Havia a cobrança por um Tropa 2, depois que o primeiro filme virou um fenômeno – artístico e social. No intervalo, várias emissoras, no Brasil e no exterior, quiseram transformar Tropa de Elite em série. Uma pesquisa do Ibope mostrou que o capitão Nascimento, interpretado por Wagner Moura, povoa o imaginário dos brasileiros. Sete entre dez pessoas nas grandes cidades já ouviram falar nele.

O diretor Padilha e seu sócio, Marcos Prado, perceberam que nunca teriam controle sobre a série, porque as condições da mídia tevê são diferentes ("Não estou nem criticando", diz Padilha). Eles fizeram o mais difícil. Abriram mão do artigo terceiro, captaram o máximo que a lei lhes permitia (R$ 5 milhões, mais o ICMS do estado do Rio, cerca de R$ 600 mil). O restante da produção – R$ 13,5 milhões (chegando a R$ 16 milhões com os custos de lançamento) – está sendo bancado por particulares, incluindo Padilha, Prado, Wagner Moura e uma carteira de pessoas que resolveram investir no projeto. "Se Tropa 2 repetir os 2,5 milhões de espectadores do Tropa 1, vai se pagar e ainda dar lucro", garante Padilha.

Grande filme?

Ele filma num estado de euforia. Não sente a pressão de estar fazendo um grande filme. A cobrança de ter de se superar não lhe tira o sono. Sua mulher diz que ele "é irresponsável". Quando fez Tropa de Elite, Padilha foi chamado de direita. O filme era de direita, como seu protagonista, o capitão Nascimento.

Por Ônibus 174, no qual mostrou o outro lado da realidade de Tropa, foi etiquetado como de esquerda. Mas nem nele mesmo, em termos de esquerda ou direita. Em busca de um enfoque que fosse original, transferiu a dicotomia para a ficção de Tropa 2.

O ex-capitão, agora coronel Nascimento, tem um antagonista, e é o Fraga, o homem das ONGs. Se o tema do primeiro filme era a corrupção e a violência da polícia no combate ao crime, agora é a milícia. O papel e a responsabilidade do Estado. Padilha admite que filma para provocar polêmica e animar discussões. "Ele é obcecado pela realidade", diz o diretor de fotografia Lula Carvalho.

De novo, Carvalho filma com a câmera na mão, seguindo os atores (o filme deve ter uns 3% de câmera no tripé, ele diz). O plano deste domingo é filmado como sequência, um prodigioso plano de quatro minutos que Padilha e Daniel Resende vão desconstruir na montagem.

É muito comum ver, no set, Padilha e Lula Carvalho cochicharem com Resende. O montador de Cidade de Deus e Tropa 1 está presente o tempo todo na filmagem. Padilha já filma discutindo opções de montagem com ele. O set fechado alimentou todo tipo de boataria sobre o filme. O coronel Nascimento não é secretário de Segurança, ao contrário do que você leu por aí. Muita informação errada tem circulado na imprensa.

O filme tem um blog – www.tropa2.com.br – e também está no Facebook, Orkut, Twitter, Flickr e MySpace. "A essência do personagem e do seu embate contra o crime estão de volta", garante o diretor. "O que muda é a abordagem. As questões familiares e profissionais convergem. Agora, é pessoal." Você vai ouvir muito esta frase. É sobre ela que vai se construir a campanha de lançamento de Tropa 2.

A data ainda não está fechada. Seria, em princípio, 12 de novembro, mas poderá ser mudada. Padilha é o nosso Francis Ford Coppola? "Que é isso?", pergunta. Como o diretor de O Poderoso Chefão, ele encara o desafio de fazer um segundo filme melhor do que o primeiro (grande), que o inspirou. Padilha jura que não pensa nisso – a tal irresponsabilidade, de que fala sua mulher. Ele procurava uma boa história e a encontrou, isso é o que importa. Sua fórmula para um bom filme é: 50% de roteiro e 50% de elenco. O roteiro de Tropa 2 – de Bráulio Mantovani, sobre um argumento de Rodrigo Pimentel, José Padilha e do próprio Mantovani – é forte, o diretor garante.

O elenco traz as faces conhecidas do primeiro – Wagner Moura, Maria Ribeiro, André Matias e Milhem Cortaz. As novidades prometem: Pedro Van Held, como o filho de Nascimento; Tainá Muller, como uma repórter que será decisiva na trama; e o antagonista, o poderoso Irandhir Santos. Tanto Padilha quando Resende dizem que ele é gênio. O magnetismo do ator, na cena filmada neste domingo, é total.

Em locações, nos morros – cenas filmadas em comunidades, a nova denominação, menos preconceituosa, de favelas – Irandhir foi aplaudido em cena aberta. Um pouco para evitar a pirataria do primeiro filme, Tropa 2 está sendo feito num circuito fechado como nenhum outro do cinema brasileiro. A boataria é grande. Padilha avalia até a possibilidade de não mostrar o filme à imprensa. "Tropa 2 virou a obsessão dos colunistas sociais e de celebridades. Publicam muita m... Tem gente que jura que já contou o fim do filme." Ele promete surpresas. Padilha parece tão seguro e tranquilo naquele set que a surpresa maior será se Tropa 2 não for um bom (grande?) filme.

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