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O documentário Um Lugar ao Sol, de Gabriel Mascaro, discute a vida nas coberturas | Divulgação
O documentário Um Lugar ao Sol, de Gabriel Mascaro, discute a vida nas coberturas| Foto: Divulgação

Tiradentes (MG) - O longa-metragem paranaense Corpos Celestes, de Fernando Severo e Marcos Jorge, encerrou os debates sobre cada um dos 29 longas-metragens vistos pelo público da 13.ª Mostra de Cinema de Tiradentes, que termina hoje. O filme foi exibido na noite de ontem como parte da Mostra Olhares, seção formada por produções já vistas e premiadas em outros festivais do país e do exterior – da qual também participaram o curitibano Felipe Hirsch (Insolação) e o pontagrossense Sérgio Bianchi (Os Inquilinos).

O evento de Tiradentes, marcado por uma curadoria que estimulou reflexões ao aproximou longas e curtas de acordo com semelhanças temáticas e de linguagem, teve como ponto alto a presença de filmes cearenses e pernambucanos preocupados em discutir uma questão social e ambiental preocupante: a verticalização das cidades.

Ao se deparar com um livro que mapeava "os ilustres" da sociedade brasileira, o pernambucano Gabriel Mascaro teve a idéia de fazer Um Lugar ao Sol, um documentário que tivesse como personagens os moradores de coberturas de luxo – pertencentes à chamada elite do país, uma classe raríssimas vezes retratada pelo cinema brasileiro. Com dificuldades para penetrar em um mundo restrito e do qual não fazia parte, Gabriel teve de usar uma artimanha que dividiu a crítica por sua validade ética: fingiu-se de publicitário de renome internacional interessado em saber como era a vida em coberturas. Mesmo assim, conseguiu somente nove entrevistas em um universo de mais de 125 endereços.

Às conversas com os personagens, que provocam as mais di­­versas (e intensas) reações da plateia, Gabriel entremeia imagens da cidade como, por exemplo, monstruosas sombras na areia da praia dos edifícios, que formam uma espécie de paredão na orla de Recife (pense em Camboriu). "Recife vive um processo de verticalização muito rápida, em dez anos meu bairro mudou completamente. Daí nasceu meu interesse pessoal em perceber a velocidade dessa transformação urbana e como, a partir daí, as relações sociais se estabelecem", diz o diretor.

Ele atribui à sua pouca idade – quando filmava, há quatro anos, tinha 22 anos – a disposição dos entrevistados em abrir suas casas e dizer o que pensam. O dono de uma boate de luxo, em São Paulo, confessa sentir pena de pessoas que, ao contrário dele, não podem ter um Jaguar. "Mas a vida é assim: algumas mulheres usam bolsas Louis Vuitton, outras carregam sacolas de plástico." Uma mulher diz ser lindo, ver de sua janela, "as luzinhas coloridas, diferentes" das balas zunindo de um morro a outro do Rio de Janeiro.

Mas há falas bem mais só­­brias, que se misturam a estas mais bizarras, em um filme que peca justamente em unir, em um mesmo balaio, pessoas de mentalidade bem diversas. "Não quis ser totalizante", defende-se o diretor, que também enfrentou indagações sobre sua postura ética. "Toda a construção do filme se funda em uma fricção com uma ética não-católica, que para mim não é a mesma dos outros. Interessa mais como questão saber por que as pessoas aceitaram declarar, diante da câmera, que não gostam de ouvir barulho de panela batendo ou que de sua cobertura estão mais próximas de Deus", diz.

O filme dialoga com o curta cearense Vista-Mar, de Pedro Diógenes, Rubia Mercia, Rodrigo Capistrano, Claugeane Costa, Henrique Leão e Victor Furtado, que também usa de artifícios capciosos para adentrar no luxo dos condomínios da beira-mar de Fortaleza. "É um movimento subversivo", considera Marcelo Pedroso, que montou Um Lugar ao Sol e dirigiu Pacific, outro filme da Mostra Aurora.

A jornalista viajou a convite do evento.

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