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Wilson Martins: lembrado por sua capacidade de trabalho e pela coerência de suas ideias | Fernanda Preto/Gazeta do Povo
Wilson Martins: lembrado por sua capacidade de trabalho e pela coerência de suas ideias| Foto: Fernanda Preto/Gazeta do Povo

Para tentar dimensionar a importância de Wilson Martins, morto no último sábado, para a literatura brasileira, a reportagem entrou em contato com jornalistas, escritores, críticos, editores e outras figuras ligadas ao meio editorial.

Muito rápido, fica evidente que as pessoas que o conheciam e que liam seus textos, mesmo não concordando com suas opiniões – o que não era raro, dadas as paixões que os livros despertam –, costumavam respeitá-lo muito.

Martins criou para si vários projetos ambiciosos. História da Inteligência Brasileira, série em sete volumes a ser reeditada pela Universidade Estadual de Ponta Grossa, analisa a vida intelectual do país a partir de textos publicados, começando com a carta de Pero Vaz de Caminha. Com Um Brasil Diferente, procurou falar do Paraná, apresentando uma faceta da nação ainda pouco discutida em 1955, ano de sua primeira edição.

Numa bibliografia de obras ousadas, talvez o ápice seja Pontos de Vista, rebatizado agora, pela editora Topbooks, como Ano Literário. Com 15 edições, a coleção reúne os textos críticos de Martins publicados na imprensa nacional – inclusive na Gazeta do Povo. Um dos maiores feitos do intelectual foi passar a vida inteira lendo e escrevendo sobre livros.

"Não compartilhava com Wilson Martins a mesma visão a respeito da literatura. Ao contrário: divergíamos, fortemente, em quase tudo. Não se respeita um homem, porém, pelas semelhanças, mas por ele ser fiel a si mesmo. Por isso, mesmo na divergência, tive imenso respeito por Wilson Martins. Foi um homem que sempre disse e sempre escreveu exatamente o que pensava. Um homem que sustentou, com clareza e fibra, as próprias palavras. Essa é a lição que nos deixa: uma lição de coragem intelectual. O que, nos tempos de hoje, convenhamos, não é pouco", diz o escritor José Castello, que dividiu com Martins o espaço dedicado à crítica literária no suplemento "Prosa e Verso", do jornal O Globo.

"Clareza" e "fibra" são ótimas palavras para descrever o trabalho de Martins. O escritor Boris Schnaiderman, responsável por traduções referenciais de autores russos como Dostoievski e Tolstoi, descreve o crítico como "um homem de vasta cultura". "Nem sempre eu concordava com a opinião dele, mas o respeitava pela consistência de seus argumentos. Foi uma pessoa muito importante para a nossa cultura porque pensava sobre a literatura", diz Schnaiderman.

O jornalista Rogério Pereira, editor do jornal Rascunho, considera Martins um nome fundamental da literatura brasileira. "Para mim e para a minha geração, ele sempre foi uma figura a ser seguida, com posições muito claras", diz. "Ele nunca caminhou conforme as tendências e sempre sustentou suas opiniões. Foi um exemplo de crítica literária e manteve a coerência no seu trabalho durante a vida toda. Ele fica no cenário da cultura brasileira como uma das maiores referências."

É possível que, justamente por se manter fiel à visão que tinha da literatura, Martins tenha conquistado desafetos na mesma medida que foi respeitado como um dos últimos dinossauros de algo que deixou de aparecer na imprensa nacional: a crítica literária.

"Na última vez em que almoçamos juntos, ele fez questão de não ser ajudado a sair do táxi e caminhar até a mesa, usando muletas e quase se arrastando, sem deixar nem sua mulher ajudar. Essa independência Wilson manteve também na sua visão cultural, acima de modas e tendências. Era um homem que pensava pela própria cabeça, sem dizer amém a consagrações ou render tributo a ideologias. Para ele, cada caso era um caso, cada obra uma obra, e por isso conseguiu tanto respeito entre tantos intelectuais que calam ou maquiam a própria opinião por receio de ficar mal entre seus pares... Wilson era ímpar", diz o escritor Domingos Pellegrini.

A capacidade de levar uma carreira dentro da literatura sem se vincular a grupos é lembrada também pelo escritor Roberto Gomes: "Admirava nele a capacidade de trabalho e a independência. Ele fazia questão de se manter afastado dos escritores", diz.

Numa entrevista cinco anos atrás, Martins assumiu a condição de dinossauro e dizia estar à espera do "Grande Bangue" que o levaria deste mundo.

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