
Adaptar ícones da história da arte nunca é fácil e, talvez por isso, a coreógrafa Olga Roriz tenha se mantido longe de A Sagração da Primavera por muito tempo.
Há alguns anos, porém, foi convencida de que seu estilo de dança renderia uma boa versão da obra revolucionária de Vaslav Nijinski, cujo balé, criado sobre a composição de Igor Stravinski, foi recebido em 1913 com entusiasmo pela vanguarda e com ojeriza pelos conservadores (veja o serviço completo do espetáculo no Guia Gazeta do Povo).
Veja mais fotos com o Balé Guaíra e a Orquestra Sinfônica
Assista a um vídeo do ensaio do espetáculo e uma entrevista com a coreógrafa Olga Roriz
Satisfeita com o resultado, a portuguesa trouxe a obra ao Balé Guaíra, que estreia a novidade hoje, 30 anos depois da primeira experiência do corpo de baile da casa com a obra-prima, coreografada então por Carlos Trincheiras. Agora, a música executada pela Orquestra Sinfônica amplia a relevância da produção (leia a entrevista ao lado com o maestro Osvaldo Ferreira).
A trama, inspirada em tradições pagãs e que mostra uma jovem designada pelo sábio da aldeia para o sacrifício de dançar até morrer em prol de boas colheitas, requer boas interpretações individuais dos protagonistas.
E essa é a especialidade de Olga, que conversou com a Gazeta do Povo. "Creio que consigo trabalhar bem a paixão, a morte e o sexo nos personagens. Minha linguagem é muito ritualística", explica.
A moça eleita para dançar até a morte é vivida no balé por Ane Adade, com Alessandra Lange e Deborah Chibiaque como substitutas. O sábio, por André Néri e Raphael Ribeiro.
Relevância
Em dois atos, com um intervalo e total de 40 minutos, A Sagração da Primavera foi dividida originalmente em "Adoração da Terra" e "O Sacrifício". Na música, Stravinski tirou inspiração de danças populares eslavas e privilegiou o ritmo primitivo e rústico em detrimento da melodia, o que, para o início do século 20, foi entendido como uma ofensa.
A partir da música, o trabalho da coreografia foi dar vida aos personagens, com uma visão teatral da dança. "Eu já tinha visto a versão de Pina Bausch e a achei perfeita. Não era necessário para minha carreira fazer algo que teria tantas comparações. Mas, então, ouvi de novo [a obra musical de Stravinski] e me apaixonei. E já não havia como voltar atrás."
Ao criar sua visão dos movimentos para o balé, a artista se surpreendeu com a facilidade com que a obra "saiu de seu corpo", "de maneira muito instintiva, o que tem a ver com a música e o tema". Para ela, isso contribuiu para que o resultado mostrasse não só o corpo dos bailarinos, mas também o coração.
Escolhas
Entre as escolhas de Olga, sobressai a de não vitimizar a eleita. Mesmo que sua escolha signifique a morte, a personagem abraça sua missão como uma honra. A bailarina bate no peito e sorri desafiadora enquanto é observada. Na mesma linha, o sábio que orienta o sacrifício ganha um protagonismo incomum em relação a outras montagens, exercendo ao lado da eleita uma polarização interessante para o palco.
O espectador curioso irá querer saber qual a distância entre esta versão e aquela histórica, de 1913, que quase pôs abaixo o Teatro Champs-Elisée, de Paris. "A distância é a de cem anos", ironiza a criadora. A partir daquela base original, ela enxerga a evolução da própria dança.
"O Balé Guaíra acertou em escolher esta obra neste momento. É uma peça com a qual eles poderão viajar pelo país e quem sabe até para fora. Não sei de nenhum outro grupo brasileiro que tenha uma versão atualmente."
Cultura e Lazer | 2:45
O Balé do Teatro Guaíra e a Orquestra Sinfônica do Paraná apresentam "A Sagração da Primavera", do compositor russo Igor Stravinsky. Com direção da coreógrafa Olga Roriz, o espetáculo ocorre entre quinta-feira e domingo, no Guairão, em Curitiba.











