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Elliot (Demetri Martin, no centro) descobre suas verdades em clima de música, paz, amor e lama, no filme sobre os bastidores do maior festival de todos os tempos | Divulgação
Elliot (Demetri Martin, no centro) descobre suas verdades em clima de música, paz, amor e lama, no filme sobre os bastidores do maior festival de todos os tempos| Foto: Divulgação

A contribuição mais evidente de Aconteceu em Woodstock, longa-metragem do cineasta taiuanês Ang Lee que chega às locadoras ao mesmo tempo que às telas de Curitiba, parece ser revelar que o festival ocorrido no estado de Nova York não foi um evento tão espontâneo e distante do poderio da indústria cultural quanto aparentava ser.

O diretor – premiado com o Oscar por O Tigre e o Dragão e O Segredo de Brokeback Mountain – defende essa tese, no entanto, sem o intuito de desmitificar a apoteose hippie e musical, que completou 40 anos em 2009. Apenas descreve, em detalhes pitorescos, os bastidores dessa "engenharia de produção". E prefere, como de hábito, focar em uma trajetória individual e não no evento propriamente dito.

A narrativa do filme é construída em torno de um personagem verídico, porém coajuvante na história de Woodstock: o designer de interiores Elliot Tiber (Demetri Martin), que sem querer teve papel decisivo na realização do festival. Em 1969, o rapaz sobrevive aos trancos e barrancos como decorador no bairro nova-iorquino do Greenwich Village quando é forçado pelas circunstâncias a voltar para casa e ajudar os pais na administração de um motel decadente nas montanhas Catskills, o El Monaco.

A situação é tragicômica: endividado, o pai do decorador tem a ideia infeliz de pôr fogo no estabelecimento para ganhar como indenização o dinheiro do seguro, para então se dar conta de ter esquecido de pagar a mensalidade da apólice. Para piorar as coisas, Elliot tem um segredo para contar à família: é gay.

Em meio a toda essa confusão doméstica, o rapaz enxerga uma luz na escuridão. Numa cidadezinha próxima, ele ouve falar que estão planejando realizar na região um grande festival de "música hippie", como se tal gênero, de fato, existisse. Referem-se a Jimi Hendrix, Jefferson Airplane, Janis Joplin, Carlos Santana e outros menos cotados. Empolgado, ele telefona para os produtores na esperança de atrair uma clientela garantida para o El Monaco durante os dias do evento. Corta.

Três semanas mais tarde, nada menos do que meio milhão de pessoas segue rumo à fazenda de um vizinho dos pais de Elliot, no município rural de White Lake. Ao se juntar a essa turba, e mergulhar num mar de sons, drogas, paz, amor e lama, Elliot vai iniciar uma mudança irreversível em sua vida. Assim como a própria cultura pop americana.

Ang Lee, um dos diretores mais relevantes hoje em atividade no cinema, fez um filme pequeno e com menos pretensões do que seus longas anteriores, O Segredo de Brokeback Mountain e Desejo e Perigo, mas, de certa forma, não desvia da rota autoral. Próximo cronológica e sociologicamente de outro grande título em sua filmografia, o estupendo Tempestade de Gelo, que disseca com sutileza mas contundência o momento-chave da revolução sexual nos Estados Unidos, Aconteceu em Woodstock revisita um tema onipresente na obra do cineasta chinês.

No fundo do aparente tom de ludicidade e desbunde da trama, Lee está de novo a falar do eterno dilema entre o ser e o fazer, da tensão antagônica (e, muitas vezes, destrutiva) en­­frentada por alguém diante da encruzilhada onde um caminho, o do dever e da responsabilidade, se opõe a outro, vinculado ao desejo. GGG

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