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Nas salas

Confira os documentários em longa-metragem lançados no Brasil em 2012 até agora:

• A Música Segundo Tom Jobim, de Nelson Pereira dos Santos• Coração do Samba, de Thereza Jassouroun• Hotxuá, de Letícia Sabatella e Gringo Cárdia• Raul Seixas – O Início, o Fim e o Meio, de Walter Carvalho• Santos, 100 Anos de Futebol Arte, de Lina Chamie• À Margem do Lixo, de Evaldo Mocarzel• Quem Se Importa?, de Mara Mourão• Argus Montenegro & A Instabilidade do Tempo Forte, de Pedro Isaías Lucas• Vale dos Esquecidos, de Maria Raduan• Paralelo 10, de Silvio Da-Rin• Uma Longa Viagem, de Lúcia Murat• Romance de Formação, de Julia de Simone• Traço Concreto, de Danilo Pschera e Eduardo Baggio• Vou Rifar Meu Coração, de Ana Rieper• Antônio Conselheiro – O Taumaturgo dos Sertões, de José Walter Lima• Constantino, de Otávio Cury• Marighella, de Inês Grinspum Moraes• Soberano 2 – A Heroica Conquista do Mundial de 2005, de Carlos Nader e Maurício Arruda • Cabra Marcado para Morrer, de Eduardo Coutinho• Tropicália, de Marcelo Machado• Expedicionários, de Otávio Cury

Fonte: site Filme B.

Números são importantes. Desde janeiro de 2012, foram lançados no Brasil 55 longas-metragens nacionais. Desse total, 21, ou seja 40%, são documentários. O dado é do Filme B, principal portal de informações sobre o mercado cinematográfico no país. Dados do mesmo site, cruzados com informações da Agência Nacional Nacional de Cinema (Ancine) mostram que, entre 2000 e 2009, chegaram às salas de exibição 181 filmes de não ficção, mas apenas 10% deles conseguiram atingir um público superior a 30 mil espectadores. O que essas cifras, então, querem dizer? Essa é uma pergunta complexa, difícil de ser respondida de forma precisa.

Há uma vertente mais pragmática no pensamento a respeito desse assunto. Em matéria publicada em 3 de setembro deste mês, pelo Jornal da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), feita a partir da dissertação de mestrado de Tereza Noll Andrade, o professor Marcius Freire, orientador da pesquisadora e uma referência nacional no gênero, diz que "o documentário fica pouco tempo na sala de cinema, assim como os filmes nacionais de maneira geral". Os títulos, segundo Freire, além de serem condenados a passar em salas pequenas, são exibidos em horários inviáveis para um público mais amplo.

Essa realidade seria consequência de uma lógica perversa na distribuição e na exibição de filmes no país, em geral controlada por grandes empresas, sobretudo as majors norte-americanas, que pouco ou nenhum interesse têm na difusão de documentários brasileiros. Esse fator, somado a um desinteresse do grande público pelo cinema nacional mais autoral e menos comercial, teria como consequência inevitável essa invisibilidade dos títulos de não ficção no mercado.

Ainda que haja, sim, um boom na produção brasileira de longas documentais, Freire, sustentado pela dissertação de Tereza Noll Andrade, afirma que não há razão para acreditar em um surto criativo entre os realizadores nacionais, tampouco em um súbito aumento no interesse do público por esse tipo de cinema. Freire vê razões de ordem muito prática no incremento na produção de filmes documentais.

Como, de todas as produtoras que se aventuraram na realização de documentários na década de 2000, cerca de 80% o fizeram apenas uma vez, com diretores que realizaram um filme só, não há motivos para mistificar ou supervalorizar essa aparente explosão produtiva, que teria suas raízes no anseio de muitos cineastas de participar de editais de fomento à realização de longas. Para Freire, o fato de o diretor já ter um filme no currículo o coloca em franca vantagem nesses processos seletivos, e o documentário por ser, em tese, um gênero mais barato de ser produzido, acaba funcionando como "porta de entrada para o mundo audiovisual", um cartão de visitas. Ou seja, um caminho mais curto para a realização de um futuro projeto de ficção.

Essa lógica nada romântica, utilitária até, pode, sim, explicar a robustez dos números relativos à produção de documentários no país, pelo menos em parte. Mas reduzir o aparente vigor da produção dentro do gênero não ficcional a explicações de ordem tão prática também pode ser um equívoco injusto.

Outro ponto de vista

Para Paulo Sérgio Al­meida, diretor do portal Fil­me B e um profissional com vasta experiência no setor cinematográfico nacional, o documentário brasileiro tem longa tradição, com grandes nomes como os dos diretores Eduardo Coutinho e João Moreira Salles, e identificar o momento atual pelo qual o gênero vem atravessando como meramente oportunista é parcial e redutor demais. Segundo ele, os realizadores de títulos de não ficção vêm fazendo um trabalho inestimável na produção de imagens, de produtos audiovisuais que refletem a realidade brasileira, seja no âmbito das artes ou no registro dos movimentos sociais e políticos do país, ainda muito ausente entre as produções feitas para a televisão.

"Onde você vai ver um documentário de qualidade sobre figuras como Vinicius [de Moraes] ou Tom [Jobim]?", indagou Almeida, se referindo aos longas, respectivamente, de Miguel Faria Jr. e Nelson Pereira dos Santos. "Os acervos de televisão no Brasil ainda são muito pobres. Se você precisar de material com qualidade física sobre eventos esportivos, por exemplo, sobre a Copa de 70, vai ter de recorrer ao que foi filmado em película na época."

Para Almeida, o argumento de que há grande produção de documentários, mas os filmes acabam tendo pouca visibilidade e alcançando plateias muito pequenas, em comparação a longas ficcionais, talvez tenha de ser relativizado. "É injusto esperar que eles tenham o mesmo público, dependendo do tema, da proposta estética. Em lugar nenhum do mundo documentários são grandes sucessos de bilheteria, salvo algumas exceções, como os filmes do Michael Moore [os premiados Tiros em Columbine e Fahrenheit 11 de Setembro]".

Na medida em que o circuito exibidor brasileiro, sobretudo aquele voltado ao cinema mais autoral, de arte, ganhar mais e mais salas equipadas com projetores digitais, os documentários terão maior penetração país afora, ocupando algumas sessões diárias e em vários espaços simultaneamente, já que não haverá a necessidade de tantas cópias em película, o que também trará uma economia significativa de custos.

O gênero também deverá ganhar impulso, aponta Almeida, com a Lei 12.485/2011, que criará uma "demanda real" para produtoras independentes. A legislação, que entrou em vigor em 1.º de setembro, estabelece uma cota mínima de produção nacional dentro da programação das tevês pagas em horário nobre.

Metade do conteúdo que irá ocupar essa reserva de espaço para programas brasileiros deverá ser realizada por parceiros independentes. "Acho que, no campo do documentário, temos muito mais condições para atender a essa demanda do que para a realização de séries, minisséries e telefilmes, gêneros para os quais há uma escassez de mão de obra competente no Brasil. Precisamos criar escolas, promover cursos e oficinas com profissionais, talvez de fora, dos Estados Unidos e da Europa, que tenham maior experiência profissional nessa área."

DebateUma questão de opção de linguagemCineastas curitibanos falam sobre a experiência de realizar documentários

Paulo Camargo

A reportagem da Gazeta do Povo ouviu três cineastas curitibanos que têm boa parte de suas respectivas filmografias voltada a documentários, para saber o que pensam do momento atual pelo qual o gênero vem passando. Foram ouvidos os diretores Luciano Coelho, Eduardo Baggio e Rafael Urban. Entre eles, é quase consensual que a profusão de títulos, que somam 40% do que chegou aos cinemas neste ano, não é resultado apenas do fato de que é mais fácil e mais barato realizar longas de não ficção, embora esses fatores de ordem prática e econômica não possam ser de todo descartados.

Para o diretor Luciano Coelho, que está em fase de edição de A Linha Fria do Hrizonte, documentário em longa-metragem sobre a música produzida na região próxima ao Rio da Prata, no Brasil, Argentina e Uruguai, essa justificativa não daria conta de explicar o que está acontecendo em sua totalidade. "Até porque eu acho que o documentário brasileiro hoje tem mais qualidade do que o cinema de ficção nacional."

Para Coelho, ao contrário do que se observa na Argentina, por exemplo, há ainda no cinema brasileiro uma dificuldade grande de contar boas histórias, focadas em personagens contemporâneos, mais próximos da vida real, da classe média que vive nas grandes cidades, e que não precisam estar a serviço de produções de grande orçamento, com a intenção de defender teses sociais ou políticas mais ambiciosas. "Os diretores, em sua maioria, preferem falar da classe mais baixa, à qual não pertencem, a retratar o próprio cotidiano, em histórias humanas."

Essa postura ainda teria a ver ainda com uma herança de engajamento formal e ideológico, vinda da geração do Cinema Novo, que pregava o lema "uma ideia na cabeça e uma câmera na mão".

O diretor, no entanto, identifica tanto nas obras de ficção quanto nas documentais um fascínio pelo real, um interesse em contar, de maneira mais realista possível, o que está acontecendo no país.

Baggio, que neste ano lançou, em circuito limitado, o documentário Traço Concreto, sobre a arquitetura modernista em Curitiba, codirigido por Danilo Pschera, também acredita que há no cinema, não apenas no brasileiro, uma tendência mais realista, muito presente na produção latino-americana e asiática, por exemplo. Essa estética, presente no cinema de ficção, justificaria, também, esse boom na produção de documentários no Brasil.

O diretor, que também tem no currículo outros documentários, não descarta a tese segundo a qual há uma maior produção de obras não ficcionais porque são mais baratas e mais fáceis de serem realizadas.

Como exemplo dessa lógica, ele cita o caso de seu documentário Amadores de Futebol (2008), realizado graças ao edital de fomento à produção audiovisual promovido pela Secretaria Estadual de Cultura, dentro da categoria de telefilmes. Em três edições do concurso, nove projetos receberam o prêmio de R$ 150 mil cada, para a realização de telefilmes – a maioria documentários. "Com esse valor, é muito mais viável".

O cineasta Rafael Urban, que correu o mundo com seu documentário em curta-metragem Ovos de Dinossauro na Sala de Estar, participando de festivais importantes, como o de Roterdã (Holanda), contou que no curso de Cinema Digital em que dá aulas, no Centro Europeu, em Curitiba, dos 30 alunos que ingressam em cada turma, talvez haja seis ou sete interessados, em um primeiro momento, no gênero documentário. "Apenas quando, à medida em que vão conhecendo mais sobre a importância do gênero dentro da história do cinema, e se dão conta de que suas bordas são largas, permitindo diferentes possibilidades de linguagem, é que se interessam."

No entender do diretor, que vai ministrar a partir da próxima semana, na PUCPR, ao lado de Baggio, o curso de extensão Cinema Documentário: Reflexões e Práticas, é imprescindível, para compreender melhor as múltiplas possibilidades do cinema de não ficção, assistir ao que já foi produzido dentro do gênero, para identificar o quanto nele há de energia criativa, capaz de tocar e provocar o espectador.

Quanto à suposta pouca visibilidade dos filmes documentais, Urban fala de sua experiência com Ovos de Dinossauro na Sala de Estar, visto por um público estimado entre 25 e 30 mil espectadores. Além das exibições em festivais, o cineasta levou seu curta-metragem às universidades, na maior parte das vezes com a sua presença, em um trabalho de corpo a corpo que atestou o apelo que o gênero pode ter.

Vertentes

Há no documentário brasileiro contemporâneo, algumas vertentes temáticas e estilísticas. Saiba quais são elas:

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