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Financiamento imobiliário

A Tabela Price está de volta

Caixa Econômica voltará a oferecer sistema de prestações fixas, alvo de milhares de processos na Justiça. Medida facilita acesso ao crédito, mas exige atenção do mutuário

Conheça as diferenças entre os sistemas mais usados nos financiamentos habitacionais |
Conheça as diferenças entre os sistemas mais usados nos financiamentos habitacionais (Foto: )

A próxima quarta-feira será de festa para o comerciário curitibano José Mauri Dal Negro e sua esposa, Célia Maria. Nesse dia, eles vão quitar a casa onde moram, no Jardim das Américas, 22 anos depois de assinar o contrato com a Caixa Econômica Federal. Um sonho realizado à custa de uma prolongada negociação judicial e incontáveis noites de insônia: Célia e José estão entre os milhares de brasileiros que parcelaram seus imóveis pela Tabela Price e um dia perceberam que, sem recorrer à Justiça, jamais conseguiriam pagar suas dívidas.

Também conhecida como Sis­­te­­ma de Amortização Francês, a Price gerou tantos calotes e processos que a Caixa parou de usá-la em 2003 – desde então, a tabela é ex­­clusividade de instituições privadas. Mas o banco público, responsável por 70% dos financiamentos habitacionais do país, mudou de ideia.

Embora não comente o assunto, por ainda não ter definido as condições da modalidade, a Caixa confirma que voltará a oferecer financiamentos corrigidos pelo sistema. O empurrão para a "volta" da Price foi dado por uma mudança no Sistema Financeiro da Habitação (SFH), que agora permite aos bancos financiar imóveis com base nessa tabela. Com a nova legislação, as instituições tendem a ficar mais protegidas de questionamentos judiciais.

À primeira vista, a novidade – incluída no programa Minha Casa, Minha Vida e aplaudida por bancos e construtoras – é boa para o mu­­­tuá­­­rio. Entre os sistemas de amortização usados no país, a Price é o que tem a menor parcela inicial. Por­­tan­­­to, mais gente conseguirá se enquadrar: cerca de 7,6 milhões de pessoas com renda de até dois salários mínimos poderão pegar em­­­préstimos de R$ 40 mil, segundo o governo federal. Além disso, em tempos de estabilidade monetária, o risco de que os empréstimos se tornem impagáveis, como ocorria nas décadas de 1980 e 1990, diminui consideravelmente.

Por outro lado, no sistema francês o saldo devedor diminui a passo de tartaruga, o desembolso com juros é maior e é mais difícil quitar a dívida antecipadamente. Além disso, uma eventual deterioração da economia brasileira complicaria a vida dos mutuários – e a Tabe­­la Price voltaria a ser sinônimo de pesadelo. Não por acaso, sua retomada é vista com desconfiança por entidades de defesa do consumidor e alguns economistas.

Ponta do lápis

As fórmulas usadas hoje pela Caixa – o Sistema de Amor­tiza­ção Constante (SAC) e o Sistema de Amortização Crescente (Sacre) – preveem prestações descrescentes, embora haja correção monetária pela Taxa de Referência (TR). Na Price, o valor da parcela é sempre o mesmo – ao menos na planiha, uma vez que sua correção também é feita pela TR. Em uma economia estável, com inflação e TR comportadas, as prestações da Price tendem a crescer suavemente ao longo do tempo. O que não é ruim, desde que o salário do mutuário acompanhe a inflação.

Pela Price, quem comprar um apartamento de R$ 150 mil, dando entrada de 20% e financiando o restante em 20 anos a juros de 1% ao mês, pagará 240 prestações de R$ 1.321,30, segundo simulação feita pelo professor Jackson Ciro Sandrini, da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Con­siderando-se um comprometimento de um terço da renda, uma família que ganhe pouco menos de R$ 4 mil mensais conseguirá ter seu financiamento aprovado – o foco do programa Minha Casa, Minha Vida são famílias com ganhos de até dez salários mínimos (R$ 4.650).

No SAC e no Sacre, a primeira prestação do mesmo imóvel seria de R$ 1,7 mil, valor acessível apenas a quem ganha pelo menos R$ 5,1 mil por mês. A contrapartida é que o saldo devedor, sobre o qual incidem os juros, é abatido mais rapidamente. Após 20 anos, o mutuário desembolsaria pouco mais de R$ 260 mil para pagar sua casa, ao passo que, pela Tabela Price, o gasto seria pelo menos 20% maior, de R$ 317 mil (veja quadro acima).

Por isso, boa parte dos especialistas indica os sistemas de prestação decrescente. "Não diria que [o estímulo do governo ao uso da Price] é legítimo ou não. Diria que ele se alinha à cultura da maioria das pessoas, principalmente as das classes mais baixas da pirâmide social, de observar apenas se a prestação cabe no ganho mensal", diz Antônio Carlos Béllio, professor de matemática financeira da Estação Business School.

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