• Carregando...
Em Curitiba, a construção de 1.411 casas do programa  no Parque Iguaçu, no bairro Ganchinho, teve entrega protelada | Aniele Nascimento/ Gazeta do Povo
Em Curitiba, a construção de 1.411 casas do programa no Parque Iguaçu, no bairro Ganchinho, teve entrega protelada| Foto: Aniele Nascimento/ Gazeta do Povo

Depois de ser exaltado como a mina de ouro do setor imobiliário nacional, há cerca de dois anos, o segmento econômico vem se mostrando muito mais desafiador do que aparentava e um privilégio para poucos.

A euforia que pegou carona com o lançamento do programa do governo federal "Minha Casa, Minha Vida", no início de 2009, começou a dar lugar a uma dose extra de cautela, principalmente por parte das empresas que, na ocasião, rearranjaram suas operações e mix de produtos para ingressar na chamada baixa renda.

"Nos últimos dois anos, os fundamentos da indústria não poderiam ser melhores, com menores taxas de juros e incentivo do governo", afirmou a equipe de análise do JPMorgan em relatório, ponderando que o crescimento "ocorreu às custas das margens operacionais, o que levou as empresas ao atual estágio de buscar reduzir riscos de execução".

Entrada em regiões onde havia pouca escala, atuação com parceiros em projetos e, sobretudo, os elevados custos de construção compuseram um cenário mais dramático, que começou a ser revelado trimestre após trimestre.

"Produzir habitação popular não é uma coisa fácil. As margens são pequenas, os riscos são grandes e aprovar empreendimentos está cada vez mais difícil", disse o vice-presidente de Economia do Sinduscon-SP, Eduardo Zaidan, para quem houve um "entusiasmo muito maior do que devia". "Quem não atuava no segmento sofreu um custo de aprendizado que não é pequeno", acrescentou.

No primeiro trimestre deste ano, com exceção da Cyrela Brazil Realty, os resultados das demais construtoras e incorporadoras que integram o Ibovespa ficaram abaixo do esperado por analistas. Os balanços também vieram com uma maior presença de imóveis nos segmentos de média e alta renda.

Se consideradas as cinco empresas com ações no índice, com exceção da MRV Engenharia -que praticamente atua apenas na baixa renda-, de 16% a 23% dos lançamentos do período foram voltados ao segmento econômico. Há alguns anos, as empresas se orgulhavam ao dizer que teriam quase metade das operações voltadas a esse nicho.

O estoque de empreendimentos econômicos também aumentou no período, respondendo pela maior fatia em empresas como PDG Realty e Rossi Residencial, com 40% e 43,5% do total, respectivamente.

No caso da MRV, os lançamentos caíram 38,3% em termos financeiros e 27,6% em número de unidades no trimestre, enquanto as vendas foram 2% menores em ambos casos.

"A pressão de custos de mão de obra é muito grande, e na baixa renda o percentual do custo é maior que na alta renda", afirmou o analista Guilherme Rocha, do Credit Suisse. "A atuação em baixa renda não é tão rentável como parecia antes e, com o aumento de custo da mão de obra, essa rentabilidade hoje é menor."

Rocha assinalou, entretanto, que os casos de estouro de custos de obra, vistos há alguns trimestres, decorrem da gestão inadequada, independentemente do segmento de atuação. "O estouro de custos é resultado muito mais da estratégia implementada, do crescimento desorganizado. O primeiro trimestre foi reflexo de ajuste da estratégia."

Apesar da desaceleração generalizada, analistas que acompanham o setor defendem as companhias especializadas em determinado segmento como as menos suscetíveis a riscos.

"Acreditamos que a MRV permanece como uma das empresas com melhor histórico de execução, com forte foco nas operações", afirmou o JPMorgan, ressaltando por outro lado o desafio de recuperar as margens aos níveis vistos em anos anteriores.

Entraves

Se construir moradias voltadas ao segmento econômico não é tarefa fácil, para as famílias pertencentes à baixa renda comprar um imóvel também não é tão simples quanto pode parecer.

Um estudo recente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) mostrou que, em São Paulo, cerca de 60% das famílias não têm condições de comprar um imóvel, sendo o principal obstáculo a baixa oferta de imóveis -desconsiderando os subsidiados pelo governo- a preços acessíveis.

De fato, o valor dos imóveis que segundo algumas companhias integram a faixa mais baixa de renda chega a ser contraditório. No caso das seis empresas do setor dentro do Ibovespa, o preço médio dos empreendimentos classificados como segmento econômico variam de R$ 108 mil a R$ 200 mil.

"Quanto mais baixo o valor, mais difícil é a operação", disse Zaidan, do Sinduscon, citando empresas que classificam como segmento econômico imóveis com valor até R$ 200 mil, de forma a manter a categoria, para a qual não existe qualquer regulamentação de valores, em seu mix.

Outros entraves para as famílias paulistanas não conseguirem comprar um imóvel, segundo o estudo do BID, são renda muito baixa, dificuldade para provar renda e altas taxas de juros.

A segunda etapa do programa "Minha Casa, Minha Vida" tem como objetivo contratar 2 milhões de moradias até 2014, sendo 60% para famílias com renda mensal de até três salários mínimos.

Até 22 de maio deste ano, foram contratadas 694.570 unidades pela Caixa Econômica Federal, principal agente financiador do programa, sendo 196.876 delas na faixa de renda mais baixa.

A presidente Dilma Rousseff planeja anunciar este mês a ampliação da meta do programa do governo federal para 2,4 milhões de moradias contratadas no mesmo prazo.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]