• Carregando...
Escândalos envolvendo decisões do conselho da Petrobras foram sinal de alerta para várias empresas. | Tânia Rêgo/Agência Brasil
Escândalos envolvendo decisões do conselho da Petrobras foram sinal de alerta para várias empresas.| Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Pelo menos um tipo de profissional pode sair ganhando com as brigas societárias em empresas e com a vigilância maior sobre a governança de grandes negócios após a Operação Lava Jato, que apura esquema de corrupção na Petrobras. A necessidade de resgatar a confiança em ícones empresariais brasileiros reforçou a busca por conselheiros de administração com experiência executiva no país, em especial os ex-presidentes de empresas.

Na consultoria de recursos humanos Page Executive, a procura de empresas por novos conselheiros – seja para grupos novos ou já existentes – aumentou em 50% no primeiro semestre, na comparação com o mesmo período do ano passado. “O que está ocorrendo nas empresas é uma corrida pelo compliance (cumprimento da legislação)”, resume Leandro Muniz, diretor da Page Executive.

A Operação Lava Jato acendeu a luz amarela sobre a governança corporativa não só entre as empresas listadas em bolsa e as sociedades anônimas, que são obrigadas a manter conselhos de administração, mas também nas médias empresas, com receita entre R$ 100 milhões e R$ 500 milhões. “Houve um efeito cascata, pois as companhias menores viram a necessidade de se preparar para a nova realidade”, diz Carlos Eduardo Altona, diretor da consultoria de busca de executivos Exec.

O mercado potencial para formação de conselhos cresce, com as médias empresas, para um total de 15 mil negócios, segundo cálculos de mercado. Isso abre um leque importante de oportunidades para profissionais de mais de 50 anos, com experiência corporativa. “Esses profissionais, às vezes até ex-CEOs, hoje buscam um cargo um conselho para pôr no currículo. Assim, a média empresa pode atrair um perfil que normalmente não conseguiria”, explica Altona.

A atratividade do cargo de conselheiro motivou o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) a ampliar as oportunidades de formação para esses profissionais. Em 2015, a entidade, considerada referência na área, realizou formações em cinco estados, atraindo 490 profissionais.

Remuneração

Embora as médias empresas paguem para conselheiros valores bem mais baixos do que as companhias de capital aberto – há posições que ofertam cerca de R$ 5 mil por mês –, esses cargos podem ser a porta de entrada desses profissionais em grandes companhias, que costumam ter remunerações agressivas.

Segundo pesquisa da consultoria Korn Ferry Hay Group com 40 empresas de capital aberto, um membro de conselho de administração recebia remuneração anual média de R$ 250 mil no país, em 2015. Já um presidente de conselho ganhava, em média, R$ 337 mil.

Dados da mesma consultoria mostram que as empresas de grande porte ainda poderão abrir espaço para executivos de mercado em seus conselhos no futuro. Hoje, no Brasil, 41% dos conselheiros de companhias de capital aberto são independentes, ante uma média de 84% nos Estados Unidos.

Decorativos

A reboque da alta remuneração e do status trazido por um cargo de conselheiro – especialmente em empresas de renome – vêm os riscos do cargo, incluindo a possibilidade de perda do patrimônio pessoal. No Brasil, indicações políticas para conselhos ainda são comuns, assim como a nomeação de pessoas que têm o único objetivo de atender a interesses de acionistas, e não do negócio como um todo.

Embora as regras de punição pela má performance de um conselheiro sempre tenham existido, o consenso é que a Lava Jato deixou a questão tangível, já que ex-conselheiros da Petrobras hoje enfrentam processos na Justiça americana.

Para Richard Blanchet, membro do conselho de administração do IBGC, a presença de membros “decorativos” nos grupos deve ser reduzida no país. “Acho que os profissionais agora vão entrar em conselhos com mais consciência”, diz. “Não dá mais para pensar que ser conselheiro é participar de uma reunião por mês.”

Para um dos conselheiros mais ativos do Brasil, o investidor Guilherme Affonso Ferreira, o nível de preparo e conhecimento do negócio dos conselhos brasileiros está melhorando. Presente nos boards de Sul América, Gafisa, Valid, Arezzo e T4F, ele também entrou recentemente na Petrobras. Para Ferreira, a Lava Jato deixou claro que o conselheiro não pode mais apenas alegar que não sabia de problemas ou fraudes. “O conselheiro é sempre responsável, goste ou não disso. O pecado pode ser por ação ou omissão, mas é sempre pecado.”

Conselho de média empresa atrai com responsabilidades menores

Embora a remuneração oferecida por conselhos de administração formados por empresas familiares de médio porte em geral seja bem inferior à paga nas companhias de capital aberto, esses grupos – que geralmente tem caráter consultivo, e não deliberativo – oferecem uma grande vantagem: o patrimônio do profissional que aceita o cargo não é colocado em risco.

Em conselhos deliberativos, a legislação brasileira prevê que o membro do conselho pode ter de arcar com dívidas do negócio usando o patrimônio pessoal, especialmente em caso de fraudes e malfeitos. Embora as grandes companhias costumem contratar seguros para proteger os conselheiros, há quem prefira não trocar o certo pelo duvidoso.

É por essa razão que Richard Doern, que hoje é conselheiro profissional, escolheu participar somente de grupos consultivos em empresas de capital fechado. Hoje, ele faz parte dos conselhos de grupos familiares como Piccadilly (tradicional companhia gaúcha de calçados), Kinoplex (rede de cinemas carioca, anteriormente conhecida como Severiano Ribeiro) e Mater (empresa paulistana de distribuição de materiais elétricos).

“Nos últimos 11 anos, passei por 13 empresas”, conta Doern, que começou a ser convidado para o cargo por ter se especializado, desde os anos 1990, em assumir a presidência de negócios familiares em dificuldades. Na última década, ele passou de funções executivas para os conselhos. “Acho que o principal desafio é a passagem do bastão dos fundadores para a nova geração de administradores. Muitas empresas morrem justamente nesta fase.”

Segundo Dalton Sardenberg, professor da Fundação Dom Cabral, o trabalho do conselheiro nas médias empresas está menos focado no controle e fiscalização de processos e mais concentrado na profissionalização. “Entre as atribuições estão a busca da longevidade do negócio, a preparação dos herdeiros para funções executivas, a adoção de boas práticas corporativas e a solução de conflitos”, explica.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]