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Inversão de tarefas coloca em risco programas como o Minha Casa, Minha Vida, avaliam arquitetos | Antônio More/Gazeta do Povo
Inversão de tarefas coloca em risco programas como o Minha Casa, Minha Vida, avaliam arquitetos| Foto: Antônio More/Gazeta do Povo

Resistência

Órgãos estatais não cumprem atribuições, diz professor

A resolução 51 do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR), publicada em julho no Diário Oficial, define quais atribuições são privativas da profissão de arquiteto e não podem ser realizadas por outras categorias. Entre as tarefas está o projeto urbanístico e de parcelamento do solo mediante loteamento, serviço necessário para a execução do programa federal Minha Casa, Minha Vida.

Para o professor de arquitetura da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) e conselheiro do CAU/BR, Claudio Forte Maiolino, a arquitetura foi "prisioneira" do sistema de engenheiros por 80 anos, fato que persiste, mesmo com a saída da classe do Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Urbanismo (Crea) em 2011.

"Há uma resistência dos órgãos estatais em cumprir atribuições de cada profissional. [No caso da Caixa], tudo leva a supor que engenheiros fazem o trabalho de arquitetos. Se for isso, o CAU pode notificar, pois a legislação é clara", aponta Maiolino.

Terceirização

Além de não convocar a maioria dos profissionais aprovados em concurso público, a Caixa contrata escritórios de arquitetura para realizar serviços dos setores de habitação e urbanismo, segundo o Sindarq-PR. O Decreto-Lei n.º 200/67 permite ao banco fazer esse tipo de contrato. Segundo a Caixa, o serviço terceirizado é complementar e diferente do realizado por profissionais do quadro próprio, funcionando como uma espécie de "auditoria". Com o argumento de que a informação é estratégica, o banco não detalhou as atribuições dos escritórios contratados.

O ritmo de contratação dos aprovados no concurso público promovido pela Caixa Econômica Federal em abril de 2012 dá a entender que o banco está privilegiando os engenheiros civis, em detrimento dos arquitetos.

Desde a publicação do resultado do certame, em julho de 2012, apenas dois dos 20 profissionais de arquitetura da lista de classificados no Paraná foram admitidos pela instituição – ou seja, 10% do total. No mesmo período, 26 dos 33 engenheiros classificados (79% dos aprovados) entraram para o quadro de funcionários da Caixa. Algo semelhante ocorre em outros estados.

Diante dessa disparidade, a Federação Nacional dos Arquitetos (FNA) e o Sindicato dos Arquitetos e Urbanistas no Estado do Paraná (Sindarq-PR) suspeitam que engenheiros estejam sendo contratados para funções exclusivas de arquitetos.

Na avaliação dessas entidades, a inversão de tarefas coloca em risco a execução de programas sociais da Caixa nas áreas de habitação (como o Minha Casa, Minha Vida), saneamento, desenvolvimento urbano e mobilidade.

"As atribuições dos arquitetos são maiores que a dos engenheiros e muitas são exclusivas. O não cumprimento das atribuições pode ocasionar a redução da qualidade dos serviços oferecidos pela Caixa", diz Ormy Leocádio Hütner Júnior, presidente do Sindarq-PR.

Em um encontro entre as entidades de classe e a direção da Caixa, em março deste ano, algumas medidas foram acordadas, como a revisão de um normativo que define as atribuições dos arquitetos dentro da entidade. A profissão era regulamentada por uma lei federal de 1966, que foi substituída por outra em 2010 – mas o banco estatal ainda não adotou a nova norma.

"Apesar da promessa da direção da Caixa, não tivemos retorno em relação aos nossos pedidos. A única coisa que aconteceu foi a prorrogação da validade do concurso por mais um ano", lamenta Hütner, que estuda, junto ao departamento jurídico do Sindarq-PR, ingressar com medidas na justiça contra o banco.

Outro lado

Procurada pela reportagem, a Caixa informou, em nota, que a convocação dos aprovados no concurso ocorre de acordo com as necessidades e a disponibilidade de vagas. Ainda segundo o banco, a convocação está sendo feita dentro da normalidade e das normas do edital. A assessoria de imprensa da Caixa não quis informar quantos arquitetos e engenheiros fazem parte de seu quadro de funcionários no Paraná, alegando que essa informação é "estratégica".

Descompasso ocorre em todo o país

O descompasso na convocação dos arquitetos e engenheiros civis aprovados no concurso da Caixa não é exclusividade do Paraná. A situação é semelhante em outros estados.

No Rio Grande do Sul, apenas 10,5% dos arquitetos (dois de 19) da lista de classificados foram admitidos. Em Santa Catarina, foram dois de 15 (13%). Em compensação, 11 dos 12 engenheiros aprovados no Rio Grande do Sul já foram contratados. Em Santa Catarina, 12 de 16 classificados já trabalham no banco.

A situação mais desigual é a do Nordeste. De 46 arquitetos aprovados no concurso, só quatro (8%) já fazem parte do quadro de funcionários da Caixa. E esses quatro foram chamados na Bahia e no Maranhão; nos demais estados da região, nenhum profissional foi convocado até agora.

Em todo o país, 56 dos 229 arquitetos aprovados no concurso de abril de 2012 foram admitidos, pouco menos de um quarto do total. Por outro lado, a taxa de convocação dos engenheiros chega a 75% – a Caixa contratou 208 dos 278 classificados. O banco realizou, em maio passado, as provas para um novo concurso de engenheiros.

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