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Depois da sua banalização eleitoral, a expressão "choque de gestão" perdeu toda a sua utilidade. Foi, infelizmente, associada a "corte" das despesas sociais ou a cassação de direitos dos trabalhadores. O que não é, nem poderia ser, verdadeiro. É claro que o Brasil se enfiou numa armadilha, em parte conseqüência de alguns exageros da Constituição de 1988: 1.º) uma carga tributária bruta da ordem de 38% do PIB, à qual se soma um déficit nominal da ordem de 3%; 2.º) uma relação dívida líquida/PIB da ordem de 50% (a dívida bruta, mais utilizada nas comparações internacionais, é da ordem de 74%!); 3.º) um nível de investimento público pouco superior a 1% do PIB; 4.º) uma relação crédito privado/PIB ligeiramente maior do que 30% e 5.º) uma taxa de juro real entre 9% e 10%, ainda a maior do mundo, que se compara com uma taxa de juro real média dos emergentes da ordem de 2,5%. Este é um fator agravante da natural valorização que deveria ter o real, que é muito maior do que a de todos os países emergentes. Foi a combinação desses problemas que produziu o crescimento medíocre que nos acompanhou nos últimos 12 anos. Mas, de qualquer forma, a situação melhorou entre 2002 e 2006, principalmente no que se refere à nossa posição externa, hoje muito mais cômoda.

A verdadeira tragédia nacional é que, tomando 1993/94 como base, o crescimento real médio do PIB foi da ordem de 2,4%, enquanto as despesas de custeio reais do governo federal cresceram à taxa de 6% ao ano, taxas absolutamente insustentáveis a longo prazo. Não existe a menor possibilidade de voltarmos a um crescimento robusto e sustentado sem um controle desse processo. Ao contrário do que se imagina, entretanto, ele pode e deve começar a ser feito com um programa inteligente e crível ao longo dos próximos quatro anos, sem sacrificar as despesas sociais em termos reais (educação, saúde e previdência): para as duas primeiras, bastará corrigi-las apenas pela taxa de inflação e exigir um pequeno aumento de produtividade da ordem de 1,5% (o crescimento da população); o mesmo para a previdência, complementando-a com maior rigor na fiscalização e com medidas que desonerem os enormes custos que incidem sobre o salário e estimulem uma maior liberdade de negociação no mercado de trabalho. Isso pode, deve e tem de ser feito sem sacrificar os direitos conquistados em um século e meio de luta dos trabalhadores. A inadiável formalização dos trabalhadores daí decorrente dará tempo para que se estude um mecanismo previdenciário geral (que inclua o setor público e o privado) mais justo e sustentável.

dep.delfimnetto.camara.gov.br

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