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Componentes do governo federal querem agilizar a cobrança de valores devidos pelos cidadãos desta República. Sim, mas não querem pagar valores representados por títulos tão líquidos quanto certos, que estão mumificados sob denominação de precatórios.

Há poucos meses foi alinhavado um projeto de designação específica de Procuradores da Fazenda Nacional, para atenderem créditos tributários maiores em fase de demanda contra contribuintes. Com a fusão dos órgãos e funções da Receita Federal e dos departamentos do INSS, resultou enorme confusão e o reordenamento dos processos que paulatinamente está acontecendo, inspirou a alta cúpula para aquela finalidade.

Agora o Congresso Nacional vai apreciar três projetos de lei destinados a "agilizar a cobrança da dívida ativa da União", assim devendo ser entendidos não só os valores em litígio , mas também as simples obrigações do cidadão para com o governo federal, que já estejam vencidas, mas que nem foram objeto sequer de início de demanda.

Não houve muito alarde a propósito da nova investida da União , que diz totalizar a "divida ativa" algo como 650 bilhões de reais. Mas o objetivo é reduzir o tempo de duração das providências administrativas e judiciais para a cobrança , de uma média de 12 anos, para metade. Compreensível. Veremos se factível.

Mas embutida na pretensão governamental, constata-se perigosa inversão da ordem processual quanto à liberdade fundamental de ampla defesa, quando faz parte do projeto a obrigatoriedade de indicação de bens penhoráveis que anteceda o encaminhamento ao Judiciário, dos processos de cobrança. E para que isto assim inquisitorialmente funcione, o cidadão, a empresa, o ente devedor, terá que enunciar, descrever , inscrever o rol de seus bens, no também projetado "Cadastro Nacional de Patrimônio", que será integrado pelo registro de imóveis em cartórios, idem de veículos, de ações, de títulos públicos de patentes.

Engessar a circulação de bens que compõe o patrimônio corpóreo e incorpóreo existente no país – os economistas denominam esse universo de "ativo nacional" - é a conseqüência que resultará do mencionado cadastro. Imagine-se o registro que terá de ser feito a cada movimentação de um desses bens que se não estiverem cadastrados serão conceituados como sonegados ! Francamente, isto é impertinente à ordem do estado democrático de direito. Já não temos a declaração de bens anualmente feita com a declaração de rendas? Já não temos secularmente insculpida nas paredes dos cartórios a advertência de nosso sistema de Direito Civil: "quem não registra não é dono"! Já não basta que veículo algum circule sem o renavam que comprova a propriedade? As ações de capital já não são nominais? Os títulos tem registro em Bolsa.O que mais quer o alto escalão da República ? e o cidadão , a cada movimentação de algum de seus bens vai ter que denunciar a mudança para o cadastro...

Como mel passado na boca, o projeto fala em criação de "conselho de conciliação" para funcionar antes da cobrança judicial. Já existem conselhos administrativos julgadores para todos os créditos tributários federais cuja exatidão seja discutida. Simplesmente dê-se competência para que transijam quando entenderem oportuno à rapidez de recolhimento aos cofres da União.

De outro lado, enquanto se abusa do conteúdo de normas sob o rótulo de defesa dos interesses da Fazenda Nacional, procura-se conquistar votos de congressistas para aprovação de um dos maiores absurdos desde os tempos imperiais, concernente aos "precatórios". Em recente artigo já detalhamos essa enormidade. Basta repetir que a Câmara de Deputados examina projeto de lei destinada a esticar para quinze anos o prazo eternizante de pagamento do que entes públicos devem às pessoas jurídicas e, pior (?), às pessoas físicas. Abreviar, só em "leilão ao contrário" de dívida pública: quem concordar em receber menos, receberá!

Geroldo Augusto Hauer, sócio fundador de G A Hauer Advogados Associados.

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