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Números retirados de peças publicitárias publicadas no domingo mostram dois universos diferentes no mundo dos juros e financiamentos. Por um lado, concessionárias Volkswagen anunciavam seus modelos com um Custo Efetivo Total (CET, a conta que inclui os juros mais os impostos e tarifas cobradas no negócio) de 15,7% ao ano. Por outro, as Casas Bahia ofereciam eletrônicos e aparelhos domésticos a 76,3% ao ano de CET. As Casas Bahia são apenas um exemplo – outras redes, como Magazine Luiza ou Ponto Frio, para ficar apenas em nomes de alcance nacional, praticam taxas equivalentes.

Enquanto isso, os bancos – ou pelo menos alguns deles, como Banco do Brasil, Caixa, Itaú e, de modo mais modesto, Bradesco – apregoam estar reduzindo suas taxas em categorias como cheque especial e empréstimo pessoal. As redes varejistas parecem estar encasteladas no alto de suas taxas, defendendo um território que parece perdido.

Seria apenas uma questão de tempo para que elas também se rendam e baixem suas taxas de juros?

Antes de mais nada, é importante observar que as taxas dos varejistas sempre foram mais altas do que, por exemplo, as do financiamento de automóveis. Isso se deve a fatores próprios de cada mercado. Se um cliente deixar de pagar o financiamento do carro, por exemplo, o banco pode reaver o bem – custa caro e pode até não compensar, mas é possível. Se ele deixar de pagar a prestação de um aparelho de tevê, não faz sentido tentar retomá-la, porque seu valor de mercado será irrelevante. "O risco de quem concede esse crédito é maior, e isso se traduz por um preço mais alto", observa o economista Breno Lemos, professor da PUCPR.

Com base nessas diferenças, Lemos não é muito otimista. "Não vamos ver isso no curto prazo", diz. Na opinião dele, para que os juros do comércio varejista caiam serão necessárias algumas mudanças na sociedade brasileira e em algumas regras legais. As mudanças mais amplas dizem respeito ao mercado de trabalho. Quanto maior for a quantidade de empregados formais, maior a chance de os juros baixarem. Isso porque o trabalhador informal não tem condições de comprovar renda, condição básica para obter financiamentos. Mas também é um consumidor, que precisa ser atendido pelas redes de lojas. Precisa de crédito.

Outra questão é a diferenciação de crédito. Todo consumidor tem acesso sempre às mesmas taxas, seja ele um pagador pontual ou um caloteiro contumaz. Se o varejista pudesse separar os públicos e cobrar taxas diferenciadas, por exemplo, o bom cliente poderia pagar menos. Isso, entretanto, esbarra em questões legais e também práticas – os comerciantes pregam a criação de um cadastro positivo, uma espécie de SPC às avessas, com nomes e CPFs de bons pagadores, que nunca saiu do papel.

Por último, está a vocação dos varejistas. As lojas estão aí para vender. Veja o que está acontecendo com o setor de automóveis. A demanda do público por carros novos não caiu, mas os bancos estão sendo restritivos, não aprovam financiamentos quando seus modelos matemáticos apontam um cliente como arriscado. A consequência é a que o leitor deve ter visto na página 18: as vendas estão caindo e as promoções que aparecem não estão dando conta de acabar com os imensos estoques.

Os varejistas dificilmente poderão seguir a mesma lógica. Seria péssimo para eles e para sua cadeia de fornecedores. Na semana passada, na conferência em que apresentou a acionistas e analistas os resultados financeiros do primeiro trimestre, o presidente da Positivo Informática, Hélio Rotenberg, mostrou-se preocupado com isso. "Precisamos entender bem essa questão, essa baixa das taxas, se realmente é um fato positivo ou negativo", observou. "Para mim está claro que, se houver baixa de taxa generalizada, também deve haver restrição, e isso pra nós não é bom."

É claro que o aumento da renda da população, a manutenção de baixos índices de desemprego no longo prazo e o aumento no porcentual de trabalhadores formais pode mudar esse cenário. Mas não conte com isso para trocar de tevê na semana que vem.

Um pelo outro

Breno Lemos aponta que há uma possibilidade de os varejistas serem forçados a baixar suas taxas. "Se o cliente perceber essa diferença claramente, ele vai tomar dinheiro emprestado no banco para comprar a televisão ou a geladeira", diz. Até agora, entretanto, ele diz que essa percepção não existe. "Os bancos têm feito muita propaganda, mas as mudanças não têm sido intensas", comenta.

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