O economista José Roberto Mendonça de Barros acha que a crise atual não é o fim de um ciclo, mas um ajuste no meio do ciclo. Ele acredita no descolamento. Diz que a demanda interna dos emergentes pode segurar o crescimento dos países, o Brasil depende cada vez menos dos Estados Unidos; as bolsas dos emergentes vão se recuperar mais rapidamente; e o saldo comercial brasileiro pode ir a zero no ano que vem.
Aqui tenho escrito, desde o começo, que não acredito que os outros países, principalmente os emergentes, possam se descolar da crise da economia americana. Se a globalização adensou as relações entre os países, como é possível que o que acontece na economia mais forte do mundo não se reflita em outros países? A tese do descolamento foi muito popular e hoje tem menos defensores. O economista que previu a crise, Nouriel Roubini, nunca apostou uma ficha furada nela.
José Roberto tem mantido outra convicção. Ele acha que o que realmente não descolou foi o mercado de renda variável; as bolsas. Elas caíram no mundo inteiro. Mas isso tem um motivo, explica:
É gestão de portfólio de investidores globais. Até por razões prudenciais, eles têm que manter a mesma proporção de carteira em cada país. Se cai muito o valor das ações lá, têm que vender onde não caiu para manter a mesma proporção.
Os dados ainda mostram, ressalta José Roberto, que o crescimento dos países emergentes é mais forte que o dos desenvolvidos.
O que está acontecendo é o fim do ciclo econômico ou uma mudança no meio do ciclo? questiona.
Depois de crescer forte por cinco, seis anos, as economias desenvolvidas caíram. Primeiro, caíram os Estados Unidos, pela crise hipotecária; na semana passada, a Europa e o Japão divulgaram dados mostrando que encolheram no segundo trimestre. Para José Roberto, a economia mundial está apenas num ajuste no meio do ciclo.
O Fed já mostrou que vai evitar o pior, ou seja, uma crise bancária; o mercado de trabalho americano é flexível e pode recompor a renda das famílias. Em dois ou três anos, ele faz a digestão da crise imobiliária e volta a crescer. A resiliência (capacidade de absorver choques e se adaptar) dos mercados emergentes é grande por causa do dinamismo dos mercados internos.
Um exemplo de como os mercados internos podem suprir a queda da demanda americana está na venda de carros. Ele conta que, nos Estados Unidos, a venda de automóveis caiu de 16 milhões para 13,5 milhões este ano; na China, o aumento agora em 2008 está sendo de 3 milhões.
No caso do Brasil, o país deve crescer 4,8% neste ano. Diminuirá o crescimento para 3,5% no ano que vem, mas depois se recupera. José Roberto acha que o mercado interno continuará forte; com crescimento de emprego e renda. A receita de exportação vai cair com a queda das commodities, e, se os preços delas caírem muito, o saldo comercial vai a zero no ano que vem.
O dólar começará, então, a se recuperar em relação ao real.
O Brasil depende hoje menos dos Estados Unidos na exportação. Em 1999, o país mandava para os EUA 22,6% das suas exportações, hoje manda 15,8%; para a Europa, iam 28,6% e agora, 25,2%. O gráfico abaixo mostra esses e outros exemplos.
Há casos concretos. O pessoal de móveis e granitos vendia para o boom imobiliário americano. A crise começou, e eles redirecionaram para o Oriente Médio e a Europa, mas a exportação ficou estável em dólar.
José Roberto argumenta que, dentro da inflação, há outro dado indicando a diferença entre as economias. Nos países desenvolvidos, a inflação no núcleo (expurgando alimentos e energia) está baixa, por volta de 2%; nos países emergentes, até o núcleo está alto. Isso porque, em locais como Rússia, Índia, China, a forte alta da demanda faz com que a inflação tenha contaminado todos os setores. Esse indicativo confirma o descolamento, na visão dele, pois mostra que esses países estão crescendo a despeito da crise americana ter completado já um ano.
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