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Nesta semana, o presidente Barack Obama disse o óbvio: que os americanos ricos, muitos dos quais pagam impostos notavelmente baixos, deveriam arcar com parte do custo da redução do déficit orçamentário a longo prazo. E os republicanos, como o representante Paul Ryan, responderam com gritos de "guerra de classes".

É claro que não era nada do tipo. Pelo contrário, são pessoas como Ryan, que querem isentar os ricos de ter de arcar com qualquer parte do ônus de fazer com que nossas finanças sejam sustentáveis, que estão travando uma guerra de classes.

Para entender o problema, é preciso saber o que tem acontecido com as rendas das últimas três décadas. Estimativas detalhadas do Gabinete Orçamentário do Congresso (Congressional Budget Office) demonstram que, entre 1979 e 2005, o rendimento das famílias situadas no meio do gráfico de distribuição de renda (classe média) aumentou 21%, com o ajuste da inflação. Isso representa um crescimento, mas é lento, especialmente se comparado ao aumento de 100% na renda média ao longo de uma geração após a Segunda Guerra Mundial.

Enquanto isso, nesse mesmo período, a renda dos muito ricos, os 100 primeiros do 1% do topo da distribuição de renda, subiu 480%. Não, isso não é um erro de tipografia. No dólar de 2005, a renda mé­­dia anual desse grupo subiu de US$ 4,2 milhões para US$ 24,3 milhões.

Então, por acaso, parece serem os ricos as vítimas de uma guerra de classes?

Para sermos justos, há, sim, o argumento sobre até que ponto a política do governo tem sido responsável pela espetacular disparidade no crescimento de renda. No entanto, o que sabemos com certeza é que essa política tem consistentemente pendido para a vantagem dos ricos, em oposição à classe média. Alguns dos aspectos mais importantes dessa pendência envolvem coisas como o desregulamento financeiro e o ataque constante ao trabalho organizado, que criaram fortunas enormes enquanto foram pavimentando o caminho para o desastre econômico. Por enquanto, todavia, foquemo-nos nos impostos.

Os números do Gabinete Orçamentário demonstram que o ônus do imposto federal caiu para todas as classes de renda, o que, por si só, já derruba a retórica que se ouve dos suspeitos usuais. Mas foi para os ricos que esse fardo teve uma queda muito maior, como porcentagem de renda. Em parte isso reflete grandes cortes em taxas de imposto de renda superior, mas, além disso, tem havido uma enorme mudança na cobrança dos impostos, tirando o ônus da riqueza para colocá-lo sobre o trabalho: as taxas de imposto sobre lucros corporativos, rendimentos de capitais e dividendos, todas caíram, enquanto o imposto sobre os salários – o principal imposto pago pela maioria dos trabalhadores – subiu.

E uma consequência dessa mudança na cobrança é a criação de muitas situações nas quais – como dizem Warren Buffett e Oba­ma – pessoas com rendas multimilionárias, que tipicamente derivam muito dessa renda de rendimentos de capitais e outras fontes de baixo imposto, acabam pagando uma taxa tributária no geral mais baixa do que trabalhadores da classe média. E não estamos fa­­lando só de alguns casos excepcionais.

De acordo com novas estimativas do não-partidário Tax Policy Center (Centro de Política Fiscal), um quarto das pessoas com renda de mais de US$ 1 milhão por ano pagam 12,6% (ou menos) de im­­postos, o que põe seu ônus tributário abaixo de muitos da classe média.

Agora, eu sei que a direita responderá a esses fatos com estatísticas dissimuladas e declarações morais duvidosas.

Por um lado, temos o argumento de que a cota crescente de impostos paga pelos ricos demonstra um aumento, e não uma queda, de seu ônus. Para dizer o óbvio, os ricos estão pagando mais impostos porque estão muito mais ricos do que costumavam ser.

Por outro lado, temos o argumento de que os ricos têm o direito de ficar com seu dinheiro – o que ignora o fato de que todos nós vivemos e nos beneficiamos sendo parte de uma sociedade maior.

Elizabeth Warren, a reformista financeira que agora disputa uma vaga no senado de Massachusetts, recentemente fez alguns comentários eloquentes sobre isso que estão, merecidamente, atraindo muita atenção. "Não existe ninguém neste país que tenha ficado rico sozinho. Ninguém", ela declarou, apontando que os ricos só podem enriquecer graças ao "contrato social" que lhes providencia uma sociedade decente e funcional na qual podem prosperar. O que nos leva de volta àquelas exclamações de "guerra de classes".

Os republicanos afirmam estar profundamente preocupados com os déficits orçamentários. De fato, Ryan chamou o déficit de uma "ameaça existencial" à América. E, no entanto, eles insistem que os ricos – que, presumivelmente, têm tanto a perder quanto qualquer um no que diz respeito ao futuro da nação – não deveriam ser chamados para ter qualquer papel em afastar essa ameaça existencial.

Bem, isso tudo significa uma exigência de que um número pequeno de pessoas muito sortudas sejam isentadas do contrato social que se aplica a todo mundo. E, caso você esteja se perguntando, essa é a verdadeira face de uma guerra de classes.

Tradução: Adriano Scandolara.

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