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O que a China e Alemanha têm em comum com o Partido Republicano? Todos estão tentando intimidar o Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) a abandonar o esforço para criar empregos. Os motivos que guiam os dois países e os políticos de oposição norte-americanos são altamente suspeitos.

O Fed não está sendo radical. É verdade que o órgão costuma conduzir a política monetária comprando títulos de curto prazo da dívida dos EUA. Agora, no entanto, atua no mercado de títulos de longo prazo – operação que leva o péssimo nome de "alívio quantitativo". Isso ocorre, em parte, porque comprar mais dívida de curto prazo não faria sentido, uma vez que a taxa de juros sobre esses papéis está próxima de zero. O presidente do Fed, Ben Bernanke, estava certo quando rebateu as críticas e disse que as novas operações são "apenas política monetária". O Fed está tentando reduzir os juros, como sempre faz quando o desemprego está alto e a inflação está baixa.

E a inflação está realmente baixa. O núcleo inflacionário – medida que exclui os preços voláteis da comida e da energia e, por isso, reflete tendências econômicas de maneira mais acurada do que o índice cheio – está em 0,6%, o menor nível da história dos EUA. Enquanto isso, a taxa de desemprego está próxima de 10% – o pior desempenho de longo prazo do mercado de trabalho norte-americano desde a Grande Depressão.

A necessidade de medidas do Fed é, portanto, inquestionável. Na verdade, a única preocupação razoável – uma preocupação que eu tenho – é se essa atuação não é muito fraca e pouco eficaz. Mas, assim como existem pessoas sensatas, há também o "eixo da depressão", formado por China, Alemanha e republicanos.

Não há mistério algum no porquê de China e Alemanha estarem em pé de guerra com o Fed. Os dois países estão acostumados a gigantescos superávits comerciais. Para que obtenham esses resultados, outros países precisam ter déficits – e há anos os EUA têm saldo negativo na balança comercial. As medidas expansionistas do Fed têm como efeito colateral o enfraquecimento do dólar, o que torna os produtos norte-americanos mais competitivos e ajuda a reduzir o déficit que o país sustenta no comércio internacional. Chineses e alemães não querem que isso ocorra.

Aliás, para o governo de Pequim, atacar o Fed tem uma vantagem adicional: jogar a atenção para longe de sua própria manipulação cambial. A China mantém sua moeda artificialmente fraca – justo aquilo que o país acusa falsamente os EUA de cometer.

Mas por que os republicanos se uniram aos ataques externos? Bernanke e seus colegas parecem surpresos ao entrar nessa mira. Afinal suas decisões, pensavam os comandantes da política monetária, seguem o espírito de ninguém menos do que Milton Friedman, o homem que culpou o Fed de não ter agido com mais força durante a Grande Depressão. Em 1988, Friedman também orientou o Banco do Japão a "comprar títulos do governo no mercado", exatamente o que o Fed faz neste momento. Os republicanos, entretanto, não entendem dessa forma e levantam objeções que vão do esquisito ao incoerente.

O esquisito: na segunda-feira da semana passada, um grupo de figuras republicanas para lá de estranhas (quem aí sabia que William Kristol era um especialista em política monetária?) divulgou uma carta aberta para alertar que as medidas do Fed "trazem o risco de desvalorização do dólar e de inflação". As mesmas preocupações foram repetidas na carta que quatro líderes republicanos do Congresso enviaram a Bernanke na última quarta-feira. Nenhum dos textos explica por que os americanos devem temer a inflação quando na realidade a inflação está batendo recordes de baixa.

A respeito da desvalorização cambial, deixo de lado o fato de que esse movimento na verdade ajuda a produção industrial dos EUA e pergunto: onde estavam essas pessoas durante o governo anterior? O dólar se enfraqueceu continuamente durante a maior parte da era Bush – num declínio que ofusca os deslizes recentes. Por que não surgiam cartas pedindo que o então presidente do Fed, Alan Greenspan, apertasse a política monetária?

Ao mesmo tempo, existem as incoerências: dois republicanos, o deputado Mike Pence e o senador Bob Corker, sugeriram que o Fed deve abandonar os esforços para alcançar o emprego pleno e atuar somente sobre a estabilidade dos preços. Por quê? Porque o desemprego permanece alto. Não, eu também não entendo a lógica.

Afinal, o que está por trás dos ataques do Partido Republicano? A equipe de Bernanke foi pega de surpresa, mas o especialista em questões orçamentárias Stan Collender já havia previsto essa retórica. Em agosto, Collender alertou Bernanke que, "se os congressistas republicanos enxergassem as dificuldades econômicas como o caminho para a glória eleitoral", eles "fariam oposição a qualquer medida adotada pelo Federal Reserve para erguer a economia". Em resumo, o verdadeiro medo dos republicanos não reside nos prejuízos que as ações do Fed possam causar. Pelo contrário, esses políticos temem que elas sejam bem-sucedidas.

Está formado o eixo da depressão. Não há dúvida de que alguns dos críticos de Bernanke são motivados por sinceras convicções intelectuais, mas a principal ex­­plicação para os ataques ao Fed é que eles vêm, pura e simplesmente, de interesses específicos. A China e a Alemanha querem que os EUA continuem pouco competitivos; os republicanos querem que a economia continue fraca enquanto um democrata estiver na Casa Branca. Se Ben Bernanke ceder a essas pressões, eles terão seus desejos recompensados.

Tradução: João Paulo Pimentel

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