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Érico sempre foi muito benquisto por todos os seus colegas de trabalho, pelo alto astral com que sempre conduziu a própria vida. Sempre otimista, o engenheiro preferia ver as coisas pelo lado bom (tudo tem um lado bom), do que pensar no pior. Como ele mesmo dizia, "melhor se contentar com a metade cheia do copo".

Com sua personalidade animada e de bem com a vida, conquistava amigos e admiradores por onde passava, já que sempre tinha uma palavra de conforto para dar aos colegas. E foi assim durante toda a sua vida, até que, há pouco mais de um ano, ingressou numa igreja (que eu não vou citar qual por questões óbvias) que praticamente fez uma lavagem cerebral no moço.

Antes de continuar sua história, preciso dizer que não pretendo discutir aqui a religiosidade e crenças de ninguém, apenas relato o que ocorreu com Érico com a intenção de ajudar a evitar que o mesmo ocorra com outras pessoas.

Em questão de meses frequentando a nova igreja, Érico não conseguia mais levar adiante uma conversa sem nela citar passagens da Bíblia. Não que isso seja um problema, o grande equívoco era, porém, a pregação exagerada da palavra de Deus em momentos que isso, definitivamente, não era devido.

O assunto do moço se tornou a sua nova religiosidade. No começo as pessoas o escutavam, afinal seu carisma era algo realmente excepcional. Após um tempo, porém, até os amigos mais próximos começaram a se afastar, tamanha mesmice se tornou o rapaz. Suas relações pessoais ainda mantiveram certa proximidade, porém, as profissionais foram drasticamente prejudicadas por isso.

Primeiro, foram os colegas de trabalham que começaram a evitar seu convívio. No cafezinho, era nítido o afastamento de todos quando o moço estava presente. As conversas, antes calorosas, não passavam agora de meros "oi’s" que as pessoas lhe dirigiam, já de costas, preparando-se para ir a qualquer lugar bem longe do rapaz. Com o tempo, os fornecedores começaram a evitá-lo, preferindo sempre que um funcionário seu, ou qualquer outra pessoa, lhes atendesse. Tudo isso, só para não ter que ouvir as pregações de Érico.

Quanto aos clientes, não preciso nem comentar o estrago. Quando ele precisava ficar em contato direto com algum comprador (a sorte é que, pela sua função, isso era raro), colocava-se a citar passagens bíblicas. Os clientes, por sua vez, irritavam-se com o assunto e, ou pediam para ser atendido por outra pessoa, ou, simplesmente, desistiam do negócio.

Foi numa reunião de trabalho, porém, que o que considerei a gota d’água aconteceu. Era o encontro semestral da empresa, onde todos os colaboradores se reuniam para tomar conhecimento dos resultados comerciais e discutir as estratégias para encarar os próximos seis meses de forma mais assertiva. Como de praxe, o gestor de cada equipe fazia uma breve apresentação de sua área, para que todos pudessem ficar a par do que acontecia na empresa como um todo.

Ao chegar a sua vez, e após terminar sua apresentação, Érico pediu que todos se levantassem e juntos fizessem uma oração. Na hora, todos se entreolharam, sem entender muito bem o que acontecia e o porquê daquele pedido. Sem maiores reclamações, porém, colocaram-se todos a rezar, sem ao menos saber por que ou por quem rezavam. Ao finalizar a pregação, Érico fez um convite a todos para que, quando possível, visitassem sua Igreja, passando, inclusive, o endereço no final da apresentação, para que todos pudessem tomar nota.

Seu chefe o chamou para uma conversa assim que a reunião acabou e explicou que aquilo jamais poderia se repetir. A religiosidade dele seria respeitada, desde que isso não interferisse no andamento da empresa, e, principalmente, nos resultados de sua área. Érico, porém, não entendeu o que seu chefe queria dizer com aquilo, sentindo-se extremamente ofendido com seu pedido. Mas, acatou a solicitação, já que sabia que seu emprego ficaria em risco, caso não o obedecesse.

Concordo que precisamos ter uma ligação com algo ou alguém superior a nós. Mas, religião é um assunto indiscutível. Portanto, deixemos para colocar em prática nossa fé em casa, na igreja, na comunidade e, principalmente, com a gente mesmo. Quando o assunto for negócios, tratemos de negócios.

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