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Recentemente escrevi em minha coluna sobre a baixa autoestima e recebi um e-mail de um leitor pedindo que abordasse o oposto disso, o excesso de autoconfiança. Ao ler o e-mail dele, acabei me lembrando de uma história que aconteceu com um diretor de uma importante rede supermercadista que passou por maus bocados ao participar de um processo seletivo. Rafael era, de fato, muito bom no que fazia. Seu currículo circulava frequentemente nas mãos dos consultores de minha empresa e, impressionantemente, parecia que ele era sempre bom o bastante, mas seu salário sempre acabava superando o que tínhamos para oferecer. Até que um dia surgiu uma vaga que parecia cair como uma luva para o diretor.

Durante todo o processo, Rafael se portava de maneira imponente, fazendo com que o admirássemos mais ainda. Era uma pessoa culta e possuía conteúdo para dar e vender, não importava qual tema resolvêssemos abordar. Tecnica­mente, conversar com ele significava receber verdadeiras aulas do segmento de varejo, o que nos fazia crer que ele era a melhor opção para o nosso cliente. Mas, como todos os processos que desenvolvemos, tínhamos outros candidatos para oferecer tão bons quanto o executivo. Nas várias etapas que envolvem o procedimento, porém, Rafael era tão seguro em sua postura, que não tínhamos dúvida que no face to face com o cliente, ele encantaria tanto quanto nos arrebatava.

Foi um processo longo, até mesmo porque se tratava de uma vaga para presidente. Quando apresentamos os perfis dos candidatos que selecionamos ao nosso cliente, falamos com o máximo de isenção possível sobre cada um. Mas, como já esperávamos, nosso cliente, sem nem mesmo conhecer Rafael, disse preferir aquele perfil e expôs optar fechar sem mesmo conhecê-lo. Era realmente impressionante! O executivo tinha uma presença (mesmo quando ausente) tão grande, que suas habilidades, competências e segurança eram notadas até por quem não o conhecia. Bastava avaliar sua trajetória na empresa que dirigia atualmente para saber que por trás de tanto sucesso, havia um grande homem de negócios.

Porém, por praxe, insistimos com o cliente para que conhecesse pessoalmente todos os candidatos. Afinal de contas, colocar um presidente numa empresa não é algo tão simples assim. E se não ocorresse empatia entre eles?! Dito e feito. Marcamos para um único dia três reuniões em horários e locais distintos, para que o cliente pudesse conhecer os candidatos, sem que um tivesse ciência sobre o outro. Avisamos com antecedência hábil para que todos eles pudessem se programar da melhor maneira.

Por sorte (ou azar, até hoje não sei), deixamos Rafael por último, por uma questão de logística mesmo. Com os dois primeiros candidatos correu tudo às mil maravilhas. Nosso cliente chegou a concordar com a importância daqueles encontros. Os candidatos eram tão bons, que seria injustiça decidir tão importante ação sem conhecê-los previamente. Minutos antes da reunião com Rafael, o solicitante chegou a nos dizer que estava tão satisfeito com os resultados que, se não soubesse que o último candidato era tão bom, já resolveria entre aqueles dois mesmo. Mas, a expectativa em conhecer aquele que causara tanto frisson durante o processo era maior que qualquer outra coisa.

Quando o relógio bateu às 16 horas, horário combinado com o executivo, já estávamos na sala de um hotel, aguardando sua chegada. Às 16h30, nada de Rafael chegar. Resolvemos ligar em seu celular para ver se algo havia acontecido e ele simplesmente não atendeu. Às 17h00 decidimos, enfim, despedirmo-nos e darmos por encerrado o processo. O cliente jamais admitiria tamanho descaso de um presidente. O pior de tudo é que não sabíamos nem como argumentar a favor de Rafael, pois desconhecíamos o motivo pelo qual ele havia nos dado aquele "bolo".

No dia seguinte, quando menos esperávamos e organizávamos toda a papelada para fechar a vaga com um dos outros dois candidatos, recebemos o telefonema do diretor. Pediu mil desculpas por não ter comparecido no dia anterior, mas se justificou dizendo ter ocorrido um imprevisto pelo qual não tinha controle. Pediu que remarcássemos o encontro com o cliente e, quando explicamos que isso não seria possível, desatou a falar desaforos do tipo "como vocês não marcarão uma reunião para mim? onde irão achar outro profissional com qualificações semelhantes às minhas?".

A questão que mais me indignou foi o fato de ele se achar tão bom que não precisava se desculpar. Achava que qualquer falha sua pudesse ser perdoável, pois, na verdade, ele não a encarava como falha. Ninguém é tão bom o suficiente para fazer o que ele fez. Sua atitude denotou irresponsabilidade, imaturidade e, principalmente, desrespeito com a consultoria que mediava um melhor posicionamento em sua carreira e com a empresa que o receberia de braços abertos.

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