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No início deste mês, um júri de Nova Jersey condenou Dharun Ravi por invasão de privacidade, por um bom motivo. Ravi ativava a webcam no quarto na Universidade Rutgers para que pudesse ver o colega de quarto, Tyler Clementi, se encontrar com um namorado. Para piorar, ele transmitiu os planos para repetir a dose pelo Twitter, convidando os amigos para assistir. Esse tipo de espionagem deveria ser proibido num campus universitário.

O aspecto confuso no caso de Ravi é a punição severa que ele agora enfrenta: até dez anos de prisão, para um rapaz de 20 anos que nunca teve problemas legais antes.

Ravi pode ficar preso durante anos porque, além da espionagem, foi condenado por um crime de ódio: intimidação preconceituosa, condenação provavelmente influenciada pelo subsequente suicídio de Clementi. De acordo com a lei dos direitos civis de Nova Jersey, o acusado está sujeito a uma pena maior se o júri considerar que cometeu um entre uma ampla gama de crimes subjacentes com o propósito de atingir alguém em função da raça, etnia, religião, deficiência física, gênero ou orientação sexual.

A ideia de proteger grupos vulneráveis é bem-intencionada. Contudo, com o país em alerta máximo contra o "bullying" – principalmente quando se mistura com informática e internet –, os estatutos dos direitos civis estão sendo alongados para culpar adolescentes que agiram de forma vil, mas não violenta. As leis dos direitos civis não deveriam servir para isso.

Nova Jersey aprovou um dos primeiros estatutos contra os crimes de ódio dos EUA em 1981, criminalizando a queima de cruzes ou a colocação de suásticas para aterrorizar e ameaçar violência. Em 1990, o legislativo acrescentou prisão adicional por preconceito racial, étnico ou religioso. "De agora em diante, os crimes de ódio serão crimes sérios", disse o governador Jim Florio ao assinar a lei, citando um "telefonema no meio da noite ou vandalismo que deixa símbolos odiosos em sua esteira ou ofensas raciais".

Adolescentes já foram acusados de intimidação preconceituosa. Um rapaz foi condenado por ser o líder de um bando de moleques que cercou uma garota, chamando-a de lésbica. Outro adolescente se encrencou por empurrar um garoto, usar uma ofensa racial e ameaçar enforcá-lo numa árvore. Por serem jovens, os garotos citados não receberam punições severas. O rapaz que deu o empurrão foi condenado a passar dez dias no reformatório e ler o livro "Black Like Me" (negro como eu, inédito no Brasil).

Ravi tinha 18 anos quando espionou Clementi, sendo legalmente um adulto, mas ele fez coisas que lembram homofobia imatura. Ele disse a um amigo que queria "manter os gays a distância" e quando preparou a câmera pela segunda vez, os "tuítes" e SMS mostravam que estava explorando irrefletidamente a homossexualidade de Clementi para chamar atenção.

Clementi foi intimidado pela espionagem de Ravi? O registro é confuso, mas afetado pelo suicídio de Clementi no dia seguinte ao segundo ato de espionagem. Embora não esteja claro o quanto as ações de Ravi influenciaram a decisão do colega de quarto de tirar a própria vida, a proximidade no tempo causa arrepios.

Como as leis de direitos civis são escritas em termos amplos, não causa surpresa que os promotores tenham recorrido a elas para reforçar as acusações contra Ravi, principalmente porque isso normalmente aumenta a pressão para o réu admitir a culpa. A seguir, o Estado fez uma oferta justa a Ravi: serviço comunitário em troca de reconhecer que invadiu a privacidade de Clementi. Foi um erro de Ravi não aceitar.

Ainda assim, se Ravi passar anos preso, seu caso abrirá um precedente alarmante de punição desproporcional. A espionagem que ele fez foi criminosa, mas, também, nas palavras de seu advogado, o comportamento é obra de um "moleque estúpido".

Ravi não é a única pessoa pega nessa cilada jurídica. Depois que a intimidação foi considerada culpada pelo suicídio, dois anos atrás, de Phoebe Prince, 15 anos, de South Hadley, Massachusetts, os promotores acusaram criminalmente seis adolescentes. Daquela feita, o promotor público usou a lei estadual de direitos civis para culpar diretamente cinco deles pela morte de Phoebe. A exemplo de Ravi, eles enfrentaram uma sentença de até dez anos.Os casos de Massachusetts terminaram com lamentos. Depois que o promotor público que usou os direitos civis deixou o posto, sua sucessora retirou as acusações contra um adolescente e, sensatamente, solucionou os processos contra os outros cinco, que admitiram transgressões, recorrendo à liberdade condicional e ao serviço comunitário.

Ravi, é claro, não terá tanta sorte. Estados como Nova Jersey e Massachusetts deveriam limitar as leis de direitos civis para que ele não seja o primeiro de muitos jovens estúpidos, mas não violentos, a pagar um preço pesado demais por causa de nosso medo de como a garotada usa a tecnologia para ser cruel.

Emily Bazelon, editora sênior da Slate, está escrevendo um livro sobre "bullying" chamado "Sticks and Stones".

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