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“Essas empresas têm usado os programas de parcelamento para rolar a dívida com o governo, sem resolver as pendências.”
Carlos Roberto Occaso, subsecretário de Arrecadação e Atendimento da Receita | Valter Campanato/ Agência Brasil
“Essas empresas têm usado os programas de parcelamento para rolar a dívida com o governo, sem resolver as pendências.” Carlos Roberto Occaso, subsecretário de Arrecadação e Atendimento da Receita| Foto: Valter Campanato/ Agência Brasil

Critério mais rigoroso para Refis é difícil, diz advogada

Ao mesmo tempo em que acusou a maior parte das empresas devedoras de usarem o Refis apenas para rolar dívidas, o subsecretário de Arrecadação e Atendi­­mento da Receita, Carlos Roberto Occaso, disse à Agência Brasil que o órgão está estudando uma forma mais criteriosa de permitir a adesão ao parcelamento ordinário das dívidas, de até 60 meses, e até aos futuros programas de recuperação.

Escolher esse critério, no en­­tanto, parece não ser tarefa fácil. "Os parcelamentos es­­peciais só podem ser concedidos por lei, por serem conside­­rados uma forma de renúncia de receita, mas esta lei não pode criar critérios que possam beneficiar alguns contri­buintes em detri­­mento de outros", observa a doutora em Di­­reito Tributário Betina Treiger Gru­­penmacher. Para ela, encon­­trar um elemento de discriminação incontestável judicialmente será bem difícil – ainda mais um que impeça a participação de determinadas empresas ou contribuintes nos Refis.

Consultoria recomenda checar cálculo da Receita

A Pactum Consultoria Empresarial, com escritórios em cinco estados, alerta as empresas que aderiram ao "Refis da Crise" para terem atenção redobrada com os valores consolidados, pois a Receita Federal teria errado na consolidação de alguns cálculos, incluindo valores em duplicidade, débitos prescritos, encargos legais e correções monetárias cobradas a mais.

"É recomendável realizar a revisão dos débitos incluídos no parcelamento, assim como dos encargos legais, apurando possíveis valores cobrados indevidamente ou reduções não aplicadas, que podem diminuir significativamente o valor do débito consolidado e, consequentemente, o valor das parcelas pagas mensalmente", afirma o consultor tributário da Pactum em Santa Catarina Jorge Amaral.

Por lá, o escritório pediu a revisão de 30% dos clientes. Por aqui, de acordo com o diretor da empresa no Paraná, Gilson Faust, cerca de 20% das empresas estão pedindo o recálculo por terem encontrado inconsistências na consolidação da dívida. "Não há prazo para pedir a revisão, mas é importante checar o cálculo o quanto antes para não pagar nada a mais", frisa Amaral.

Quase dois anos após a adesão de quase 580 mil contribuintes ao Programa de Recuperação Fiscal de 2009, o chamado "Refis da Crise", a Receita Federal conseguiu consolidar as dívidas (recalculá-las de acordo com os critérios do programa). Resultado: só 36,75% das pessoas que manifestaram a intenção de honrar suas dívidas lá no início quitaram seu débito à vista ou se comprometeram a fazê-lo em parcelas até agora. Do mais de R$ 1 trilhão devido por empresas, 17,3% foram pagos ou vão ser. O mesmo comportamento ocorreu nas edições anteriores do Refis, que não recuperaram nem 5% do devido. Em 2000, 129 mil empresas negociaram o pagamento de R$ 94,5 bilhões, mas só 2,89% do montante foi quitado e 12,6% continua sendo pago. Mesmo entre as pessoas físicas, a desistência é grande. No Programa Excepcional (Paex), de 2006, só 1,3% das dívidas foram quitadas e 6,7% continuam sendo pagas.

Embora pareça baixa, a efetivi dade dos programas de recuperação fiscal é vista pelo poder público como boa, já que antecipa pagamentos que demorariam anos na Justiça. Até agosto deste ano, o "Refis da Crise" rendeu R$ 14,3 bilhões – montante próximo ao Im­­posto de Renda Pessoa Física de 2010.

Má-fé

Na semana passada, quando o balanço do "Refis da Crise" veio à tona, o subsecretário de Arrecada­­ção e Atendimento da Receita, Carlos Roberto Occaso, afirmou à Agência Brasil que mais de 60% das empresas endividadas usaram o programa para obter a Certidão Negativa de Débitos (CND) e mais da metade das empresas do "Refis da Crise" eram reincidentes de programas semelhantes desde 2000. "Essas empresas têm usado os programas de parcelamento para rolar a dívida com o governo, sem resolver as pendências", acusou.

Entre contadores e juristas, no entanto, a declaração é vista como leviana, até porque a Receita Federal acabou permitindo essa situação ao demorar tanto para fazer os cálculos. "Essa afirmação [da Receita] não me parece válida, quer porque é impossível investigar a vontade dos contribuintes, quer porque muitos não consolidaram os seus débitos, especialmente em relação ao ‘Refis da Crise’, porque o sistema operacional demorou dois anos para ficar pronto e neste intervalo de tempo as suas condições individuais econômicas ou de outra ordem se alteraram", explica a doutora em Direito Tributário Betina Treiger Grupenmacher.

Antes da consolidação das dívidas, entre abril e agosto deste ano, as empresas pagavam apenas R$ 100 fixos. Juliana Chagas, da MV Contabilidade, em Curitiba, conta que auxiliou cerca de 60 empresas, no fim de 2009, a aderirem ao Refis. "Algumas viram as parcelas passarem para até R$ 10 mil, restando 160 meses de prazo, e desistiram", descreve. Boa parte das empresas acreditava que o prazo de 180 meses valeria só após a consolidação.

Para Betina, embora as empresas não tivessem conhecimento do valor exato, é improvável que não tivessem qualquer pista. Ainda assim, ela e outros contadores consultados veem dois anos como um prazo relevante para mudanças nas condições de uma empresa. "Alguns clientes do setor madei­­reiro sofreram com a queda nas exportações e alguns comerciantes não conseguiram competir com os importados chineses", exemplifica a vice-presidente do Conselho Regional de Contabi­­lidade, Lucélia Lecheta.

Em Curitiba, Refic garante R$ 2,5 milhões mensais

As inscrições para o Programa de Recuperação Fiscal de Curitiba (Refic) de 2011, voltado à regularização de débitos de pessoas físicas e jurídicas com o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) e o Imposto sobre Serviços (ISS) – inscritas ou não em dívida ativa –, vão até o fim deste mês. Até agora, já foram firmados 8.317 acordos, um montante de mais de R$ 90 milhões.

Segundo o consultor da Se­­cretaria Municipal de Finanças Aristides Eduardo da Veiga, esse montante representará uma receita de R$ 2,5 milhões mensais para a prefeitura, ao menos nos próximos 12 meses. "Quando enxergamos o Refic como uma oportunidade de anteciparmos um pagamento que poderia levar anos na Justiça ou poderia nem acontecer, caso a empresa falisse e não sobrasse nada após a quitação dos encargos trabalhistas, ele é bastante positivo. Ainda mais lembrando que o município não concede perdão de multas e/ou juros como a Receita Federal", analisa. Cerca de metade dos contribuintes optou por fazê-lo no menor prazo (12 meses) com taxa zero de juros. A partir daí, os juros são escalonados, chegando a 1,2% nos parcelamentos de 120 meses, e já não valem tanto a pena.

No Refic anterior, de 2008, 17.592 contribuintes acertaram o pagamento de R$ 116,7 mi­­lhões em dívidas de ISS e IPTU. A prefeitura, no entanto, diz que não tem como calcular quanto esse valor representava do total devido em 2008 porque parte das dívidas está na Justiça. O montante equivale, no entanto, a 45,3% da média anual arrecadada em IPTU por Curitiba nos últimos sete anos.

Em junho, quando o Refic 2011 foi aprovado, os vereadores da oposição pediram um balanço dos programas anteriores. A reportagem tentou falar com Algaci Túlio (PMDB), líder da oposição, para saber se o balanço foi entregue, mas ele não atendeu o celular.

Simples prevê parcelamento

O Projeto de Lei Complementar 77/2011, aprovado no último dia 5 no Senado e sancionado pela presidente Dilma Rousseff, não só prevê o aumento do teto do faturamento do Simples Nacional de R$ 240 mil para R$ 360 mil por ano, mas também permite que as empresas que se enquadrarem no regime possam parcelar seus débitos com tributos em até 60 meses. "Como o Simples Nacional já é visto como um benefício, as empresas não teriam direito a contar com mais uma vantagem, como o parcelamento de suas dívidas. Quase 60% das empresas com que trabalho estão no Simples e estão esperando ansiosamente por essa nova lei", diz a vice-presidente do Conselho Regional de Contabilidade do Paraná, Lucélia Lecheta.

Havia cerca de 560 mil empresas do Simples Nacional com débitos referentes a 2007 e 2008. A Lei 10.522/2002, que permite o parcelamento de débitos de qualquer natureza com a Fazenda Nacional em até 60 vezes; e a Lei 11.941/2009, que instituiu o "Refis da Crise", não trazem qualquer objeção à participação delas, ainda assim o entendimento da Receita foi o de barrar o parcelamento a essas empresas. Recentemente, a 22.ª Vara Federal de São Paulo garantiu a uma empresa optante pelo Simples, por liminar, o direito de incluir seus débitos nos parcelamentos instituídos pelas Leis 11.941/2009 e 10.522/2002, para evitar sua exclusão do regime diferenciado.

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