Critério mais rigoroso para Refis é difícil, diz advogada
Ao mesmo tempo em que acusou a maior parte das empresas devedoras de usarem o Refis apenas para rolar dívidas, o subsecretário de Arrecadação e Atendimento da Receita, Carlos Roberto Occaso, disse à Agência Brasil que o órgão está estudando uma forma mais criteriosa de permitir a adesão ao parcelamento ordinário das dívidas, de até 60 meses, e até aos futuros programas de recuperação.
Escolher esse critério, no entanto, parece não ser tarefa fácil. "Os parcelamentos especiais só podem ser concedidos por lei, por serem considerados uma forma de renúncia de receita, mas esta lei não pode criar critérios que possam beneficiar alguns contribuintes em detrimento de outros", observa a doutora em Direito Tributário Betina Treiger Grupenmacher. Para ela, encontrar um elemento de discriminação incontestável judicialmente será bem difícil ainda mais um que impeça a participação de determinadas empresas ou contribuintes nos Refis.
Consultoria recomenda checar cálculo da Receita
A Pactum Consultoria Empresarial, com escritórios em cinco estados, alerta as empresas que aderiram ao "Refis da Crise" para terem atenção redobrada com os valores consolidados, pois a Receita Federal teria errado na consolidação de alguns cálculos, incluindo valores em duplicidade, débitos prescritos, encargos legais e correções monetárias cobradas a mais.
"É recomendável realizar a revisão dos débitos incluídos no parcelamento, assim como dos encargos legais, apurando possíveis valores cobrados indevidamente ou reduções não aplicadas, que podem diminuir significativamente o valor do débito consolidado e, consequentemente, o valor das parcelas pagas mensalmente", afirma o consultor tributário da Pactum em Santa Catarina Jorge Amaral.
Por lá, o escritório pediu a revisão de 30% dos clientes. Por aqui, de acordo com o diretor da empresa no Paraná, Gilson Faust, cerca de 20% das empresas estão pedindo o recálculo por terem encontrado inconsistências na consolidação da dívida. "Não há prazo para pedir a revisão, mas é importante checar o cálculo o quanto antes para não pagar nada a mais", frisa Amaral.
Quase dois anos após a adesão de quase 580 mil contribuintes ao Programa de Recuperação Fiscal de 2009, o chamado "Refis da Crise", a Receita Federal conseguiu consolidar as dívidas (recalculá-las de acordo com os critérios do programa). Resultado: só 36,75% das pessoas que manifestaram a intenção de honrar suas dívidas lá no início quitaram seu débito à vista ou se comprometeram a fazê-lo em parcelas até agora. Do mais de R$ 1 trilhão devido por empresas, 17,3% foram pagos ou vão ser. O mesmo comportamento ocorreu nas edições anteriores do Refis, que não recuperaram nem 5% do devido. Em 2000, 129 mil empresas negociaram o pagamento de R$ 94,5 bilhões, mas só 2,89% do montante foi quitado e 12,6% continua sendo pago. Mesmo entre as pessoas físicas, a desistência é grande. No Programa Excepcional (Paex), de 2006, só 1,3% das dívidas foram quitadas e 6,7% continuam sendo pagas.
Embora pareça baixa, a efetivi dade dos programas de recuperação fiscal é vista pelo poder público como boa, já que antecipa pagamentos que demorariam anos na Justiça. Até agosto deste ano, o "Refis da Crise" rendeu R$ 14,3 bilhões montante próximo ao Imposto de Renda Pessoa Física de 2010.
Má-fé
Na semana passada, quando o balanço do "Refis da Crise" veio à tona, o subsecretário de Arrecadação e Atendimento da Receita, Carlos Roberto Occaso, afirmou à Agência Brasil que mais de 60% das empresas endividadas usaram o programa para obter a Certidão Negativa de Débitos (CND) e mais da metade das empresas do "Refis da Crise" eram reincidentes de programas semelhantes desde 2000. "Essas empresas têm usado os programas de parcelamento para rolar a dívida com o governo, sem resolver as pendências", acusou.
Entre contadores e juristas, no entanto, a declaração é vista como leviana, até porque a Receita Federal acabou permitindo essa situação ao demorar tanto para fazer os cálculos. "Essa afirmação [da Receita] não me parece válida, quer porque é impossível investigar a vontade dos contribuintes, quer porque muitos não consolidaram os seus débitos, especialmente em relação ao Refis da Crise, porque o sistema operacional demorou dois anos para ficar pronto e neste intervalo de tempo as suas condições individuais econômicas ou de outra ordem se alteraram", explica a doutora em Direito Tributário Betina Treiger Grupenmacher.
Antes da consolidação das dívidas, entre abril e agosto deste ano, as empresas pagavam apenas R$ 100 fixos. Juliana Chagas, da MV Contabilidade, em Curitiba, conta que auxiliou cerca de 60 empresas, no fim de 2009, a aderirem ao Refis. "Algumas viram as parcelas passarem para até R$ 10 mil, restando 160 meses de prazo, e desistiram", descreve. Boa parte das empresas acreditava que o prazo de 180 meses valeria só após a consolidação.
Para Betina, embora as empresas não tivessem conhecimento do valor exato, é improvável que não tivessem qualquer pista. Ainda assim, ela e outros contadores consultados veem dois anos como um prazo relevante para mudanças nas condições de uma empresa. "Alguns clientes do setor madeireiro sofreram com a queda nas exportações e alguns comerciantes não conseguiram competir com os importados chineses", exemplifica a vice-presidente do Conselho Regional de Contabilidade, Lucélia Lecheta.
Em Curitiba, Refic garante R$ 2,5 milhões mensais
As inscrições para o Programa de Recuperação Fiscal de Curitiba (Refic) de 2011, voltado à regularização de débitos de pessoas físicas e jurídicas com o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) e o Imposto sobre Serviços (ISS) inscritas ou não em dívida ativa , vão até o fim deste mês. Até agora, já foram firmados 8.317 acordos, um montante de mais de R$ 90 milhões.
Segundo o consultor da Secretaria Municipal de Finanças Aristides Eduardo da Veiga, esse montante representará uma receita de R$ 2,5 milhões mensais para a prefeitura, ao menos nos próximos 12 meses. "Quando enxergamos o Refic como uma oportunidade de anteciparmos um pagamento que poderia levar anos na Justiça ou poderia nem acontecer, caso a empresa falisse e não sobrasse nada após a quitação dos encargos trabalhistas, ele é bastante positivo. Ainda mais lembrando que o município não concede perdão de multas e/ou juros como a Receita Federal", analisa. Cerca de metade dos contribuintes optou por fazê-lo no menor prazo (12 meses) com taxa zero de juros. A partir daí, os juros são escalonados, chegando a 1,2% nos parcelamentos de 120 meses, e já não valem tanto a pena.
No Refic anterior, de 2008, 17.592 contribuintes acertaram o pagamento de R$ 116,7 milhões em dívidas de ISS e IPTU. A prefeitura, no entanto, diz que não tem como calcular quanto esse valor representava do total devido em 2008 porque parte das dívidas está na Justiça. O montante equivale, no entanto, a 45,3% da média anual arrecadada em IPTU por Curitiba nos últimos sete anos.
Em junho, quando o Refic 2011 foi aprovado, os vereadores da oposição pediram um balanço dos programas anteriores. A reportagem tentou falar com Algaci Túlio (PMDB), líder da oposição, para saber se o balanço foi entregue, mas ele não atendeu o celular.
Simples prevê parcelamento
O Projeto de Lei Complementar 77/2011, aprovado no último dia 5 no Senado e sancionado pela presidente Dilma Rousseff, não só prevê o aumento do teto do faturamento do Simples Nacional de R$ 240 mil para R$ 360 mil por ano, mas também permite que as empresas que se enquadrarem no regime possam parcelar seus débitos com tributos em até 60 meses. "Como o Simples Nacional já é visto como um benefício, as empresas não teriam direito a contar com mais uma vantagem, como o parcelamento de suas dívidas. Quase 60% das empresas com que trabalho estão no Simples e estão esperando ansiosamente por essa nova lei", diz a vice-presidente do Conselho Regional de Contabilidade do Paraná, Lucélia Lecheta.
Havia cerca de 560 mil empresas do Simples Nacional com débitos referentes a 2007 e 2008. A Lei 10.522/2002, que permite o parcelamento de débitos de qualquer natureza com a Fazenda Nacional em até 60 vezes; e a Lei 11.941/2009, que instituiu o "Refis da Crise", não trazem qualquer objeção à participação delas, ainda assim o entendimento da Receita foi o de barrar o parcelamento a essas empresas. Recentemente, a 22.ª Vara Federal de São Paulo garantiu a uma empresa optante pelo Simples, por liminar, o direito de incluir seus débitos nos parcelamentos instituídos pelas Leis 11.941/2009 e 10.522/2002, para evitar sua exclusão do regime diferenciado.
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