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Maioria dos “prosumidores” gera energia solar. | Diogo Moro Cunha/Arquivo pessoal
Maioria dos “prosumidores” gera energia solar.| Foto: Diogo Moro Cunha/Arquivo pessoal

De cliente a “prosumidor”. Em quatro anos, mais de cinco mil consumidores brasileiros cruzaram essa fronteira e passaram a produzir a própria energia por meio de micro e minissistemas de geração instalados em casa. A energia solar é a líder absoluta desta revolução que acontece longe dos olhos da maioria, nos telhados de residências e empresas país afora.

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Sem subsídios, mas com muito potencial, a geração distribuída avança a passos largos no Brasil apesar da crise econômica. Em 2012, o número de sistemas domésticos instalados em todo o Brasil era contado nos dedos de uma mão. Em setembro deste ano já eram 5.040 sistemas conectados à rede elétrica do país, sendo 4.955 deles de energia solar que somam 35,9 mil kW de potência instalada. Até 2024, 1,2 milhão de unidades consumidoras no país vão gerar a própria energia, segundo projeção da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

O Paraná tem 459 sistemas conectados à rede de energia elétrica, o que o coloca em quinto lugar entre os estados com maior número de conexões, atrás de Minas Gerais (1.226), São Paulo (711), Rio Grande do Sul (564) e Rio de Janeiro (543).

Mais da metade do total de sistemas instalados no Paraná começou a gerar energia em 2016, segundo a Copel, que é a segunda distribuidora do país em número de conexões.

Pelo lado do custo, o barateamento dos sistemas fotovoltaicos é fundamental para que cada vez mais pessoas gerem a própria energia. “O preço da tecnologia caiu mais de 60% nos últimos quatro anos. Um sistema que custava R$ 35 mil em 2012, hoje está na faixa de R$ 17 mil. Só não caiu mais porque o dólar disparou e boa parte dos componentes vem de fora”, afirma Hewerton Martins, diretor-presidente da Solar Energy do Brasil. Nesse intervalo, o payback (tempo de retorno do investimento) caiu pela metade, de 14 para cerca de sete anos – os sistemas têm, em média, vida útil de 25 anos.

Impulso

A geração de energia pelos próprios consumidores tornou-se possível a partir da Resolução 482 da Aneel, de 2012, e ganhou novo fôlego com a Resolução 687, que entrou em vigor em 1º de março deste ano e ampliou as possibilidades para micro e minigeração distribuída no país ao permitir novos modelos de geração de energia e compensação que beneficiam um público que, até então, estava fora desse setor. Quem mora em um prédio, por exemplo, não podia gerar a própria energia e agora pode.

Veja detalhes da nova resolução da Aneel

“O Brasil tem um dos melhores modelos regulatórios do mundo para geração distribuída de energia. Passada essa fase natural de entendimento e adaptação às regras, devemos ter um salto de crescimento da geração doméstica”, avalia Nelson Colaferro, sócio-diretor da Blue Sol Energia Solar.

O contexto é bastante positivo, mas parece haver um consenso no mercado de que o setor precisa superar duas barreiras principais para finalmente deslanchar no país: a barreira cultural, superando o desconhecimento dos consumidores em relação aos benefícios da energia solar e, especialmente, as dificuldades de financiamento. Neste ponto, segundo Colaferro, ainda há poucas linhas de crédito específicas e taxas de juros muito altas que desestimulam investimentos. “Precisamos de dinheiro no mercado para ganhar escala”, acrescenta Martins.

Outra briga que o setor comprou é em relação à isenção do ICMS para a geração de energia fotovoltaica. Seis estados ainda não fornecem isenção a quem produz a própria energia, entre eles o Paraná que, segundo a Absolar (Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica), tem o melhor potencial da região Sul para instalação de sistemas fotovoltaicos.

O projeto de lei que dá a isenção foi aprovado em primeira discussão na Assembleia Legislativa do estado, mas ainda depende de outras aprovações em plenário. “O Paraná está entre os estados com o maior número de conexões, mas pode ocupar uma posição ainda melhor se aderir à isenção do ICMS”, afirma Rodrigo Sauaia, presidente Absolar.

Novas possibilidades

Resolução Normativa 687 da Aneel entrou em vigor em 1º de março deste ano e flexibilizou a geração doméstica de energia

Autoconsumo remoto

A nova resolução permitiu que a geração de energia seja realizada distante do ponto de consumo. Na prática, isso permite que pessoas que não podem ter sistemas em casa, os chamados “sem telhado”, como é o caso de determinados prédios comerciais ou, então, de quem mora em edifícios, possam gerar sua energia remotamente, instalando sistemas em outros locais, inclusive, com melhor irradiação solar.

Geração compartilhada

Antes os donos dos sistemas fotovoltaicos só podiam compensar os créditos de energia excedente em locais com o mesmo CPF ou CNPJ. Agora, esses créditos podem ser transferidos para terceiros com CPF ou CNPJ diferentes, para compensação em outra unidades consumidoras. Para isso, contudo, é preciso comprovar que há vínculo entre as partes, o que pode ser feito por meio de consórcios ou cooperativas de pessoas físicas ou jurídicas.

Geração em condomínios

Também passou a ser permitida a instalação de sistemas de geração distribuída em condomínios, reconhecidos como empreendimentos de múltiplas unidades consumidoras. Desse modo, a energia gerada em um condomínio, por exemplo, pode ser distribuída entre os condôminos conforme regras e porcentuais acordados entre eles. A compensação, neste caso, é feita de forma independente.

Arquiteto de Curitiba tem miniusina solar em casa

Há cerca de dois anos, o arquiteto Diogo Moro Cunha entrou para o grupo dos “prosumidores”, como são chamados os consumidores que geram a própria energia. No telhado da sua casa, em um condomínio de Curitiba, 28 painéis solares geram, em média, 680 kWh mensalmente, mais do que o necessário para abastecer o consumo da residência. E o consumo de energia da família é alto, cerca de 500 kWh por mês. Mas há uma explicação: da cozinha ao chuveiro, passando pelo piso aquecido, nada na casa do arquiteto funciona a gás, o que aumenta a demanda por eletricidade.

Em média, ele produz 23,6 kWh por dia e gasta 15,9 kWh. O relógio bidirecional marca quanta energia ele manda para a rede e quanto recebe dela. A diferença é compensada na tarifa de energia nos meses em que a geração não foi suficiente para suprir o consumo, o que, em geral, costuma ocorrer no inverno, quando a insolação é menor. “No verão, a geração é maior do que o consumo, mas na metade do ano essa tendência se inverte. Mesmo assim, na média anual, o saldo é positivo”, explica o arquiteto.

Depois de uma temporada morando e trabalhando na Inglaterra, onde a energia solar em residências já está bastante popularizada, Diogo voltou ao Brasil, projetou uma casa toda sustentável e investiu R$ 68 mil no sistema com 28 placas. Na Europa, se o consumidor gerar mais que consome, o governo compra a energia. Aqui, o excedente não é vendido, mas compensado. O payback do investimento feito por Cunha é de 14 anos. “Se o Paraná tivesse isenção de ICMS para geração fotovoltaica, o tempo de retorno do investimento cairia para oito anos. Como microgerador de energia eu beneficio o sistema como um todo, mas sou penalizado por isso”, reclama.

Do telhado à Rede

De janeiro de 2015 a agosto deste ano, a quantidade de eletricidade gerada a partir de sistemas fotovoltaicos que foi injetada na rede elétrica da Companhia Paranaense de Energia (Copel) foi de 62 mil MWh, equivalente ao consumo mensal da cidade de Ponta Grossa, que possui 136 mil unidades consumidoras e 341 mil habitantes.

A vez dos pequenos

Nada de megaempreendimentos. A verdadeira transformação na matriz elétrica brasileira está ocorrendo pelas mãos dos pequenos geradores: 78% das conexões são residenciais e 16% comerciais. A indústria responde por apenas 2%. Embora o crescimento do número de sistemas não implique, na mesma proporção, em um ganho de escala em potência instalada, a energia gerada em casa contribui para aliviar a pressão sobre todo o sistema elétrico.

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