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Estados terão autonomia para definir alíquota própria do IBS, acima ou abaixo da referência, independentemente da trava criada pelo Congresso para impedir aumento de carga tributária
Estados terão autonomia para definir alíquota própria do IBS, acima ou abaixo da referência, independentemente da trava criada pelo Congresso para impedir aumento de carga tributária| Foto: Lia de Paula/Agência Senado

A neutralidade na carga de impostos que consta da emenda constitucional da reforma tributária poderá ficar apenas no papel. Conforme a proposta de regulamentação do novo sistema tributário, a alíquota de referência do futuro Imposto sobre Valor Agregado (IVA) dual, calculada para manter a arrecadação com a tributação sobre consumo, pode fazer jus ao nome, tornando-se meramente uma referência.

De acordo com o Projeto de Lei Complementar (PLP) 68/2024, entregue pelo governo ao Congresso na quarta-feira (24), estados, municípios e a União terão a prerrogativa de fixar a alíquota que quiserem por meio de lei, tornando inócua a trava criada pelo Congresso para impedir aumento de carga de impostos.

A emenda à Constituição aprovada pelo Congresso e promulgada no fim do ano passado estabelece que o sistema tributário sobre o consumo passará a ter um IVA dual, composto de dois tributos: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de responsabilidade da União, e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), cuja gestão será compartilhada por estados e municípios.

Durante a tramitação da proposta, para manter a neutralidade da reforma, ou seja, evitar o aumento de carga tributária total, o relator do texto no Senado, Eduardo Braga (MDB-AM), inseriu um dispositivo que obriga a redução das alíquotas da CBS em 2030 se as receitas com o tributo medidas em 2027 e 2028 na proporção do Produto Interno Bruto (PIB) forem maiores do que a média da arrecadação com PIS/Pasep, Cofins e IPI de 2012 a 2021.

Em 2035, haverá outro período de reavaliação, em que todos os tributos criados pela reforma poderão ser reduzidos se a receita medida entre 2029 e 2033 for maior que a média da arrecadação, entre 2012 e 2021, dos impostos extintos. Ambos os cálculos levarão em consideração o PIB.

Considerando a neutralidade da carga, o Ministério da Fazenda estima que a alíquota de referência do IVA ficará em torno de 26,5%, podendo oscilar entre 25,7% e 27,3%. Em relação à projeção média, a CBS seria fixada em 8,8%, e o IBS em 17,7%. A definição do porcentual ficará a cargo do Senado Federal e do comitê gestor do IBS, formado por representantes dos estados e dos municípios.

As alíquotas estimadas já fariam do sistema de IVA dual brasileiro um dos maiores do mundo entre os mais de 170 países que adotam o mesmo modelo de tributação. Segundo dados atualizados em outubro de 2022 pelo Bureau Internacional de Documentação Fiscal, a alíquota de IVA que mais ocorre internacionalmente é de 16%. O maior imposto, conforme o ranking, é o da Hungria, fixado em 27%.

Mas não bastasse isso, a trava não impedirá que os entes da Federação elevem a alíquota do IBS localmente a seu critério, dependendo apenas da aprovação do respectivo Poder Legislativo.

“A trava de carga vale para a alíquota de referência”, explicou nesta quinta-feira (25) o secretário especial para a reforma tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, em coletiva à imprensa. “Os estados, os municípios e a União podem fixar sua alíquota padrão em um valor diferente da alíquota de referência.”

Ele exemplificou com situações hipotéticas. “O Senado foi lá e fixou que a alíquota de referência da CBS é 8,8%. A União pode chegar e falar: ‘não, eu quero que minha alíquota seja a alíquota de referência menos 0,3 ponto porcentual’. Então vai ser 8,5%. Se for mais 0,3 ponto porcentual, vai ser 9,1%”, disse.

“Ou simplesmente a lei federal pode chegar e falar: ‘a minha alíquota da CBS é de 8,5%’, sem referência à alíquota padrão. A emenda constitucional deixou essas duas possibilidades.”

Segundo o inciso II do artigo 19 do PLP 68, “qualquer alteração na legislação federal que reduza ou eleve a arrecadação da CBS ou do IBS” deverá ser compensada com a elevação ou redução, pelo Senado, das alíquotas de referência da CBS e do IBS, de modo a preservar a arrecadação das esferas federativas. O texto não fala, no entanto, de leis estaduais ou municipais que alterem as alíquotas padrão de estados e municípios.

Já o artigo 20 do PLP 68 diz que “projetos de lei complementar em tramitação no Congresso Nacional que reduzam ou aumentem a arrecadação do IBS ou da CBS somente serão apreciados se estiverem acompanhados de estimativa de impacto nas alíquotas de referência do IBS e da CBS”.

O trecho, segundo Appy, faz referência, no entanto, a diferimentos ou isenções de alíquota ou regimes especiais de tributação. “Se no futuro o Congresso quiser aprovar uma lei falando: ‘olha, eu quero colocar mais um monte de produtos na cesta básica’, tudo bem, ele pode aprovar, isso faz parte da competência do Congresso Nacional. Só que como isso resulta em perda de arrecadação para os estados, os municípios e a União, vai ter que ter um ajuste na alíquota de referência de modo a manter a carga tributária”, disse.

“A carga é equilibrada na alíquota de referência”, reiterou Appy ao ser questionado durante a coletiva. “A alíquota de referência é adotada automaticamente para a União, no caso da CBS, para os estados e municípios, no caso do IBS. O default é manter a carga tributária. [...] Se o estado ou município, ou a União, quiserem arrecadar mais ou menos – é importante isso: ou menos –, eles podem na sua assembleia, ou na sua câmara de vereadores, aprovar uma lei dizendo que ele vai cobrar mais ou menos”, disse.

“Os estados já podem aumentar a alíquota do ICMS, e os municípios já podem aumentar a alíquota do ISS e podem reduzir. No fundo, a gente está mantendo a autonomia federativa.”

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