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| Foto: Rafael Neddermeyer/Fotos Públicas

O ciclo de corte de juros, iniciado no mês passado após quatro anos sem quedas na taxa básica, a Selic, abalará aos poucos o amor dos brasileiros pela renda fixa. Embora os juros continuem elevados, em 14% ao ano, os economistas mais otimistas já preveem que eles caiam para o patamar de apenas um dígito ao fim do ano que vem.

Diante dessa conjuntura, especialistas em investimentos recomendam que é chegada a hora de o poupador rever sua carteira, que vinha sendo recheada por títulos públicos vitaminados a juros e fundos de renda fixa. Uma das opções que os analistas aconselham avaliar são os fundos do tipo multimercados, os mais flexíveis do mercado brasileiro. Segundo eles, esses fundos são os mais bem posicionados para se beneficiarem do chamado “kit Brasil”, receituário otimista que combina aposta na diminuição gradual dos juros, na valorização da Bolsa e no enfraquecimento do dólar.

A estratégia já vem dando certo para os multimercados, que têm ampla liberdade para montar suas carteiras. De acordo com os especialistas, uma das apostas acertadas desses fundos foi comprar, ao longo do ano, títulos públicos prefixados (com juros determinados na hora da compra) e indexados à inflação (que pagam juros mais inflação). Os papéis adquiridos lá atrás vinham ganhando valor antes mesmo de a Selic ter caído, uma vez que os novos títulos estão sendo emitidos a taxas menores por causa da previsão de melhora econômica daqui pra frente.

“Os multimercados são muito diversos, mas, grosso modo, todos foram na direção de que o cenário para o Brasil tende a melhorar bastante. Alguns deles focaram mais em títulos prefixados, outros utilizaram mais tudo que está no “Kit Brasil”, como aplicação em Bolsa e aposta no fortalecimento do real”, explica Murilo Robotton, da área de multimercados da Santander Asset. “E a estratégia continua a mesma daqui para frente.”

No ano, a maior parte dos tipos de fundos nessa categoria já registra rentabilidade acima dos de renda fixa. De acordo com os números mais recentes da Anbima (associação das entidades financeiras), que vão até 28 de outubro, o tipo de fundo multimercado com maior volume de investimentos, o Livre, obteve rentabilidade acumulada de 12,42%. Enquanto isso, os fundos de renda fixa mais demandados, os de Duração Baixa Grau de Investimento, renderam 11,65% até agora em 2016.

Os fundos multimercados Long and Short Neutro — que costumam fazer operações com derivativos ligados ao mercado de renda variável, apostando na alta de alguns papéis e na queda de outros — estão rendendo 18,46% no ano. Nesse mesmo período, o Certificado de Depósito Interbancário (CDI), cuja taxa reflete quanto os bancos pagam para emprestar entre si e é a referência de rentabilidade a ser ulttrapassada no mercado, variou 11,46%.

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Pequeno investidor

Há fundos multimercados rendendo mais de 30% este ano. Na plataforma da corretora XP, entre os fundos com patrimônio líquido acima de R$ 20 milhões e mais de cem cotistas, o mais rentável é o XP Long Biased FICFI Mult, com rentabilidade de 84,4% em 2016, segundo Gustavo Pires, gerente de fundos da empresa. O Opportunity Midi Mult rendeu 31,6%, enquanto o JGP Equity FICFI Mult entregou 31,4%. Facilitou a vida dos gestores de multimercados o consenso de que a tendência, daqui para frente, é de melhora no cenário econômico.

Os multimercados só perdem o brilho se comparados aos fundos de ação, que têm categorias disparando mais de 60%, graças ao salto de 42% da Bolsa de Valores de São Paulo no ano.

“O clássico ‘kit Brasil’, com Bolsa subindo e dólar e juros caindo, esteve fora do radar nos últimos anos. É verdade que o bom gestor consegue ganhar em qualquer cenário, apostando na piora dos ativos, por exemplo, vendendo ações e comprando dólares. Mas, nesse cenário, há menos instrumentos disponíveis para explorar, do ponto de vista prático. O que está acontecendo agora é que o cenário atual joga a favor do gestor”, explica Pires.

José Tovar, diretor executivo da ARX Investimentos, está otimista com a possibilidade de um recuo ainda mais forte que o atualmente esperado.

“As perspectivas me parecem promissoras para um ciclo grande de corte grande. O Banco Central tem sido cauteloso, mas pode acelerar o ritmo, dependendo do avanço da agenda fiscal. O dólar mais fraco, por sua vez, tem ajudado a reduzir a inflação, o que também pode estimular o BC a intensificar o corte”, argumenta Tovar, um dos que acham possível que a Selic vá abaixo de 10% no fim de 2017.

Muito populares entre os investidores de alta renda, os multimercados também são acessíveis ao pequeno poupador. Um dos fundos da BB DTVM, por exemplo, o BB Multimercado LP Macro 200, tem investimento mínimo de R$ 200, destina-se ao aplicador conservador e já rendeu 15,1% no ano.

Mas Erick Scott Hood, gestor da Guide Investimentos, admite que é difícil para um pequeno investidor escolher um multimercado, dada sua enorme variedade. Ele esclareceu que uma das coisas mais importantes a se considerar é saber o risco que se está disposto a correr. Essas informações podem ser consultadas nas lâminas de cada fundo, no site da Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

“Um indicador importante disso também é a taxa de administração. Na maioria dos casos, quanto mais agressivo for o fundo, maior será a taxa. É necessário ver a relação entre essa taxa e o retorno que o fundo vem dando. Mas é, talvez, ainda mais importante levar em consideração a qualidade daquele gestor e de sua equipe. Como vem sendo o desempenho de outros fundos deles, por exemplo?”, recomenda Hood.

Riscos e ganhos

Embora os multimercados já estejam demonstrando resultado superior ao dos fundos de renda fixa, o investidor ainda não parece muito convencido. A captação deles no ano foi de R$ 10,5 bilhões, contra R$ 39,9 bilhões dos de renda fixa.

“O investidor, em geral, é avesso a risco e precisa de sinais mais claros de que está havendo, de fato, uma recuperação. Como a economia real ainda não deu esses sinais, o investidor pessoa física permanece um pouco retraído, perdendo o começo desse movimento dos multimercados. Além do mais, a Taxa Selic ainda está alta, então o retorno de um fundo DI continua confortável para ele”, ressalta Marcelo Pacheco, gerente executivo de fundos multimercado e offshore da BB DTVM. “Mas isso será uma questão de tempo. Aqueles aplicadores com perfil mais agressivo começarão a migrar seus recursos.”

De acordo com Pacheco, esse movimento já começou, recentemente, entre os clientes da BB DTVM. O gestor esclarece que, de fato, o ganho mais intenso vindo da melhora dos ativos brasileiros já ocorreu, elevando o risco de quem entrar agora. Ele também lembrou que fatores imponderáveis podem atrapalhar o desempenho daqui para frente. Um deles, em especial, é a eleição presidencial nos Estados Unidos, amanhã: os investidores se posicionaram à espera de uma vitória da democrata Hillary Clinton.

“Se houver uma surpresa em relação a esse resultado, isto é, uma vitória de Donald Trump, poderá haver uma ‘reprecificação’ global de ativos, impactando o retorno de todos os investimentos”, alerta. “Mas, olhando para frente, o Brasil ainda tem um trabalho longo a ser feito no terreno fiscal, os resultados das empresas ainda não refletiram a melhora econômica, e os juros apenas começaram a cair. Logo, há espaço para mais ganhos.”

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