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Trecho da BR-381 entre Belo Horizonte e Governador Valadares: duplicação estava no PAC 1, do segundo mandato de Lula, e até hoje não ocorreu. Dilma e Bolsonaro também tentaram, sem sucesso.
Trecho da BR-381 entre Belo Horizonte e Governador Valadares: duplicação estava no PAC 1, do segundo mandato de Lula, e até hoje não ocorreu. Dilma e Bolsonaro também tentaram, sem sucesso.| Foto: Divulgação/CNT

O Novo Programa de Aceleração do Crescimento (Novo PAC) foi lançado há apenas três meses, mas já tem um grande fracasso. Ninguém se interessou pela concessão da duplicação da BR-381 entre Belo Horizonte e Governador Valadares (MG).

O leilão estava marcado para o dia 24, mas foi cancelado porque nenhuma empresa ou consórcio entregou proposta pela estrada, conhecida como “Rodovia da Morte” pelo alto número de acidentes fatais.

O Ministério dos Transportes não comentou a falta de interesse pelo trecho de 317 quilômetros. A obra funcionaria como um "cartão de visitas" para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no estado, que é governado por Romeu Zema (Novo), um dos principais nomes da direita nacional.

"Nós vamos fazer a estrada. Transformar a atual estrada da morte em estrada da vida para vocês terem segurança quando saírem para passear com a família", prometeu Lula em setembro de 2022, durante um comício eleitoral em Ipatinga (MG).

Lula promete a duplicação da BR-381 desde seu segundo mandato, pelo menos. Trata-se de uma das 11 obras rodoviárias do primeiro PAC que nunca foram entregues, e acabaram "recicladas" nesta terceira versão. Os ex-presidentes Dilma Rousseff (PT) e Jair Bolsonaro (PL) também prometeram a obra.

Segundo o Ministério dos Transportes, novas tratativas para licitar a rodovia serão realizadas no primeiro semestre do próximo ano.

O desinteresse pela obra evidencia que, apesar da reciclagem, o PAC enfrenta velhos problemas vistos nas primeiras versões do programa – problemas que, por sua vez, são um reflexo de um grande conjunto de dificuldades que emperra obras de infraestrutura no país.

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) considere o programa – que promete desembolsos privados e públicos de R$ 1,4 bilhão até 2026 – um importante passo para a modernização da infraestrutura do país.

Porém, falta resolver antigos problemas relacionados à baixa qualidade na estruturação dos projetos, ao excesso de burocracia e à má gestão na execução das obras.

Outras deficiências são o custo de financiar projetos de infraestrutura, questões tributárias e a falta de priorização e de execução de obras.

A Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA),  representante dos produtores rurais, aponta que a lista de obras do programa não contém informações básicas, sobre como e quando serão executadas. “É mais uma lista de intenções”, destaca.

Excesso de burocracia

Um dos problemas que emperra os investimentos em infraestrutura, sejam eles públicos ou privados, é o excesso de carga regulatória. Segundo a CNI, um dos principais impactos é sentido por empreendimentos e atividades de baixo impacto ambiental.

“A pesada carga regulatória sobre empreendimentos e atividades desse tipo pode acarretar morosidade na atuação das agências licenciadoras, e, consequentemente, comprometer as entregas do PAC”, destaca Ramon Cunha, especialista em infraestrutura da entidade empresarial.

A CNA observa que essa pesada carga regulatória, que, ao mesmo tempo, é frágil, contribui para afastar potenciais investidores, sejam eles nacionais ou estrangeiros.

Problemas de gestão na execução de obras

Cunha diz que o Brasil apresenta um histórico de baixos investimentos em infraestrutura, em que parte desses recursos é desperdiçado em obras que não avançam e acabam sendo paralisadas.

“As paralisações não são consequência da complexidade dos empreendimentos, mas de falhas básicas na forma que o setor privado executa seus projetos de infraestrutura”, diz o especialista da CNI.

É o caso, por exemplo, da duplicação da BR-280, entre as cidades catarinenses de São Francisco do Sul e Jaraguá do Sul, em um total de 74 quilômetros. A obra também é uma das remanescentes do primeiro PAC, de 2007, e foi incluída no segundo, em 2011. O primeiro trecho, de menos de dois quilômetros, foi entregue apenas em junho passado.

Uma das raízes do problema pode estar na qualidade da estruturação dos projetos. Mas, na avaliação da Abdib, esse é um problema que vem perdendo força. O diretor de economia da entidade, Roberto Guimarães, aponta que a qualidade dos editais e os projetos de concessão tiveram melhoras significativas nos últimos 20 anos.

“Há uma definição melhor dos papéis dos poderes concedentes, do setor privado, das agências reguladoras e dos usuários. O trabalho é bem melhor”, diz.

Faltam recursos públicos e rentabilidade oferecida ao setor privado é baixa

Um desafio para o governo na execução do PAC é a disponibilidade de recursos públicos. Apesar de parte das obras ser feita com recursos privados, como é o caso das rodovias, muitas delas necessitam de recursos públicos. Em vários casos, a baixa rentabilidade oferecida pelos editais inibe a atuação da iniciativa privada.

O momento não é dos mais propícios para gastos públicos. Segundo o Banco Central, o resultado primário do setor público em 12 meses até setembro ficou negativo em quase 1% do PIB. Um ano antes, havia superávit de 1,9% do PIB.

Segundo Cunha, uma alternativa é o desenvolvimento de estratégias como parceiras público-privadas (PPPs) e novos modelos de concessão de ativos de infraestrutura.

“A CNI defende novos desenhos licitatórios, como no caso das rodovias, com modelos de concessões federais simplificadas, voltadas para a manutenção de trechos, com menos exigências de investimentos e redução de barreiras à entrada de novos operadores”, diz.

Número de empresas no setor é restrito, e apetite por novos projetos diminuiu

Outro problema que pode ter contribuído para a ausência de interessados na duplicação da BR-381 é o restrito mercado de concessionárias no país.

Segundo a Agência Infra, há poucas empresas no país para fazer grandes investimentos, e muitas hesitam em assumir novos projetos por restrições para ampliar o endividamento.

Em paralelo, o governo está tentando reprogramar vários contratos de concessão que estavam em processo de devolução amigável.

A Agência aponta que as empresas estão direcionando seus esforços para os estudos da reprogramação, que, na prática, vira uma nova concessão, devido ao elevado investimento que é necessário nos três primeiros anos. Isto reduz o apetite para novos projetos.

Custo de financiamento dos projetos

Para a CNA, questões macroeconômicas também influenciam na decisão de investimento. Uma barreira à expansão dos projetos de infraestrutura no Brasil é o custo do financiamento.

A redução da Selic – de 13,75% ao ano em agosto para 12,25% hoje – não deu grande refresco para os tomadores dos recursos.

No Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), um dos principais agentes dedicados à liberação de recursos para infraestrutura, a taxa média de juros para financiamento de investimentos estava em 11,54% ao ano, em setembro. É o segundo mês seguido de alta na taxa. “O custo do capital é um entrave para a realização dos investimentos”, destaca Guimarães, da Abdib.

A expectativa da entidade, entretanto, é de que a situação melhore no próximo ano, com uma eventual continuidade na queda da taxa Selic. As projeções do mercado financeiro, divulgadas nesta segunda (27) no boletim Focus do Banco Central, sinalizam para uma taxa de 9,25% no fim de 2024 e de 8,75% em 2025.

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