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Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) durante cerimônia de retomada das obras da refinaria de Abreu e Lima, em Ipojuca (PE)
Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) durante cerimônia de retomada das obras da refinaria de Abreu e Lima, em Ipojuca (PE)| Foto: Ricardo Stuckert/Presidência da República

A decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de demitir Jean Paul Prates do comando da Petrobras na noite de terça-feira (14) pegou de surpresa agentes do mercado financeiro – que receberam a notícia, de modo geral, como negativa para o futuro da empresa.

A visão predominante é de que a troca no comando busca ampliar a interferência política de Lula sobre a estatal. Pesquisa realizada no início do mês mostrou que quase metade da população entende que o presidente da República exerce esse tipo de pressão.

Indicado pelo próprio chefe do Executivo para o cargo, Prates vinha se desentendendo publicamente com os ministros de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e da Casa Civil, Rui Costa. No episódio mais recente, o agora ex-presidente da estatal queria distribuir dividendos extraordinários da empresa, mas a decisão do governo foi por reter os recursos para aumentar a capacidade de investimento da companhia.

No início de abril, a empresa precisou negar que Prates seria demitido após uma série de notícias indicarem a troca no comando. Pouco antes, a Comissão de Valores Mobiliários(CVM) havia instaurado um processo administrativo para investigar “notícias, fatos relevantes e comunicados” sobre a Petrobras em meio aos rumores.

Apesar da pressão inicial, o processo de “fritura” de Prates parecia ter arrefecido nas últimas semanas. “Ele [Prates] até levou isso em tom de brincadeira e depois morreu esse assunto”, lembra Frederico Nobre, chefe de análises da Warren Investimentos. “A gente foi pego de surpresa com essa notícia, agora”, afirma.

O economista avalia a decisão do governo como “bastante negativa” para a empresa. “Primeiro porque traz uma falta de credibilidade, uma insegurança. E acho que é desnecessário, porque o Jean Paul Prates estava fazendo um trabalho bem razoável, é um cara bem ponderado, que vem do setor, que conhece o setor, que conhece a empresa”, afirma.

Apesar de ter colocado em prática alguns dos anseios de Lula para a empresa, como a mudança na política de dividendos e o fim da política de preço de paridade de importação (PPI), Prates também procurou atender demandas de investidores. A posição por distribuir uma parte dos dividendos extraordinários em vez de reter todo o valor para a política de investimentos da companhia é um exemplo.

Mas ela ainda se indispôs diretamente com Silveira e, por tabela, com o governo, ao pedir alterações nas metas do governo para a produção de biodiesel, negar-se a intervir no preço de querosene de aviação (QAV) para socorrer companhias aéreas e contrariar o ministro de Minas e Energia sobre a possibilidade de aproveitar gás natural do pré-sal que hoje é reinjetado.

Nobre considera que Prates, em sua gestão, mantinha boa interlocução com o mercado, o Planalto, o Congresso Nacional e os demais agentes envolvidos na governança da Petrobras. “Pegava bem nesse sentido, então eu avalio como negativa a saída dele.”

Para Gustavo Cruz, estrategista da RB Investimentos, o ex-senador não atuou de forma totalmente alinhada à economia de mercado, mas inibia uma interferência política desmedida na empresa.

“É importante salientar que a gente tem visto nos últimos meses uma defasagem relevante no preço da gasolina, ou seja, o Prates não foi alguém que foi pró-mercado, que ficou totalmente isento de algum tipo de defesa sobre uma gestão mais política”, explica.

“Mas, de qualquer forma, foi entendido pelo presidente Lula e seus aliados que era necessário algo a mais, que gostariam de mais anúncios de investimentos, de mais geração de emprego direto da Petrobras", complementa.

“Existiram tentativas de se fazer uma interferência na Petrobras, mas diante de tudo o que aconteceu nos últimos 15 anos, não foi colocado tanto em prática”, avalia Cruz.

Por volta de 12h30 desta quarta-feira (15), as ações preferenciais da petrolífera caíam -5,73% na B3, enquanto as ordinárias acumulavam retração de -6,73%.

“Embora tenha sido previamente noticiado pela mídia que Prates teria sofrido pressão política solicitando sua substituição, a mudança repentina no CEO não era esperada neste momento”, destaca relatório da XP Investimentos, assinado por Regis Cardoso e Helena Kelm, analistas de Óleo, Gás e Petroquímicos.

“A mudança repentina na gestão adiciona significativa incerteza ao caso de investimento e aumenta a percepção de risco dos investidores”, avaliam.

Para assumir o comando da estatal, Lula indicou o nome de Magda Chambriard, engenheira civil e mestre em engenharia química pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, além de profissional de carreira da Petrobras e ex-diretora-geral da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Enquanto ela não é aprovada pela assembleia de acionistas, a estatal será comandada interinamente por Clarice Copetti, diretora de Assuntos Corporativos. Ela foi vice-presidente da Caixa no governo de Dilma Rousseff (PT) e contaria com a confiança do ministro Silveira.

À parte a formação técnica, Magda Chambriard manifesta um perfil mais desenvolvimentista, favorável a uma maior participação do Estado na economia. Ela já defendeu publicamente, por exemplo, o fortalecimento da indústria naval, a priorização de conteúdo local e a ampliação do parque de refino da Petrobras.

“Experiência quanto ao core da Petrobras ela tem. Só que, de fato, o Prates estava apresentando uma resistência aos modelos do governo e principalmente dividindo a cúpula do PT em relação às suas opiniões um pouco mais fortes na condução da Petrobras, e muito possivelmente ela deve estar mais alinhada com a velha guarda do PT”, opina Alexandre Pletes, head de renda variável da Faz Capital.

“A gente tem possivelmente uma gestão conduzida um pouco mais pelo Poder Executivo, pelo Ministério [de Minas e Energia] e consequentemente pelo presidente Lula”, diz Pletes. “Imaginamos que a política de dividendos deve mudar e talvez até a política de preços, principalmente se o IPCA continuar pressionando.”

Para a equipe da XP Investimentos, a mudança repentina na gestão adiciona significativa incerteza ao caso de investimento e aumenta a percepção de risco dos investidores. “Esse contexto provavelmente levantará preocupações dos investidores minoritários sobre o possível risco de interferência do acionista majoritário (ou seja, o governo) na gestão da empresa.”

Uma nota lançada pela Federação Única dos Petroleiros (FUP), entidade sindical filiada à Central Única dos Trabalhadores (CUT), reforça a expectativa.

“Esperamos que a nova presidente ajude a cumprir o programa do presidente Lula, enfrentando os desafios que há junto ao mercado e a uma parte da corporação da Petrobras, que joga contra a implementação desse programa que foi aprovado pela população nas urnas”, declarou Deyvid Bacelar, coordenador-geral da FUP no texto.

“[Magda Chambriard] é uma pessoa que tem um viés que é diferente do dos acionistas da Petrobras, menos para o mercado do que o do Prates ou de outros eventuais dirigentes da companhia que a gente teve no passado recente, então acho que é bem ruim a sinalização”, diz Nobre, da Warren.

Para Marcelo Boragini, sócio e especialista em renda variável da Davos Investimentos, a mudança traz um viés negativo para a Petrobras, ao menos em um primeiro momento. “A leitura do mercado é de que a ala intervencionista ganhou a queda de braço com o Prates”, diz.

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