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Economista Mansueto Almeida. | Henry Milleo/Gazeta do Povo
Economista Mansueto Almeida.| Foto: Henry Milleo/Gazeta do Povo

O diagnóstico sobre a economia feito pelo economista Mansueto Almeida, especialista em contas públicas, dá poucas esperanças de um ajuste rápido.

Em entrevista à Gazeta do Povo na quarta-feira (4), em Curitiba, onde deu palestra a estudantes de Direito da Universidade Federal do Paraná (UFPR) no Fórum Interdisciplinar de Direito e Economia, Almeida disse que o estado das contas públicas não permite saídas fáceis. O ajuste terá de envolver corte de gastos, reformas difíceis, como a previdenciária, e aumento da carga tributária.

Qual o diagnóstico da economia?

Estamos em um país que teve uma queda do PIB de 3,8% no ano passado e possivelmente neste ano o valor será próximo a isso. Não é normal em um país que não tem crise bancária ou não está em guerra uma retração do PIB de 9% em dois anos. Isso mostra o nível de desorganização da economia brasileira e o problema, claro, está ligado à crise fiscal que a gente atravessa.

Quais os primeiros passos para se lidar com a crise fiscal?

O déficit primário do setor público gira em torno de R$ 120 bilhões por ano. Para a dívida parar de crescer, teríamos que transformar esse déficit de 2% do PIB em pelo menos superávit primário de 2% do PIB. O governo que vai começar agora teria dois anos para fazer um esforço fiscal de 4% do PIB. São R$ 240 bilhões. É muito difícil que seja feito um esforço fiscal desse tamanho em dois anos. O que o governo pode fazer é ir melhorando a situação. Ele pode mostrar pelo menos que o déficit primário será reduzido para próximo de zero. É importante que cada ano apresente melhora dos indicadores fiscais.

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Essa melhora passa pela aprovação de projetos no Congresso. Como você avalia o que já foi enviado pela equipe do ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, e o que seria necessário além disso?

Foi enviado um projeto estipulando um teto de gasto, mas ele tem problemas. Não é suficiente se você não mudar também os componentes do gasto. Por exemplo, de 2002 a 2014, a despesa do INSS cresceu um ponto do PIB. De 2014 a 2016, essa despesa vai crescer mais um ponto, chegando a 7,9% do PIB. Não adianta limite para despesas se as regras para o INSS, para a indexação de programas sociais continuam as mesmas.

Se a questão é limitar o crescimento do gasto, teremos que ver se a sociedade está disposta a tornar as aposentadorias mais rígidas. De todo o chamado gasto social, que inclui INSS, seguro-desemprego, abono, LOAs e outras coisas, só um não é indexado, que é o Bolsa Família. Os outros o governo tem de ajustar periodicamente. No ano passado, por exemplo, não teve reajuste do Bolsa Família. A gente vai querer que essa mesma regra seja aplicada a outros gastos sociais? Do que o ministro mandou para o Congresso, o mais importante é a negociação das dívidas dos estados. Porque o maior problema dos estados é o tamanho de suas folhas de pagamento. O que eles gastam com ativos e inativos se tornou muito elevado. No projeto que a Fazenda enviou existia uma regra dando dez anos para um ajuste. Quando a receita voltasse a crescer eles teriam de reservar uma parte, de 20%, para recuperar a capacidade de investir. Tudo isso está parado à espera do que vai acontecer na votação do Senado.

O novo governo assume com um incêndio para apagar que é a mudança da meta fiscal para este ano.

Seja o governo atual ou o que venha a assumir vai ter que mudar a meta. Foi estabelecida uma meta de superávit primário totalmente irrealista. A meta era de R$ 24 bilhões para o governo central. Para isso, ele teria de ter um crescimento nominal da receita de R$ 171 bilhões. No ano passado, o crescimento foi de R$ 20 bilhões. Se a economia neste ano vai ser muito semelhante à do ano passado, por que a receita cresceria R$ 171 bilhões?

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Uma das propostas que aparecem no plano do novo governo é uma grande desvinculação de receitas. Isso resolve de alguma maneira a crise fiscal?

No curto prazo, resolve muito pouco. Porque, com a queda da receita, grande parte dos governos estaduais e inclusive o federal passaram a gastar acima do mínimo constitucional em áreas como saúde e educação. Mesmo que você desvinculasse o gasto, a ajuda imediata seria muito pequena. Ajuda quando a economia voltar a crescer, porque a regra da vinculação obriga o governo a gastar quando tem aumento de receita. Mas não está se discutindo uma desvinculação específica, mas uma DRU, a desvinculação de receita que deixa a educação fora e libera um percentual.

Se nem um teto de gastos nem a DRU resolvem no curto prazo, o que sobra?

Para o teto de gastos funcionar, você precisa mudar os gastos que são indexados. Mas é verdade que a desvinculação não resolve no curto prazo. Sobra cortar gastos, o que também é um problema. O que o governo poderia cortar ele fez no ano passado e no primeiro trimestre deste ano. Os gastos com saúde e educação no ano passado já foram cortados. Programas como Ciência Sem Fronteira e Pronatec foram reduzidos.

Só pelo lado da despesa você não leva o déficit primário de R$ 120 bilhões para zero. O novo governo vai ter de discutir de forma aberta com o Congresso, porque talvez seja necessário um aumento da carga tributária, mesmo que de forma temporária. Pode ser um aumento com alíquota decrescente.

Como o governo comunicaria um ajuste em prazo mais longo?

Se o mercado aceitar que será feito o ajuste, mesmo que em quatro anos, já haveria uma reação positiva. Os juros cairiam, a dívida começaria a crescer menos, o risco do país cairia, ficaria mais fácil para as empresas tomarem dívida lá fora. Desde que o plano seja crível. É possível avançar mais rápido em outras frentes, como as concessões.

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