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Campanha para estimular as pessoas a pedir nota fiscal vai aumentar arrecadação: processo não gera custos para o Estado | Brunno Covello/Gazeta do Povo
Campanha para estimular as pessoas a pedir nota fiscal vai aumentar arrecadação: processo não gera custos para o Estado| Foto: Brunno Covello/Gazeta do Povo

Opinião

Mais pontos fracos do que fortes

O programa Nota Fiscal Paranaense foi apresentado como uma ferramenta de educação fiscal. Não é nova a ideia de se sortearem prêmios para os contribuintes que fazem a sua parte exigindo o cupom que garante o recolhimento do ICMS. É um caso em que o ganho na arrecadação em um primeiro momento pode ser marginal, mas no longo prazo cria-se um hábito. O problema é que o programa tem mais pontos fracos do que fortes.

Primeiramente, foi apresentado como uma solução fechada, sem debate público. Há soluções melhores no mercado, como a Nota Fiscal Paulista, e por isso seria interessante que representantes da sociedade pudessem opinar sobre a ideia. Além disso, o SMS onera a população que cumpre a sua parte e pede a nota. Cobrar por algo que deve ser um hábito de todos não é o sinal correto para a população.

O programa paranaense também padece de falta de transparência. Não se sabe quanto a empresa contratada (concorrente única, em três licitações idênticas pelo país) vai ganhar com a prestação do serviço. Quantos milhões de mensagens serão enviados? Quanto vai ser o faturamento da empresa? O estado concedeu uma nova loteria sem controlar o destino da receita com a mensagem de texto e ainda por cima banca os prêmios. De quem é a maior vantagem no fim do dia?

Guido Orgis, editor executivo de Economia

R$ 0,31 mais impostos é o custo com o SMS que precisa ser enviado com os dados da nota fiscal para concorrer aos prêmios em dinheiro. Desembolso total pode chegar a até R$ 0,48.

12 mil cupons fiscais já foram enviados pelos contribuintes desde que a Nota Fiscal Paranaense foi lançada, há duas semanas.

Alto risco

Por onerar o contribuinte e ser um pouco burocrático, o modelo adotado pelo Paraná para estimular as pessoas a pedir nota fiscal tem grande chance de não surtir o resultado desejado, ou seja, aumentar a arrecadação do estado. A opinião é do presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário, João Elói Olenike. Ele diz que o governo poderia, por exemplo, ter optado por postos físicos de troca de cupons fiscais por bilhetes ou buscado alternativas mais democráticas. "São Paulo encontrou uma forma de devolver ao contribuinte o dinheiro do imposto cobrado a mais", exemplifica.

Histórico

Tecnologia do programa foi desenvolvida com recursos da Finep

A tecnologia mobile que permite o cadastro e o envio de informações da nota fiscal via SMS foi desenvolvida pela MJV Tecnologia e Inovação em parceria com a Secretaria da Fazenda do Rio de Janeiro com recursos da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. Ao todo, a empresa recebeu R$ 2,8 milhões pelo Programa de Subvenção Econômica da Finep para desenvolver o projeto, chamado de m-gov. O Rio de Janeiro foi o primeiro estado a adotar o sistema de incentivo à solicitação da nota fiscal, em 2009. Com a mesma tecnologia, a empresa venceu licitações em Minas Gerais, Paraíba e Paraná. Em todos, a remuneração da empresa vem de parte do valor do SMS mais os impostos pagos pelos contribuintes.

Lançada há duas semanas, a campanha Nota Fiscal Paranaense já recebeu 12 mil cadastros de cupons fiscais e algumas críticas. A principal é o fato de o contribuinte ter de pagar pela mensagem de texto (SMS) que envia os dados da nota à Secretaria de Estado da Fazenda (Sefa) e permite ao cidadão concorrer ao sorteio de prêmios em dinheiro. A cobrança do SMS tem justificativa: é por meio dela que a empresa que opera o programa é remunerada.

INFOGRÁFICO: Veja como participar dos sorteios do Nota Fiscal Paranaense

Exceto por pequenas diferenças, o modelo implantado no Paraná, que incentiva o consumidor a pedir a nota fiscal para concorrer a prêmios, é o mesmo adotado pelos estados de Minas Gerais e Paraíba. Não apenas os editais de licitação são idênticos, com descrições técnicas iguais, como a empresa vencedora do certame também é a mesma, a MJV Tecnologia e Inovação. É ela quem negocia com as telefônicas o valor a ser pago pelo SMS que envia os dados do cupom fiscal.

No Paraná, a empresa venceu a licitação com a proposta de R$ 0,31 por SMS mais o custo dos impostos – o mesmo valor praticado em Minas Gerais, Paraíba e Rio de Janeiro (onde foi aplicado pela primeira vez). No Paraná, segundo levantamento da Sefa, o custo do SMS com os impostos deve ficar entre R$ 0,41 e R$ 0,48. Pelo contrato com os governos, esse valor é repassado à MJV, que contrata o serviço das telefônicas. Já os governos não têm qualquer custo com a remuneração da empresa, que recebe parte do valor do SMS. Procurada, a MJV não concedeu entrevista.

Nos três estados em que participou das licitações – vencidas por quem oferecesse o menor preço para o uso dos serviços de SMS –, a MJV não enfrentou concorrência. No caso do Paraná, a empresa foi a única que atendeu a todas as exigências do edital, segundo informou a Sefa. "Outra empresa chegou a se candidatar, mas não preenchia alguns requisitos", afirma a coordenadora da campanha no Paraná, Maria de Fátima Zanardini.

Um dos motivos prováveis foi o pouco tempo disponível entre o lançamento do edital e a abertura das propostas. No total, todo o processo de licitação ocorreu em menos de 20 dias. A campanha inteira foi implantada em 60 dias.

Crítica

O modelo paranaense contrasta com o paulista, que devolve parte do imposto ao contribuinte e ainda promove o sorteio de prêmios. Lá, o sistema foi desenvolvido pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), em código aberto, ou seja, poderia ser adaptado e personalizado às necessidades de outros estados.

Neste caso, o empecilho para implantar no Paraná algo semelhante ao modelo de São Paulo seria o custo para o governo, explica Maria de Fátima. "Teríamos de criar um sistema paralelo. Isso demandaria dinheiro e funcionários, ou seja, precisaríamos paralisar projetos que estão em andamento. Escolhemos esse modelo porque a implantação era mais simples e rápida", diz.

Governo não tem estimativa de impacto na arrecadação

Apesar da contrapartida dos prêmios – que somam cerca de R$ 1,5 milhão até o final deste ano –, o governo afirma não ter um cálculo do impacto da campanha no aumento da arrecadação com o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

Segundo Maria de Fátima Zanardini, coordenadora da campanha Nota Fiscal Paranaense, o objetivo principal é estimular o cidadão a exigir a nota fiscal e promover a concorrência leal entre os estabelecimentos. "O aumento da arrecadação é uma consequência", diz.

A experiência de outros estados que adotaram o sistema de cidadania fiscal há mais tempo também não revela o tamanho do aumento na arrecadação de ICMS.

Aumento de 11%

Em Minas Gerais, a campanha foi implantada em 2011 e tem cerca de 6 milhões de notas fiscais cadastradas até agora. Nesse período, a arrecadação do varejo cresceu quase 11%, mas não é possível separar quanto desse crescimento se deve ao programa, afirma Antônio de Castro Vaz de Mello Filho, coordenador do programa Minas Legal.

"Não deslanchou"

Na Paraíba, por enquanto a realidade não correspondeu à expectativa, afirma a gerente de educação fiscal do estado, Ciliana Nunes. Lançada em agosto de 2013, o programa Paraíba Legal tem pouco mais de 328 mil notas cadastradas até agora. "Apesar dos prêmios, a campanha não deslanchou. Falta educação fiscal", afirma.

***O endereço do site da campanha no infográfico estava errado. A informação foi corrigida às 18h desta segunda-feira (28).

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