• Carregando...
O empresário Donizete Campanelli hipotecou metade do valor da casa para comprar um equipamento para sua empresa | Aniele Nascimento/ Gazeta do Povo
O empresário Donizete Campanelli hipotecou metade do valor da casa para comprar um equipamento para sua empresa| Foto: Aniele Nascimento/ Gazeta do Povo

Alternativa

Metade da casa por um investimento na empresa

O empresário Donizete Campanelli hipotecou a casa para comprar um equipamento para sua empresa. Emprestou R$ 244 mil e vai pagar parcelas de cerca de R$ 5 mil em 15 anos. "É um equipamento caro e como é usado não há linhas de financiamento atrativas. Então optei pela hipoteca. Com o lucro pretendo antecipar o pagamento e honrar o empréstimo em quatro anos", afirma.

O imóvel, avaliado pelo banco em R$ 480 mil, vai financiar um trator de perfuração de solo, fabricado na Itália, usado na construção civil. "Um equipamento como esse, novo, custa mais de R$ 1 milhão", diz. Campanelli diz que "sempre dá um pouco de medo" fazer esse tipo de operação, mas ele está confiante. "O setor da construção está crescendo e vamos ter um salto tecnológico com essa nova máquina", afirma.

Diferente

Sistema é seguro e não repetirá o subprime dos EUA, dizem os bancos

Apesar das semelhanças com o modelo que gerou a crise norte-americana do subprime no fim de 2008, bancos e financeiras dizem que o crédito imobiliário sem destinação específica que tem o imóvel como garantia é uma modalidade segura, indicada principalmente para a população de classe média que já quitou a casa própria e que tem boa saúde financeira.

A modalidade, garantem os bancos, tem regras que trazem segurança ao sistema. A maior parte das concessões é feita por meio da alienação fiduciária, na qual a propriedade passa para o banco durante o financiamento e a execução é rápida. Nos Estados Unidos, o cliente continuava como dono do imóvel. Ao contrário do que ocorre aqui, nos Estados Unidos, era possível também hipotecar várias vezes o mesmo imóvel e em valores superiores ao seu valor de mercado.

"As instituições aqui são mais conservadoras na análise do cadastro. Clientes inadimplentes ou com baixo potencial de pagamento, mesmo com um imóvel quitado e de valor alto, não conseguem esse tipo de empréstimo", diz Rodrigo Pinheiro, da Barigui Companhia Hipotecária. A taxa de recusa de cadastro nesse tipo de operação varia de 30% a 50% no mercado. As instituições, no entanto, não fornecem dados sobre a inadimplência na carteira. "Mas ela é praticamente zero", diz o superintendente da Caixa Econômica, Hermínio Basso.

O boom imobiliário está estimulando o mercado de hipotecas – empréstimos com garantia de imóvel – no Brasil. A modalidade de crédito, que começou a ser explorada pelos bancos principalmente a partir de 2009 no país – cresceu até 550% no ano passado e deve dobrar de tamanho em 2012. A hipoteca está sendo usada para bancar a expansão do negócio, cursos no exterior, comprar um segundo imóvel ou pagar dívidas mais caras.

Em 2012, a hipoteca deve crescer acima do que o crédito imobiliário como um todo, que deve ter expansão de 30% a 40% neste ano. Esta modalidade de crédito – que ficou conhecida por estar no centro do estouro da bolha imobiliária nos Estados Unidos há três anos – já alcançou cerca de 5% (cerca de R$ 4 bilhões) de todo o crédito imobiliário no Brasil. Mas a projeção dos bancos é que essa participação possa chegar a 25% em cinco anos.

Com uma garantia de peso nas mãos – o imóvel –, os bancos emprestam mais, a prazos maiores e juros menores. As taxas praticadas são de cerca de 2% ao mês, contra 10% das cobradas no cartão de crédito.

Em geral, os bancos exigem que o imóvel seja quitado e financiam entre 50% e 70% do valor do bem por prazos de até 180 meses. Mas como o imóvel fica alienado ao banco, em caso de inadimplência, o resgate é rápido.

A Caixa Econômica Fe­deral, que lidera o crédito imobiliário no Brasil, aumentou em 550% o saldo de operações em 2011, para R$ 2,1 bilhões, depois de ampliar de 120 para 180 meses o prazo máximo de pagamento. A expectativa para este ano é mais que duplicar esse volume – para cerca de R$ 5 bilhões – segundo o superintendente regional da Caixa, Hermínio Basso. Somente no Paraná, o volume atingiu R$ 240,4 milhões – dos quais pouco menos da metade (R$ 110,9 milhões) em Curitiba. "Por ser uma forma de crédito mais barata, o financiamento com garantia de imóvel deve dobrar de tamanho por ano. Trata-se de uma modalidade que começa a se desenvolver no Brasil e que tem grande potencial", projeta Basso.

Na avaliação de Rodrigo Pinheiro, diretor da Barigüi Companhia Hipotecária, o brasileiro vai substituir, nos próximos anos, empréstimos de curto prazo e mais caros pelos de longo prazo e mais baratos. "A dívida dos brasileiros sobre o Produto Interno Bruto (PIB) é menor do que a dos americanos sobre o seu PIB. Mas o brasileiro compromete muito mais da sua renda mensal com juros e amortizações que quem mora nos Estados Unidos. Esse descompasso se deve, em parte, ao perfil da dívida do brasileiro, que é mais cara e mais curta. Por isso esse tipo de crédito tem ainda tanto potencial no Brasil", afirma. Segundo ele, a Barigüi Companhia Hipotecária ampliou em 300% sua carteira de financiamentos em 2011, para R$ 50 milhões. A empresa reduziu juros e ampliou de cinco para dez anos o prazo de pagamento.

"É um tipo de crédito que pode bancar a reforma da casa, o investimento na empresa ou até mesmo o sonho de viagem para a Europa", diz Jaime Chiganças, superintendente de crédito imobiliário do HSBC. Porém ele admite que o crescimento mais expressivo desse mercado vai depender da queda mais acentuada dos juros cobrados. "Ele também esbarra em fator cultural que é o apego do brasileiro à propriedade e o medo de perdê-la", acrescenta. O HSBC faz hoje cerca de R$ 10 milhões de operações nessa categoria por mês, o dobro da que fazia em 2010, segundo Chiganças.

Juros são altos e exigem cautela

Apesar de ser uma modalidade de empréstimo mais barata que o cheque especial e o crédito pessoal, o empréstimo com garantia do imóvel ainda é caro se considerado o baixo risco que os bancos e instituições financeiras possuem na operação. No Brasil, a taxa de juros anual da hipoteca chega a 20% ao ano – contra 3% nos Estados Unidos nessa mesma modalidade. Para Jaime Chiganças, superintendente de crédito imobiliário do HSBC, ainda há espaço para essas taxas caírem no país com a maior concorrência entre os bancos e esse é um dos desafios para popularizar a hipoteca no Brasil.

Para Claudia Silvano, coordenadora do Procon no Paraná, o consumidor precisa pensar bem antes de hipotecar a casa. "A razão do empréstimo precisa justificar colocar em risco um bem desse porte, porque há sempre a possibilidade de surpresas e dificuldades para honrar as parcelas, como a perda do emprego ou outro problema", afirma.

Além disso, várias instituições oferecem linhas com uma taxa fixa atrelada a um indexador variável, como IGP-M, TR, CDI ou IPCA. Há em geral, um limite de comprometimento de 30% da renda com o empréstimo. Mas esse comprometimento é só inicial. Ninguém sabe como esses índices vão se comportar nos próximos anos e quanto a parcela vai pesar no bolso de quem contratou o empréstimo, sobre o qual também incidem taxas e IOF.

Segundo o advogado especialista em Direito do Consumidor Alceu Machado Neto, sócio do escritório Alceu Machado, Sperb & Bonat Cordeiro, a alienação fiduciária permite o resgate do imóvel pelo banco de maneira rápida e extrajudicialmente. "Na antiga hipoteca, havia a possibilidade de se discutir o resgate na justiça e o processo demorar mais de quatro anos para o proprietário perder o imóvel. Com a alienação, não há essa possibilidade. O imóvel é vendido e a dívida é paga. Isso também limita a margem de negociação da dívida entre o consumidor e o banco", diz.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]