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| Foto: Adriano Vizoni/Folhapress

Um dos pais do Real, o economista André Lara Resende lança o livro “Devagar e simples”. Por e-mail, ele falou sobre recessão, desigualdade, tamanho do Estado, China, inflação e a crise política: “Ainda não é possível ver como será revertida”, diz.

O livro trata de desigualdade e das conclusões de Thomas Piketty de que a distribuição de renda vai voltar aos níveis do século XIX. Como impedir o aumento da desigualdade por aqui?

O Brasil está no início de uma recessão que, infelizmente, pode ser longa e profunda. A brusca interrupção do crescimento tende a agravar as desigualdades, pois os mais pobres são os mais afetados por recessão e desemprego. Mas o mero crescimento não garante a superação das desigualdades. A experiência do século XX, como mostra Piketty, é clara: pode haver reconcentração de renda e riqueza ainda que com alto crescimento. O desafio de reduzir a desigualdade exige mais que mero crescimento. Isso sempre foi verdade, mas com o avanço da tecnologia, deverá ser ainda mais verdade neste século XXI. As sociedades avançadas não terão como evitar a ampliação dos programas de transferência de renda, para garantir um nível mínimo de qualidade de vida aos menos favorecidos. O desafio é como fazê-lo sem aumentar o peso do Estado. No Brasil, o Estado é caro como nos países mais desenvolvidos e incompetente como nos mais atrasados.

A crise política agrava a crise econômica provocada por uma política econômica anacrônica e equivocada, a partir de 2008. A crise financeira nos países centrais foi usada para justificar o aumento irresponsável dos gastos.

André Lara Resende, economista

O senhor cita o impacto da revolução tecnológica nos serviços. Como fica o emprego no setor no Brasil?

As economias avançadas estão se desindustrializando. É o resultado do avanço da tecnologia. Assim como o emprego industrial substituiu o emprego na agropecuária, o setor de serviços tem absorvido a mão de obra liberada pela indústria. O problema é que agora o avanço tecnológico tem reduzido também o emprego nos serviços. Para um país como o Brasil, já moderno na tecnologia, mas que ainda não superou muitos problemas do subdesenvolvimento e da pobreza extrema, o desafio será redobrado.

O senhor diz que a má política econômica produz mais estagnação e recessão do que a boa política produz crescimento. O que fizemos de errado na ânsia de continuar crescendo?

Má política econômica produz, com certeza, recessão e estagnação. Em contrapartida, a boa política não produz necessariamente crescimento acima da média mundial. Tentar crescer sistematicamente acima da média mundial é a fórmula para provocar grandes crises. Países que se desenvolveram, com raras exceções, cresceram devagar e sempre. Surtos de crescimento acelerado terminam, quase sempre, em crise e estagnação prolongada.

Agentes econômicos temem mais a instabilidade política que a recessão...

A crise política agrava a crise econômica provocada por uma política econômica anacrônica e equivocada, a partir de 2008. A crise financeira nos países centrais foi usada para justificar o aumento irresponsável dos gastos públicos. Sob pretexto de implementar uma política anticíclica “keynesiana”, partiu-se para uma demagógica política de subsídios, transferências e aumento dos gastos do governo que quebrou o Estado. A crise política e a revelação da corrupção institucionalizada se sobrepõem às dificuldades da economia. O quadro é muito complicado.

Como se preparar para o envelhecimento rápido da população?

A redução do crescimento demográfico, já em curso no Brasil, reduz o crescimento potencial da economia e agrava os problemas da Previdência Social. Uma economia que tem muito mais jovens em idade de trabalhar do que velhos tem mais facilidade de ser generosa com os aposentados. A reversão do crescimento demográfico até uma eventual estabilização da população trará novos desafios. O risco é, como disse Marcos Lisboa, ter um país que envelheceu antes de enriquecer.

Aumentou o nível de instrução da mão de obra, mas da produtividade, não.

Produtividade é escola, mas é muito mais do que isso. O inferno burocrático, a regulamentação kafkiana, a corrupção são detratores da produtividade. A educação é muito fraca. A educação pública básica segue lastimável. O acesso ao ensino superior aumentou; a qualidade, não.

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