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Wypych, pesquisador da UFPR: novo fertilizante está quase pronto para entrar no mercado | Valterci Santos/ Gazeta do Povo
Wypych, pesquisador da UFPR: novo fertilizante está quase pronto para entrar no mercado| Foto: Valterci Santos/ Gazeta do Povo

Lei ajudaria pequenos

Um gargalo gerado pela falta de legislação estadual para a inovação é o fato de que a lei federal se aplica a empresas que pagam impostos baseados em lucro presumido, comum para grandes contribuintes. "A lei federal é mais genérica, com porcentuais de inovação e repasse específicos para grandes empresas e instituições federais. Isso gera uma dificuldade extra em se ter inovação nas micro, pequenas e médias empresas", diz a coordenadora do Serviço de Propriedade Intelectual (SPI) do Senai Empresas, Heloisa Oliveira.

Além da legislação, pequenas empresas são mais limitadas no acesso a crédito e em mão de obra. "A maior demanda atendida pelo escritório do Senai é orientação dos pequenos empresários e inventores individuais no trâmite de modelos de utilização, registro de marcas e de desenho industrial" explica.

Um exemplo disso é a indústria de alimentos El Shadai, de Chopinzinho, no Sudoeste do Paraná. Em parceria com o Senai, a empresa desenvolveu uma massa ultracongelada para bolo inglês. O novo produto ampliou em dez vezes o prazo de validade da massa, o que facilitou a logística de distribuição e quadruplicou a produtividade da empresa. O proprietário da El Shadai, Carlos Bazanella, entendeu que a tecnologia não poderia ficar desprotegida. "Quando você investe em pesquisa, todos estão prontos para copiar. Com a patente, ficamos mais protegidos. Isso deveria ser feito por todas as empresas", diz.

  • Veja os estados que mais registraram patentes em 2008

O registro de patentes no Brasil vem crescendo desde 2005 e o Paraná vem se destacando nesse cenário. No ano passado, subiu para a quarta posição na lista dos estados que mais depositam registros de propriedade intelectual. Segundo o Instituto Na­­cional da Propriedade Industrial (INPI), em 2008 o estado ultrapassou Minas Gerais ao registrar 671 depósitos de patente junto ao órgão.

Apesar da melhora de posição, as instituições paranaenses ligadas a pesquisa e desenvolvimento destacam que o estado ainda é um dos dois únicos das regiões Sul e Sudeste que não possuem lei estadual de inovação tecnológica, um instrumento importante para alavancar investimentos. Além do Paraná, apenas o Espírito Santo ainda não tem uma regulamentação estadual de propriedade intelectual.

A coordenadora do Núcleo de Propriedade Intelectual (NPI) da UFPR, Edmeire Pereira, destaca que esse é um dos principais gargalos para fomentar a inovação e fazer com que ela chegue às ruas. A UFPR, por exemplo, acumula 89 depósitos de patentes no INPI desde 2002. Apenas um deles está com chances reais de chegar ao mercado.

"Estamos há sete anos incentivando pessoas a produzir inovação e a proteger seus inventos, mas a universidade sozinha não é capaz de levar esses produtos para a sociedade. Hoje eu tenho 89 soluções na minha mesa, cuja burocracia para patentear foi paga com dinheiro público, mas que até agora não estão ajudando em nada a sociedade", diz.

Ela ressalta que a distância entre empresas e instituições de pesquisa é um problema nacional, mas que pode ser amenizado com políticas estaduais. Edmeire acredita que a maior parte dos inventores deveria estar nas empresas, mas permanecem presos na academia, onde há mais amarras para comercializar inventos. "Temos falta de estrutura de advogados, por exemplo, que são importantes no trâmite legal de patentes", explica.

Projeto

O coordenador da Agência Pa­­ranaense de Propriedade In­­dus­trial (APPI), Marcus Zanon, conta que a lei de inovação estadual paranaense se resume hoje em apenas uma minuta, que já circula na esfera política, mas ainda não entrou na Assembleia Le­­gislativa. Uma das lacunas que a falta de lei causa é impossibilitar o afastamento do pesquisador pa­­ra desenvolver o produto em uma empresa. "É uma prática que vai contra o estatuto do servidor do estado", explica.

Ele lembra que a lei federal existe desde 2004, mas o estado precisa legislar sobre os incentivos da sua jurisdição – regras de fomento para as instituições de ensino estaduais ou incentivos à pesquisa e desenvolvimento embutidos em impostos locais, como ICMS, são alguns exemplos de apoio à inovação.

Fomento

O aumento no volume de depósitos de patentes é creditado a um trabalho de conscientização iniciado em 2003 pelo INPI. Cada núcleo de propriedade intelectual do país hoje tem pelo menos um funcionário capacitado pela instituição. O diretor de articulação e informação tecnológica do INPI, Sérgio Paulino de Carvalho, admite que o Brasil ainda está muito atrasado no contexto de desenvolvimento e de proteção da propriedade intelectual, mas avalia que nos últimos anos surgiu uma estabilidade no financiamento e na execução da inovação, com estrutura física e mecanismos de controle e de estímulo mais efetivos para as empresas e instituições.

"Temos monitoramento de pesquisadores brasileiros no exterior, que hoje já respondem com 3% da produção mundial. É pouco, mas é bom. Estamos gerando conhecimento em áreas importantes, como as biológicas e médicas, e chegando mais perto do mercado", diz.

"Inovação no Brasil, na verdade, existe desde o tempo de Dom Pedro I. Mas na prática ainda é relativamente nova, ainda estamos dando os primeiros passos em valorizar a proteção intelectual. É só olhar a UFPR, que tem 100 anos, mas só começou a desenvolver patentes agora", diz Zanon, da APPI. "A situação já evoluiu muito, hoje temos 25 bolsistas em núcleos de inovação do estado. Ainda falta reforço de pessoal de mercado, que consiga fazer uma ponte prática e constante entre a academia e a indústria. Os estados que já aprovaram suas legislações específicas estão percebendo que vale a pena", completa Carvalho.

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Exemplos

Pesquisas trazem benefícios na prática

Entre os avanços e as dificuldades das instituições de pesquisa, a inovação tecnológica paranaense hoje é tida como diversificada: na listagem de pedidos de patente no INPI estão uma barra nutritiva de cereais feita de cascas de frutas e sementes de linhaça, um sistema de análise de confiabilidade do fornecimento de energia elétrica, dois produtos para a área médico-hospitalar e inovações no segmento de veículos.Uma das estrelas da inovação do estado é a área química: são 29 depósitos de patentes dentro dos 89 encaminhados pela UFPR. É desse departamento a primeira patente que se encaminha para sair dos laboratórios e ir para o mercado. Trata-se de uma modificação da ureia para que tenha uma ação mais lenta, melhorando o controle de fertilização do solo e levando à economia do produto, uma vez que, dependendo das condições climáticas, mais de 50% do fertilizante é perdido após a aplicação no solo.

O químico Fernando Wypych divide a "paternidade" do novo produto juntamente com o colega professor Antonio Salvio Mangrich e a aluna de doutorado Cristiane Budziak Fukamachi. "Utilizando nanotecnologia, ou seja, interferindo na matéria em nível molecular, nós conseguimos produzir um composto híbrido ao isolar um componente que existe no solo e misturá-lo na ureia", explica Wypych. Além de permitir que a liberação do fertilizante seja mais lenta e duradoura, o cientista destaca que o composto não causa reações inesperadas porque é feito com um produto que já existe no solo – ou seja, não contamina a terra cultivada.

Outra frente da UFPR que tem boas condições de chegar logo ao mercado é um um componente que diminui custos e resíduos na fabricação de biodiesel. Essa patente ainda está cumprindo tempo de sigilo, mas Wypych adianta que se trata de um novo catalisador do combustível, mais eficiente do que os utilizados hoje. "A produção do biodiesel hoje é um processo homogêneo, resultante de uma ‘sopa’ de gordura com álcool e um catalisador. Hoje os catalisadores se perdem nesse processo porque se dissolvem na mistura, mas o novo produto é um pozinho que pode ser filtrado e reutilizado", diz.

Os testes até agora indicam que a mesma quantidade do produto pode participar de mais de dez processos de manufatura do combustível. "Esse catalisador poderá ser usado inclusive com óleos de baixa qualidade, como os resíduos de óleo de cozinha e, diferentemente dos produtos atuais, não é corrosivo", completa.

Também têm destaque, segundo o professor Wypych, a produção "verde" dos laboratórios de polímeros. Na linguagem não especializada, polímeros são os plásticos, presentes em praticamente toda cadeia industrial e cuja matéria-prima é o petróleo. O uso de fibras vegetais atualmente descartadas na cadeia produtiva, como bagaço de cana e de pés de milho, tem se mostrado eficaz como reforço na estrutura dos polímeros de petróleo. "Aproximadamente 30% de um automóvel, por exemplo, é composto de peças plásticas. Temos descoberto uma variedade de biomateriais polímeros, de origem natural ou sintética, que podem agregar valor no produto plástico ao mesmo tempo em que se economiza petróleo", diz.

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