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O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini: crise na Europa terá de se agravar para justificar política monetária | Fabio Rodrigues Pozzebom / ABr
O presidente do Banco Central, Alexandre Tombini: crise na Europa terá de se agravar para justificar política monetária| Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom / ABr

Expectativa

Mercado eleva projeção para a inflação e derruba a do PIB

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, tem afirmado que o Brasil crescerá entre 4,5% a 5% em 2012, mas o número é rechaçado pela maior parte do mercado. O primeiro boletim Focus do ano, divulgado ontem, mostra que os investidores apostam em crescimento do PIB de 3,3%, expectativa que caiu em relação à última pesquisa, de dezembro, quando o mercado apostava em alta de 3,48%. A Tendências Consultoria tem previsão ainda mais pessimista, de alta de 3,2%.

A expectativa para a inflação, por sua vez, vem apresentando altas a cada mês, com os sinais do governo de que a taxa básica de juros continuará caindo. No relatório de ontem, o IPCA subiu pela terceira semana seguida e passou de 6,54% para 6,55%, acima do teto permitido pelo governo – de 6,5% – e bem acima do centro da meta, de 4,5%.

Em poucos dias, o IBGE divulga o resultado do IPCA em dezembro e, por consequência, de todo o ano de 2011. Nos onze meses do ano até novembro, o índice oficial do governo já acumula alta de 5,97%. Para o último mês do ano, o mercado prevê alta de 0,54%. Ou seja, suficiente para estourar o teto do sistema de metas de inflação, que tem limite máximo em 6,50%.

Se confirmado o estouro, será a primeira vez desde 2003 que o Banco Central não consegue entregar a inflação dentro dos limites da meta. Desde o início desse sistema no Brasil em 1999, o objetivo não foi cumprido – sempre para cima – em três anos: 2001, 2002 e 2003. (BB com Agência Estado)

Com a insistência do governo em baixar os juros e utilizar a política monetária para estimular o consumo interno, sem se preocupar com a inflação no curto prazo, e a provável retomada dos gastos públicos em 2012, após um 2011 de retração nos investimentos, o Brasil deve registrar um enfraquecimento no resultado do primário neste ano. Com o esforço fiscal mais fraco, economistas afirmam que é inevitável uma nova escalada na taxa de juros no fim deste ano e ao longo de 2013, colocando em xeque a promessa da presidente Dilma Rousseff de baixar os juros reais a 2% até o fim do mandato.

O primário é a diferença entre as receitas e as despesas do governo e, quando positivo (superávit), é usado para abater os juros da dívida pública – em caso de déficit, o saldo devedor do país fica maior. O governo garante que manterá neste ano o mesmo nível do primário alcançado, com certa folga, em 2011, de 3,1% do PIB, cerca de R$ 114 bilhões, mas o mercado estima que dificilmente a meta será alcançada. As previsões variam entre 2,5% e 2,8% do PIB.

No ano passado, as contas do governo foram ajudadas por fatores temporários: o salário mínimo, reajustado apenas pela inflação, a contenção de gastos, como o congelamento de concursos públicos, e receitas extraordinárias, como o pagamento de R$ 5,8 bilhões feito pela Vale devido a uma pendência jurídica com o Fisco.

"Todos esses fatores devem contribuir para que o governo feche 2011 com um primário um pouco acima da meta estabelecida na Lei das Diretrizes Orçamentárias [3,1% do PIB]. Esse fôlego que o governo tomou, no entanto, não foi bem aproveitado para tomar medidas para sustentar o primário ao longo dos próximos exercícios, pelo menos até o fim de 2014", prevê o economista Felipe Salto, da Tendências Consultoria.

Apenas o reajuste do salário mínimo previsto para este ano, de 14,7%, deve gerar um custo adicional de R$ 24 bilhões nas contas públicas. Além disso, é consenso de que dificilmente o governo Dilma vai resistir à pressão política de aumentar os investimentos em 2012.

O Banco Central vem argumentando que a queda nos juros não vai pressionar a inflação por causa da piora no cenário externo, especialmente na Europa (leia mais abaixo), mas os efeitos da atual crise ainda são brandos no Brasil se comparados ao ocorrido em 2009. A ociosidade da indústria, por exemplo, é menor hoje (cerca de 89,5% da capacidade ocupada) do que na época do estouro da crise americana (88,5%), sugerindo que o estímulo à demanda doméstica tem agora maior probabilidade de levar a um cenário de alta generalizada dos preços.

"Os dois principais eixos da política macroeconômica estão sendo utilizados para motivar a demanda – seja via expansão de gasto e redução do superávit primário, seja através da política monetária com a redução sistemática dos juros e sem muita preocupação com o centro da meta da inflação no curto prazo, objetivando unicamente ter uma taxa de juros mais baixa para motivar o investimento", diz Salto, que prevê que o BC deve voltar a elevar os juros no fim deste ano ou no início de 2013, quando a economia começar a dar sinais de superaquecimento.

A esperança do BC é de que a sua própria previsão, feita no início do processo de redução de juros, de que o atual cenário externo teria um "impacto sobre a economia brasileira equivalente a um quarto do impacto observado durante a crise internacional de 2008/2009", esteja equivocada – e o impacto seja muito maior. O economista Marcelo Curado, da UFPR, acredita que esse é um cenário possível. "A crise europeia tende a se agravar neste início de ano. Espanha e Itália terão problemas, e, sem uma solução, o Brasil vai sentir a crise. Apesar do aumento do mínimo, a crise internacional vai segurar a inflação e o país vai continuar com a política de redução dos juros", diz.

Na Europa, problema se agrava

Sem conseguir encontrar uma solução para os problemas da dívida pública que atinge vários países do bloco, a Europa inicia um novo ano com perspectivas pouco animadoras. Um exemplo de como as propostas apresentadas até aqui são insuficientes, ou simplesmente fora da realidade, é o fato de a Itália ser responsável por 11% do pacote de ajuda à Grécia, mas agora são os próprios italianos quem precisam de ajuda. Em outras palavras: ninguém sabe ao certo de onde virá o dinheiro para o resgate dos países com problemas, se é que virá. No caso dos gregos, o mercado tem como certo uma moratória parcial, mas a parcela que não será cumprida varia muito entre os analistas – alguns falam em calote integral, de 100% do valor dos títulos.

A Grécia é um problema pequeno diante da crise em países como Espanha e Itália, ou até da França, mas o que os europeus decidirem sobre Atenas tem importância porque sinaliza o humor das nações mais ricas para enfrentar o problema. Se os gregos forem abandonados, a solução será a mesma para Itália, Espanha e Portugal? É o que o mercado se questiona.

Uma das possíveis soluções está nas mãos dos países que estão em posições mais confortáveis – como a Holanda, Alemanha e Finlândia –, mas esse dinheiro precisaria vir por meio de taxação dos cidadãos locais, e está longe do óbvio que haveria espaço político para uma decisão dessas. Caso essa solução seja viável, o Banco Central Europeu terá recursos para financiar os países com problemas até que eles possam andar novamente com as próprias pernas.

Para o Brasil, o problema na Europa pode impactar o comércio e o investimento das empresas. "Além do câmbio e do comércio, um ambiente em que a Europa não cresce e os EUA não conseguem retomar o crescimento na velocidade esperada pode afetar o Brasil por causa da revisão na expectativa dos investimentos das empresas", afirma Marcelo Curado, professor do curso de Economia da UFPR. Para Luiz Antonio Cavet, presidente do Instituto Brasileiros de Executivos de Finanças no Paraná (IBEF-PR), o Brasil pode, na verdade, ser beneficiado com recursos que antes seriam destinados a outros mercados, mas que estão passando por um momento de incerteza.

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