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Vigilante de empresa terceirizada: lei pode mudar forma de contratação | Daniel Castellano/ Gazeta do Povo
Vigilante de empresa terceirizada: lei pode mudar forma de contratação| Foto: Daniel Castellano/ Gazeta do Povo

Análise

Lei pode fortalecer trabalhadores

Segundo especialistas em mercado de trabalho, a regulamentação da terceirização é um passo importante por se tratar da delimitação legal de um mercado em crescimento. Segundo o professor de direito do trabalho e previdenciário da Universidade Positivo, Sidnei Machado, a relação de serviços entre empresas hoje ainda é dominada por inseguranças jurídicas, que invariavelmente levam a conflitos trabalhistas. "A ideia de poder terceirizar a atividade-meio e não a atividade-fim é bastante controversa. Um ponto de vista avalia que a cozinheira do hospital não participa da atividade principal da empresa, que é a medicina, enquanto outra visão defende que a alimentação é essencial à recuperação da saúde do cliente do hospital", exemplifica.

Por isso, Machado defende a criação de uma regulamentação, priorizando a isonomia de empregados que praticam a mesma função e a corresponsabilidade da empresa tomadora de serviços, conforme a prioridade social que a Organização Internacional do Trabalho (OIT) tem dado às discussões sobre o assunto. "Os acidentes de trabalho normalmente acontecem com funcionários com menor capacitação e menor remuneração. Não por coincidência, profissionais de atividades de risco normalmente são terceirizados", afirma.

Ele admite que a regulamentação no Brasil é complicada por envolver diferentes realidades, mas diz que o tema é urgente por causa do sucateamento das relações trabalhistas. "Enquanto nos Estados Unidos cada vez mais se fala em responsabilidade social nas empresas, nós importamos um modelo predatório da terceirização, baseada no baixo custo." O professor lembra que no ano passado a Justiça condenou a Petrobras a pagar multa por manter, no Paraná, trabalhadores terceirizados em situação análoga à escravidão.

A corresponsabilidade entre as empresas que comercializam serviços também é interessante na avaliação do professor do Departamento de Administração Pública da Universidade Estadual Paulista (Unesp) Álvaro Martim Guedes. De acordo com ele, a divisão de deveres obriga uma fiscalização maior da própria tomadora de serviços, e consequentemente leva à redução no índice de infrações trabalhistas. "É sabido que, em um mercado predatório, a terceirização abre brecha para ferir a Previdência e demais contribuições", diz.

Corporativismo

Guedes questiona, no entanto, os trechos do projeto que preveem a prestação de contas aos sindicatos: de acordo com ele, a tentativa de endurecimento das regras pode ser decorrente da percepção de perda da base sindical. "Aparentemente, isso é uma reação corporativa, de interesse sindicalista, uma medida elaborada no apagar das luzes de 2009 frente a um risco de perda de contribuições sindicais com o aumento das terceirizações", diz.

Guedes lembra que um metalúrgico terceirizado não contribui com a mensalidade ao sindicato, como ocorre com o funcionário das grandes metalúrgicas.

Um exemplo disso ocorreu na municipalização da educação no estado de São Paulo, que, segundo Guedes, foi atrasada por questões sindicais. Como transferir a administração das escolas para os municípios diminuiria a jurisdição – e consequentemente a arrecadação – do sindicato estadual dos professores, ele se levantou contra o projeto.

Na avaliação do especialista da Unesp, é comprovado que quanto mais rígida for a lei, maior será o incentivo à ilegalidade. Para ele, o exagero nos requisitos da terceirização soa como um retrocesso, um desalinhamento com o que existe de tendência mundial. "Quem trabalha à margem sabendo que há risco de ser pego, faz isso para tentar se manter no mercado. Quanto mais se complicar e encarecer a lei, mais estará se incentivando a infração."

  • Empresários alertam para a ameaça de um

As centrais sindicais, apoiadas pelo Ministério do Trabalho, querem endurecer as regras para contratação de funcionários terceirizados. Um projeto de lei encaminhado à Casa Civil este mês prevê uma ampla regulamentação que pode passar a influenciar todos os contratos de terceirização, como serviços de tecnologia e processamento de dados, vigilância, limpeza e telemarketing. Mesmo os contratos temporários, que têm regulação própria, podem passar a ser influenciados pelas novas regras, que preveem maior proteção dos direitos trabalhistas à classe terceirizada.O documento é um contra-ataque claro a outros dois projetos que tramitam no Congresso e são apontados como retrocesso nos direitos trabalhistas. Em­­presários, do outro lado do ringue, já se articulam para barrar o novo projeto, argumentando que, se aprovado, irá impossibilitar a terceirização de serviços no país. Ao sair da Casa Civil, o texto será uma proposta oficial do governo, ganhando peso quando for discutido no Congresso. O debate sobre o assunto é antigo, em grande parte porque o país ainda não possui um marco legal que regule a terceirização de serviços. O novo projeto prevê que a empresa não pode terceirizar funcionários para a sua principal atividade econômica, direito que hoje vem sendo garantido com decisões judiciais. Entre as mudanças mais polêmicas, no entanto, está o aumento do poder dos sindicatos na fiscalização e a ampliação da responsabilidade da empresa tomadora do serviço em vários aspectos, da segurança do trabalho ao pagamento dos terceirizados.

Regras

Na falta de uma lei, o que baliza as decisões judiciais sobre direitos trabalhistas de terceirizados no Brasil é a súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que basicamente unificou o entendimento que uma empresa não pode terceirizar funcionários em setores da sua atividade-fim. Para as centrais sindicais, a súmula é insuficiente porque para muitas empresas vale a pena assumir o passivo trabalhista. "Quem é penalizado pela irregularidade das empresas é sempre o trabalhador. Queremos uma regulamentação imediata", afirma o secretário-geral nacional da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Quintino Severo.

De acordo com ele, a falta de regras criou um universo de empresas que subcontratam várias vezes os serviços. "Muitas empresas que não são idôneas assumem o compromisso e fecham, deixando um passivo descoberto. Quem paga essa realidade é o trabalhador, que fica sem receber salário, fundo de garantia e previdência", completa.

Empresários

A regulamentação proposta, no entanto, tem outros efeitos colaterais vistos com antipatia por empresários. Entre os artigos mais polêmicos, a advogada trabalhista do escritório Augusto Prolik Lisiane Mehl Rocha destacou o terceiro, que prevê que a empresa tomadora de serviços deverá comunicar ao sindicato responsável, com antecedência de 120 dias, uma série de informações sobre a contratação. Entre elas, devem estar descritos os motivos da terceirização, a quantidade de trabalhadores envolvidos e os serviços que devem ser executados, além da redução de custos ou as metas pretendidas.

"Está previsto o fornecimento de informações, muitas vezes estratégicas, sobre a contabilidade da empresa. Informar os objetivos de redução de custos é o mesmo que abrir o livro-caixa. Isso é se submeter ao controle da entidade sindical. Se for aprovada do jeito que está, a lei vai acabar com a terceirização no Brasil", avalia Lisiane.

Severo, da CUT, confirma que o projeto prevê o fornecimento de muitas informações, mas nega que as centrais estejam se posicionando contra a terceirização. "No projeto de lei, feito junto com o governo, nós recuamos bastante para chegar a um entendimento. Nossa intenção era ter o poder de negociar e até mesmo vetar a contratação caso julgássemos que a terceirização é irregular. Mas agora queremos apenas ter direito à informação", diz.

O secretário-geral lembra que o projeto prevê também a ampla abertura de informações sobre as prestadoras de serviço, o que será positivo para quem contrata os serviços, porque permitirá checar a idoneidade das empresas que estão no mercado. Entre os documentos comprobatórios da regularidade da prestadora, estão a certidão negativa de infrações trabalhistas, alvará de localização e funcionamento, e o certificado de regularidade do FGTS. "Não queremos terminar com a terceirização. No entanto, precisamos urgentemente de um mínimo de regulamentação. A proposta que foi encaminhada para a Casa Civil ataca o mais nefasto da terceirização: é a empresa falir e deixar as dívidas trabalhistas nas costas do trabalhador."

Contratos são legais e permitem especialização

Apesar de haver irregularidades no cotidiano do mercado de terceirizados, como as centrais sindicais denunciam, a contratação de mão de obra por esse instrumento não pode ser taxada de irregular – duas empresas fecham um contrato de natureza civil, e não trabalhista, para prestação de serviços, conforme explica a advogada do escritório Augusto Prolik Lisiane Mehl Rocha.

Normalmente, a terceirização é feita em duas situações. A primeira ocorre quando existem picos de trabalho, como em meses de colheita ou aumento sazonal de demanda (como produção de chocolates na Páscoa). A outra possibilidade é quando uma empresa precisa de serviços especializados diferentes da sua atividade principal. Essa modalidade é fácil de identificar em grandes empresas que terceirizam serviços de limpeza, vigilância, informática ou de telemarketing.As prestadoras de serviço normalmente se especializam no mercado em que atuam, e é comum atenderem mais de uma empresa. O setor de tecnologia, por exemplo, demanda especialização e atualização constante para manter os computadores de uma empresa funcionando e protegidos contra ataques de vírus pela internet. O setor de relacionamento e vendas por telefone, conhecido como telemarketing, também é dono de técnicas específicas e ultimamente vem sendo alvo de muitas regulamentações, o que também demanda especialização da empresa prestadora de serviços.

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