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Movimento no aeroporto de Guarulhos, em São Paulo: nunca os brasileiros gastaram tanto fora do país | Filipe Araujo/AE
Movimento no aeroporto de Guarulhos, em São Paulo: nunca os brasileiros gastaram tanto fora do país| Foto: Filipe Araujo/AE

Malas prontas

Gasto recorde em viagens ao exterior

Brasileiros gastaram US$ 16,42 bilhões em viagens no exterior no ano passado, novo recorde histórico. Na comparação com 2009, a conta cresceu 51%. O chefe do Departamento Econômico do Banco Central, Altamir Lopes, explica que o bom momento da economia brasileira, com emprego e renda em alta e câmbio favorável, alavanca o turismo em outros países.

De todas as despesas pagas em dólar, 61,9% foram via cartão de crédito. Ao todo, as faturas dos clientes brasileiros exibiram, ao longo do ano passado, US$ 10,16 bilhões em compras em outros países. A conta cresceu expressivos 54% na comparação com 2009. Já os pagamentos feitos diretamente às agências de turismo, companhias aéreas e hotéis sem o uso do dinheiro de plástico aumentaram 47% em um ano e já somam US$ 5,67 bilhões.

Na direção oposta, turistas internacionais deixaram US$ 5,91 bilhões no país. Apesar do novo recorde, o crescimento é completamente diferente. Enquanto o gasto de brasileiros saltou 51%, a receita com estrangeiros aumentou 12%. A diferença de ritmo explica o salto de 88% no déficit da conta de viagens internacionais. "Essa foi a principal influência para o aumento do déficit da conta de serviços", diz Altamir.

Opinião

Cenário não é problemático. Inflação, sim, é um desafio

O Banco Central do Brasil (BCB) divulgou o resultado das contas externas brasileiras em 2010. No ano passado, a balança de transações correntes apresentou um déficit de US$47,5 bilhões, equivalente a 2,28% do PIB, comparativamente a déficit de US$24,3 bilhões, 1,52% do PIB, em 2009. O saldo das transações correntes representa o total das transações de venda/compra de bens e serviços entre o Brasil e o resto do mundo. Um valor deficitário significa que o país comprou mais do que vendeu.

Em 2010, a balança comercial foi na verdade superavitária em US$ 20,267 bilhões. Ou seja, o Brasil exportou mais do que importou. Acontece que o Brasil comprou mais serviços do que vendeu, e a balança de serviços ficou deficitária em US$ 70,630 bilhões. Isto significa que, no líquido, as empresas e cidadãos brasileiros compraram mais serviços do que venderam em 2010. Para chegarmos ao déficit de US$47,5 bilhões, deve-se incorporar as transferências unilaterais, que acumularam ingressos líquidos de US$2,8 bilhões em 2010.

Segundo os dados do BCB, os brasileiros gastaram US$ 16,4 bilhões em viagens ao exterior, enquanto os estrangeiros trouxeram apenas US$ 5,9 bilhões para o Brasil. Outras despesas com serviços de transporte e aluguel de equipamentos também sofreram forte alta em 2010. Certamente um reflexo do câmbio mais valorizado do que em 2009.

O déficit em transações correntes foi compensado pelo forte investimento estrangeiro direto (IED). Em 2010, os fluxos líquidos de IED alcançaram o valor recorde de US$48,5 bilhões. Além disto, o Brasil recebeu investimentos em carteira que totalizaram US$67,8 bilhões, comparativamente a US$46,2 bilhões, no ano anterior.

A leitura do resultado externo deve ser feita com cuidado. Os números apontam para uma situação em que o Brasil (empresas e pessoas) financia suas compras, principalmente de serviços, através do investimento externo no Brasil. Esse cenário não pode ser visto como problemático, como muitos querem fazer crer. O déficit em transações correntes e o seu financiamento via investimento estrangeiro é uma situação natural e inerente ao cenário econômico atual do Brasil vis-à-vis o resto do mundo.

Quando um país cresce mais do que o resto do mundo, ele se torna um atrator de investimentos estrangeiros. Os investidores são sábios e tendem a investir naqueles países cujo potencial de ganhos é maior. Este é justamente o caso do Brasil. Por outro lado, esta entrada de capital aprecia a taxa de câmbio, tornando os bens e serviços estrangeiros mais baratos para os cidadãos e empresas nacionais. Esta situação, pode perdurar por muitos anos. É uma situação natural, e não é necessariamente indesejável. Imagine por exemplo uma empresa que presta serviços dentro da Brasil, mas importa os serviços de informática de outro país. Quando a demanda interna por serviços cresce, a importação de serviços de informática do exterior também crescerá. Esta situação faz parte do período de crescimento acelerado do Brasil, enquanto o resto do mundo ainda se recupera da crise.

As contas externas não são um desafio ao Brasil neste ano. O grande problema do Brasil em 2011 será o combate à inflação. As contas externas apenas responderão ao conjunto de políticas monetária e fiscal adotadas pelo novo governo.

*Cristiano M. Costa, Ph.D em Economia pela University of Pennsylvania, é professor da Fucape Business School e autor do Blog do Cristiano M. Costa (www.cristianomcosta.com).

  • Veja como funcionam as transações correntes

A economia aquecida e o dólar barato levaram as contas externas a um rombo histórico em 2010. Com recorde nas viagens internacionais, remessa de lucros em alta e mais importações de mercadorias e serviços, o Brasil registrou saldo negativo de US$ 47,51 bilhões na conta de transações correntes – que registra a entrada e saída de dólares para pagamento de bens e serviços. O valor é quase o dobro do verificado no ano anterior e recorde da série histórica iniciada em 1947. Apenas em dezembro, o déficit somou US$ 3,49 bilhões.

Ao apresentar os números, o chefe do Departamento Econô­mico do Banco Central, Altamir Lopes, minimizou o aumento do saldo negativo que, de um ano para o outro, cresceu mais de US$ 23 bilhões. "O déficit aumentou e é recorde em dólares. Mas, se com­­parado ao tamanho da economia, o resultado corresponde a 2,28% do Produto Interno Bruto, abaixo do recorde." Nesses termos, o resultado é o mais alto desde 2001, quando as contas externas obtiveram saldo negativo equivalente a 4,19% do PIB. "Portanto, o resultado de 2010 é bastante acomodado", acrescentou Lopes. "Historicamente, o déficit começa a preocupar quando chega a um patamar próximo de 4,5% ou 5% do PIB", diz Fábio Kanczuk, professor de Economia da USP.

Uma marca relevante foi observada na saída de dólares para pagar aluguel de equipamentos, como guindastes e plataformas de petróleo. Em um ano, a conta cresceu 46% e somou US$ 13,68 bilhões em 2010. "A demanda por essas máquinas cresce porque a economia está aquecida e estão sendo realizados investimentos", explicou Lopes.

Também chamou a atenção a alta de 20% na remessa de lucros e dividendos feita por empresas multinacionais instaladas no Brasil, que transferiram US$ 30,37 bilhões às sedes. Nesse caso, as remessas acontecem porque as filiais brasileiras têm obtido bons resultados com a economia aquecida e, ao mesmo tempo, as sedes precisam de ajuda, já que os mercados maduros ainda enfrentam dificuldades.

Ao mesmo tempo em que o Brasil remete cada vez mais dólares para pagar as contas e transferir lucros, a entrada da moeda estrangeira tem diminuído. Na balança comercial, a demanda doméstica aquecida aumentou as importações em 42% em um ano. O desempenho afetou o saldo comercial, que caiu 20% ante 2009 e somou US$ 20,26 bilhões.

Investimento

O saldo de Investimento Estran­geiro Direto (IED), voltado para o setor produtivo, fechou 2010 com o recorde de US$ 48,46 bilhões. O fluxo positivo para o país de US$ 15,36 bilhões em dezembro, o maior para um único mês em toda a série histórica, surpreendeu todas as expectativas e levou o saldo do ano a ser mais que suficiente para cobrir o déficit em conta corrente de 2010.

Até novembro, tanto o mercado quanto o BC davam como certo que o IED não seria suficiente. A reviravolta no caso ocorreu basicamente por uma operação gigantesca no setor de petróleo, envolvendo os chineses da petrolífera Sinopec e os espanhóis da Repsol, que levaram ao ingresso de US$ 7,1 bilhões no país nos últimos dias do ano passado. A Sinopec adquiriu sozinha esse montante em ações da Repsol Brasil, que aumentou seu capital para realizar a aliança com os chineses.

Projeções

Kanczuk, da USP, acredita que, na pior das hipóteses, o déficit de 2011 deve atingir 3,5% do PIB. O Banco Central é mais otimista. Pelas projeções oficiais, o saldo negativo deste ano deve chegar a US$ 64 bilhões, ou 2,84% do PIB. O BC também trabalha com previsão de ingressos de US$ 45 bilhões em investimentos diretos para 2011. "As contas externas seguem piorando, mas em uma velocidade mais lenta que a previsto há algum tempo, especialmente porque os preços dos produtos exportados pelo Brasil têm subido acima da média", afirma Kanczuk.

Para manter saldo, país será mais agressivo

Com a missão de preservar o saldo comercial brasileiro em torno de US$ 20 bilhões em 2011, a nova equipe de secretários do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) assumiu o comando de áreas estratégicas da pasta com um discurso afinado: é preciso mais agressividade na defesa contra o aumento exagerado das importações e nas políticas de incentivo às exportações. Segundo o novo secretário-executivo da Câmara de Comércio Exterior (Camex), Emílio Garófalo Filho, a postura das autoridades brasileiras será mais dura em relação à concorrência com produtos fabricados no exterior.

"É preciso substituir as importações desnecessárias", afirmou Garófalo, ressaltando que o governo não vai criar barreiras para proteger a indústria, como ocorreu na segunda metade do século passado. "Vamos defender produtos que podem ser fabricados no Brasil da maneira adequada. O problema é quando o importado só está no mercado brasileiro porque fere a competição justa."

A ampliação do alcance das medidas de antidumping vem desde o ano passado, quando o governo anterior criou uma norma para punir com mais rigor e rapidez a triangulação de mercadorias e a falsificação de certificados de origem, artimanhas utilizadas pelos chineses para burlar as sobretaxas aplicadas pelo MDIC em situações onde a prática desleal de comércio é comprovada. "Vamos usar mais do mesmo, mas com mais agilidade e velocidade", explicou Garófalo.

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