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Em cadeia nacional, premiê Alexis Tsipras desmentiu que o plebiscito de domingo será cancelado. | Christian Hartmann/Reuters
Em cadeia nacional, premiê Alexis Tsipras desmentiu que o plebiscito de domingo será cancelado.| Foto: Christian Hartmann/Reuters

Cresce o apoio popular na Grécia aos credores em meio ao rompimento definitivo das negociações entre a zona do euro e o governo grego até o plebiscito do próximo domingo (5). Pesquisas divulgadas nesta quarta-feira (1º) indicam uma tendência de crescimento do “sim”, a favor de um acordo. Uma delas, do Instituto GPO, apontou 47,1% a 43,2% por aceitar as condições de socorro financeiro – os indecisos seriam 6,3%.

Um dado destacado pela mídia grega: 60% dos mil entrevistados afirmaram que a Grécia deveria permanecer na zona do euro. Em tese, a consulta de domingo não trata da saída do país do bloco da moeda única, mas, sim, se a população concorda ou não com a proposta de mais um resgate ao país em troca de compromissos fiscais. No caso, os credores são o Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Central Europeu e Comissão Europeia.

A votação, no entanto, tem sido tratada pelos líderes europeus como um caminho para a Grécia deixar ou não o bloco da moeda única, até como forma de pressionar a população a votar pelo “sim”.

A chanceler alemã, Angela Merkel, lidera o movimento que interrompeu as conversas com o governo grego. O comportamento do primeiro-ministro grego, Alexis Tsipras, tem irritado a chanceler. Para ela, o plebiscito inventado pelo premiê é um caminho sem volta, ainda mais agora que as pesquisas mostram que ele tem grandes chances de sair derrotado.

Iniciativa para salvar gregos já arrecadou 1 milhão de euros

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Três dias depois de criada, a campanha de financiamento coletivo para ajudar a Grécia a pagar sua dívida com o Fundo Monetário Internacional (FMI) arrecadou 1 milhão de euros. Apesar do peso simbólico do número, ainda falta cerca de 1,599 bilhão de euros para que a iniciativa do vendedor de sapatos inglês Thomas Feeney, 29 anos, seja um sucesso.

O desejo do jovem de salvar o país em crise parece legítimo. Em artigo no jornal inglês The Guardian, ele explicou o que o motivou a criar a campanha. “Uma matemática básica me levou a concluir que eu só iria precisar que toda a população da Europa doe 3,19 euros para alcançar o valor do fundo de resgate”, escreveu Feeney. “No início ninguém se interessou, mas após umas notícias na internet, a ideia explodiu do dia para a noite. Quando acordei tinha mais de 1,2 mil emails, e a coisa só ficou mais louca depois disso.”

Até o momento, mais de 56 mil pessoas doaram para a campanha.

Na manhã desta quarta (1º), horas depois do calote de 1,6 bilhão de euros da Grécia no FMI, Merkel rechaçou imediatamente uma nova carta do grego pedindo socorro.

No documento, revelado pelo Financial Times, Tsipras surpreendeu ao dizer estar “preparado para aceitar” compromissos que estavam na mesa de negociação até a semana passada, mas que a própria Grécia recusara. O premiê fez apenas algumas reivindicações, como manter o desconto de imposto de 30% para as ilhas do país e aplicar apenas partir de outubro novas regras previdenciárias – os credores querem que comece neste mês.

Chantagem

A oferta foi recebida como irritação pelo bloco, já que o mesmo Tsipras rompera as conversas no fim de semana, acusando o outro lado de “chantagem” e anunciando o plebiscito. O desgaste do calote e de medidas impopulares, como a restrição para transações bancárias, têm feito Tsipras temer uma derrota domingo, emitindo sinais confusos e contraditórios: numa hora quer negociar, em outra dispara chamando a outra parte de “chantagista”.

“Não haverá mais conversas nos próximos dias entre o grupo do euro, instituições e autoridades gregas sobre propostas ou financiamentos”, disse o presidente do Eurogrupo, o holandês Jeroen Dijsselbloem.

Isolado na Europa e ao mesmo tempo pressionado por seu partido, o Syriza (esquerda), a resistir, Tsipras foi à tevê fazer um pronunciamento, o segundo em três dias. Ele desfez as especulações sobre possível cancelamento do plebiscito e reafirmou o desejo para que os gregos votem “não”, ou seja, contra os credores.

“O ‘não’ não é um slogan, mas um passo decisivo em direção a um acordo melhor. Não significa romper com a Europa, mas devolver a ela seus valores”, afirmou.

Tragédia grega se assemelha à da Argentina em 2001

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Com o calote decretado na noite desta terça-feira (29), a Grécia de hoje é a Argentina de 2001. Naquele ano, o vizinho sul-americano decretava a maior moratória que se tem notícia, de US$ 102 bilhões. O desemprego chegou a 20% dos trabalhadores e a pobreza engoliu mais da metade da população (54%) em 2001, um colapso que não sai da memória dos argentinos. Em apenas quatro anos, entre 1999 e 2002, o país perdeu quase um quinto de sua riqueza.

O economista Roberto Lavagna, ministro da economia argentino entre 2002 e 2005, afirma que a reestruturação da dívida – ou moratória – é o caminho inevitável de uma economia que chega ao limite. “Quando a dívida alcança um nível tão elevado, como ocorreu com a Argentina e agora com a Grécia, não há saída possível sem reestruturar a dívida”, afirmou. Noutras palavras, sem aplicar um desconto expressivo no valor devido. “A dívida da Grécia hoje é maior do que quando começou a crise, não há prova maior de fracasso [desse programa] do que isso”, disse Lavagna.

Na Argentina, apesar de haver um calote ainda em aberto em razão da disputa do governo de Cristina Kirchner contra os chamados fundos abutres, o desconto da dívida negociado com a maioria dos credores foi de 75% do valor total. A falta de diálogo com uma parte menor desses investidores (7% dos credores), que não aceitou reduzir a dívida, mantém até hoje a Argentina à margem do mercado global de crédito.

Corralito

O “corralito” – termo criado no país para dar nome ao limite de saques bancários durante a crise de 2001– chegou aos gregos nesta semana. Em dezembro de 2001, os argentinos foram limitados a tirar de suas contas bancárias US$ 250 por semana, menos do que o autorizado aos gregos atualmente (60 euros ou cerca de US$ 55 por dia). O limite duraria um ano.

“Era um calote generalizado. Esse valor era suficiente para fazer as compras de supermercado e pagar o plano de saúde”, lembra Juan Pablo Lohle, ex-embaixador da Argentina no Brasil. “Muitos não tinham nem como comprar comida.” Dezenas de restaurantes comunitários foram criados em todo o país para alimentar a classe média baixa que despencava para a pobreza.

O tecido político se desintegrou. Em apenas 12 dias do mês de dezembro de 2001, a Argentina teve cinco presidentes da república. Nas ruas, o grito dos manifestantes contra a classe política era generalizado: “Que se vayan todos! [que saiam todos]”.

Dura lição

Segundo o ex-ministro Domingo Cavallo, que colocou em prática o corralito na Argentina, as autoridades gregas devem tentar se manter no euro a todo o custo. Após a saída de Cavallo, sob fortes críticas em 2001, a Argentina converteu todos os ativos bancários que eram cotados em dólar para pesos.

O ex-ministro, defensor da dolarização, afirma que se a Grécia repetir a receita e migrar para o dracma, os salários vão encolher ainda mais e a inflação vai disparar. “Pode ser que com a triste experiência argentina não cometam o trágico erro que o governo argentino cometeu em janeiro de 2002”, escreveu Cavallo em seu blog.

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