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Abatedouro de frango no interior do Paraná: ave e minério de ferro compõem mais da metade das vendas brasileiras ao Japão | Jonathan Campos/ Gazeta do Povo
Abatedouro de frango no interior do Paraná: ave e minério de ferro compõem mais da metade das vendas brasileiras ao Japão| Foto: Jonathan Campos/ Gazeta do Povo

Câmbio

Real é mais vulnerável à repatriação de recursos

O real é a moeda mais vulnerável do mundo diante da possibilidade de repatriação de recursos pelos investidores de varejo japoneses, disse o estrategista-chefe de câmbio do HSBC, David Bloom. "No mercado de câmbio, o que importa é a liquidez", afirmou. A maior parte das aplicações japonesas está nos Estados Unidos (US$ 118,6 bilhões) – há US$ 34,3 bilhões aplicados no Brasil. Como o mercado de câmbio brasileiro tem liquidez mais baixa, o real surge como a moeda que pode sofrer mais, caso os investidores de varejo do Japão decidam trazer de volta suas economias.

Outros analistas vêm argumentando que os japoneses dariam preferência para sacar recursos dos Estados Unidos, exatamente pela facilidade de ser um mercado mais líquido. Além disso, os juros no Brasil são elevados e seriam um atrativo para a manutenção do dinheiro. Bloom avalia, no entanto, que esses argumentos não funcionam. "Trata-se de uma emergência e nessa hora você não pensa, apenas retira o dinheiro para deixar sua família segura", afirma. Mas, para o estrategista, o movimento pode não significar necessariamente uma dor de cabeça para o governo brasileiro, que vem lutando há meses contra a valorização do real.

A tragédia do Japão deve elevar as exportações de produtos brasileiros para o país asiático neste ano. Em contrapartida, as importações brasileiras do Japão devem cair, de acordo com especialistas ouvidos pela reportagem. Segundo eles, a destruição provocada pelo terremoto e pelo tsunami, agravada pelo acidente nuclear, deve reduzir o nível de atividade daquele país de forma significativa, a ponto de diminuir as vendas de mercadorias japonesas ao exterior. A corrente comercial equilibrada entre os dois países em 2010 deve ser alterada neste ano a favor do Brasil, que deve registrar um saldo positivo de US$ 2 bilhões, estima o vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto Castro.

Entre os produtos que o Brasil exporta para o Japão, o principal é o minério de ferro. Outra mercadoria importante é a carne de frango. Os dois itens foram responsáveis por 53% das vendas do país, em valores, para o mercado nipônico em janeiro deste ano. As importações do Brasil junto ao Japão, por outro lado, estão concentradas em manufaturados, como autopeças, veículos, computadores, componentes eletrônicos e semicondutores. Em 2010, as exportações brasileiras para o Japão atingiram US$ 7,1 bilhões, enquanto as importações somaram US$ 6,98 bilhões, segundo o economista da MCM Marcos Fantinatti. De acordo com Castro, as exportações devem subir neste ano para US$ 8 bilhões, enquanto as importações devem cair para US$ 6 bilhões.

Infraestrutura

Na avaliação do professor da PUC-SP Antônio Correa de Lacerda, o Japão precisará de alguns meses para reorganizar sua estrutura produtiva. "A tendência é de que o racionamento de energia diminua a atividade das indústrias no curto prazo, o que deve diminuir a importação de minério de ferro do Brasil", disse. O presidente da AEB acredita que o déficit energético pode levar de quatro a cinco meses para ser resolvido, o que deve diminuir a importação de minérios, como o de ferro e alumínio, que demandam energia intensiva para gerar outras mercadorias, como o aço. "Com a dificuldade temporária de energia, é mais provável que o Japão aumente a importação de produtos como o aço, apesar de ter o segundo parque siderúrgico do mundo", avalia.

Para Castro, o aumento da importação de aço pelo Japão pode beneficiar o Brasil. Ele citou que a Nippon Steel é uma das principais acionistas da Usiminas, o que poderia aumentar as chances de produção da companhia mineira para o mercado nipônico. "Além disso, pode ocorrer um efeito indireto de aumento da demanda de minério de ferro do Brasil para a China, pois o Japão deve comprar muito aço daquela nação, que é o seu principal parceiro comercial no mundo", destacou.

Reconstrução

De acordo com Rei Oiwa, diretor do departamento de pesquisa da Jetro, agência do governo japonês para o fomento do comércio, a energia nuclear é responsável por 30% do fornecimento energético do país, mas metade das usinas naquela nação está funcionando. Portanto, o problema de energia envolve cerca de 15% do total. No entanto, Oiwa vê uma boa chance de ocorrer um incremento da corrente comercial com o Brasil quando a reconstrução de várias áreas do país estiver em operação. E isso, para ele, deve demorar poucos meses. "O Japão deve reiniciar logo as obras necessárias para retomar sua plena atividade. Há um grande nível de organização da sociedade e o governo está empenhado em agir com rapidez para atingir esse objetivo", afirmou.

Para Fantinatti, da MCM, o perigo de acidente nuclear pode alterar ainda mais o cenário. O medo de contaminação pode fazer com que o governo vete o consumo de produtos agrícolas produzidos em áreas rurais próximas do complexo nuclear de Fukushima. "Se isso ocorrer, é até possível que o Japão importe muito mais alimentos, o que pode elevar as exportações brasileiras para aquele mercado", diz.

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