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| Foto: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo

De setembro para cá, o dólar comercial saiu da casa dos R$ 2,20, escalou até chegar perto de R$ 3,30 e, nos últimos dias, foi negociado por pouco menos de R$ 3,10. Mesmo com a recente baixa, uma valorização de quase 40% em sete meses não é de se desprezar. Mas a esperada recuperação das exportações brasileiras pode não ocorrer tão cedo.

A alta do câmbio joga a favor do exportador, pois lhe permite reduzir preços em dólar e ficar mais competitivo lá fora sem sacrificar a rentabilidade. Mas, na maioria dos casos, as vendas não reagem imediatamente. Além disso, a demanda internacional não está tão aquecida, o que dificulta a missão de quem tenta recuperar a clientela perdida nos últimos anos. Por fim, o próprio vaivém do dólar nas últimas semanas atrapalha a assinatura de contratos. Sem mais clareza sobre o patamar em que a cotação vai se estabilizar – se é que vai –, exportadores e importadores resistem em fechar negócio.

“O cenário externo não é de crise radical, mas a demanda de fato não está muito aquecida, especialmente a dos nossos principais clientes, como a China, Estados Unidos e Argentina”, observa o economista Marcelo Curado, professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR). “O empresário já está inseguro quanto à demanda, quanto aos preços que o concorrente vai praticar. A instabilidade do câmbio é uma incerteza a mais”, diz.

Os porquês

O dólar tem variado conforme a política monetária dos Estados Unidos e a crise política do governo Dilma. A expectativa de que o banco central dos EUA subiria a taxa de juros fez o dólar subir por um tempo. Mais recentemente, os sinais de que a tal alta do juro pode demorar fizeram a moeda recuar. No Brasil, quanto mais difícil parece a situação do governo, mais o dólar sobe. A recente nomeação do vice-presidente Michel Temer para a articulação política parece ter acalmado o mercado.

“A oscilação do dólar é o que mais nos preocupa”, conta Jaqueline Cuerda Monzoni, coordenadora de comércio exterior da fabricante de móveis Moval. A empresa, que tem fábrica em Arapongas (Norte do Paraná), exporta cerca de 10% da produção para países da América do Sul e Central e da África. “Os contratos que fechamos com os bancos são de dois ou três meses, com base em determinada cotação da moeda. Mas os clientes querem fechar negócio conforme o câmbio do dia, e essa não é nossa política”, diz Jaqueline.

Uma evidência de que o dólar mais caro não faz milagre está nas estatísticas de exportação. No primeiro trimestre deste ano, a taxa média de câmbio ficou em R$ 2,87, 21% acima da média dos três primeiros meses de 2014 (R$ 2,37). Ainda assim, nessa mesma comparação as receitas de exportação brasileiras caíram 14% e as paranaenses, 19%.

Prazo longo

“É muito cedo para a desvalorização do real se refletir na balança comercial, porque os contratos são fechados com antecedência. Uma reação mais consistente pode demorar em torno de dois anos”, avalia o economista Francisco de Castro, do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (Ipardes).

Rentabilidade

O faturamento em dólares dos embarques paranaenses caiu 19% no primeiro trimestre, mas os exportadores têm um alento: ao se converter a receita para reais, em muitos casos o resultado até aumentou. Considerando-se as cotações mensais do dólar, em moeda brasileira o recuo das exportações foi de menos de 1%. Isso não significa que a rentabilidade melhorou para todos. A alta no faturamento foi acompanhada da disparada nos custos domésticos de produção.

As expectativas do mercado financeiro compiladas pelo Banco Central sugerem que a retomada pode mesmo demorar. Embora apostem em uma taxa de câmbio média de R$ 3,14 neste ano, bancos e consultorias têm rebaixado suas projeções para as exportações. No momento, preveem receitas de US$ 218 bilhões com as vendas ao exterior, 3% menos que em 2014 (US$ 225 bilhões). Em reais, o faturamento cresceria – mas não necessariamente os volumes embarcados.

Independentemente do desempenho geral das exportações, a alta do dólar anima empresários a prospectar negócios lá fora. Waldemir Kürten, proprietário da fabricante de casas pré-fabricadas Kürten, que não exportava desde 2010, esteve na África no início do mês e voltou com contratos no Congo e Botsuana. “São volumes pequenos, mas é um recomeço. Com o dólar acima de R$ 3, nosso produto volta a ser competitivo”, diz.

Indústria de madeira já nota recuperação de embarques

Para a maioria dos setores, a retomada das exportações pode demorar. Mas quem já exportava em tempos de câmbio mais baixo vê resultados mais rápido. É o caso de alguns fabricantes de produtos de madeira.

“As empresas que exportavam com o dólar em R$ 2,20 ou R$ 2,30 já eram competitivas, e se beneficiam mais num momento como este, em que, sabendo do cenário mais favorável para as exportações, o fornecedor de matéria-prima pede aumento e o cliente no exterior pede desconto”, diz Marco Tuoto, presidente da comercializadora Tree Trading.

A curitibana Laminort, que produz lâminas de madeira para pisos, móveis e decks, é parte desse grupo seleto. “Não dependemos só do mercado norte-americano, como muitas empresas que tiveram dificuldades nos últimos anos. Vendemos para Itália, Alemanha, Bélgica, Índia, China, Chile e vários outros países”, conta Anderson Kroker, gerente de comércio exterior da empresa.

Segundo ele, a reação à alta do dólar começou em dezembro, e as exportações aumentaram de 10% a 15% desde então. “Quando a taxa de câmbio estava mais baixa, apertamos os custos e aumentamos os preços em dólar. Agora, pudemos baixar um pouco o preço e, ainda assim, aumentar a lucratividade”, diz Kroker. “Além do ajuste do preço, o ramo está aquecido, na Europa e também na Índia, o que compensou o desempenho da China, que surpreendeu negativamente.”

Reversão

Uma das líderes da pauta de exportações do Paraná até meados da década passada, a indústria de produtos de madeira decaiu após o estouro da crise imobiliária dos Estados Unidos, em 2008. A construção civil norte-americana, então principal cliente do segmento, passou por um longo declínio, que só começou a ser revertido mais recentemente.

“O que manteve a indústria brasileira nos últimos anos foi o aquecimento do mercado doméstico. Algumas poucas empresas continuaram exportando, mas volumes mais baixos”, diz Tuoto, da Tree Trading. “Agora observamos uma retomada, mesmo que modesta, do mercado norte-americano. E também, muito levemente, do mercado europeu. Essa recuperação da demanda e a alta do dólar formam uma conjunção favorável para as exportações, o que ajuda a compensar a retração da economia brasileira.”

As exportações paranaenses de madeira serrada, compensado de pinus e demais derivados de madeira vêm crescendo pouco a pouco. No primeiro trimestre, o faturamento dos embarques cresceu 11% e chegou a US$ 226 milhões, o valor mais alto para o período desde 2008. (FJ)

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