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Gasolina foi a vilã da inflação em março e deve voltar a subir com aumentos de impostos.| Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil.

A gasolina foi a vilã da inflação em março, quando ficou 8,3% mais cara, segundo o IBGE. O principal motivo foi a reoneração parcial de tributos federais (PIS/Cofins). Algo parecido deve ocorrer nos próximos meses.

Em junho, entra em vigor a nova alíquota do ICMS, imposto estadual, que será igual em todas as unidades da federação e fixada em reais por litro, e não mais em um porcentual do preço de venda. O valor definido pelos estados, porém, corresponde a um forte aumento em relação à tributação atual.

Depois, em julho, deve ocorrer novo aumento no PIS/Cofins sobre gasolina e etanol hidratado, conforme previsto pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

Outra fonte de pressão vem da defasagem do preço da gasolina comercializada pela Petrobras em relação ao combustível importado. Nesta quinta-feira (13), o preço médio da estatal estava R$ 0,21 por litro abaixo do valor de importação, uma diferença de 6%, segundo cálculo da Segundo a Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom).

A recomposição dessa defasagem, porém, não é uma certeza. Ao contrário. A atual política de preços da estatal – o Preço de Paridade de Importação (PPI), que reflete as variações do câmbio e das cotações internacionais do petróleo – foi herdada dos governos Temer (MDB) e Bolsonaro (PL) e é criticada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que prometeu modificá-la. O objetivo declarado é baratear o combustível no Brasil, ou pelo menos evitar que ele suba tanto.

O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, chegou a anunciar, no dia 5, que a estatal mudaria a política comercial para o regime de preços de competitividade interna (PCI). Ele disse que a política entraria em vigor após a eleição do novo conselho e que poderia reduzir o preço do diesel em até R$ 0,25.

Segundo Silveira, a Petrobras precisa cumprir a sua função social e servir como um amortecedor para evitar que o mercado brasileiro sinta variações abruptas das cotações internacionais do petróleo, como a motivada pelo corte na produção de petróleo por parte de países da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), anunciada no dia 2.

O anúncio de Silveira, porém, pegou de surpresa Lula e a própria Petrobras. O presidente desautorizou o ministro e afirmou que o governo ainda vai discutir uma alteração na metodologia de formação de preços.

Outra pressão sobre os preços dos combustíveis pode vir da adoção de medidas de estímulo à economia, por parte do governo federal. "Quanto maior a demanda, maior a pressão sobre os preços", diz o professor Denis Medina, da Faculdade do Comércio de São Paulo (FAC-SP).

Novo ICMS deve elevar preço da gasolina a partir de junho

Uma decisão do Comitê Nacional de Secretários de Fazenda dos Estados e do Distrito Federal (Consefaz), tomada no final de março, vai colocar “lenha na fogueira da inflação” a partir de junho. É quando passa a valer a alíquota fixa de R$ 1,22 de ICMS sobre o derivado de petróleo.

Na prática, o novo valor fixo é maior que o imposto pago atualmente pelos motoristas, que corresponde a um porcentual do preço de venda. Segundo dados compilados pela Federação Nacional do Comércio de Combustíveis e de Lubrificante (Fecombustíveis), apenas Alagoas, Amazonas e Piauí cobram o equivalente a mais de R$ 1,22 por litro atualmente, conforme a tabela válida para a primeira quinzena deste mês.

A XP Investimentos aponta que a nova alíquota de ICMS corresponde a 23% do preço de venda. Hoje, a maioria das unidades da federação pratica cobra entre 17% e 20% de imposto.

Os impactos vão ser sentidos na inflação de junho. O economista Tiago Sbardelotto, da XP, projeta que o reflexo será de 0,25 ponto percentual sobre o IPCA.

O Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) havia definido uma alíquota ainda maior, de R$ 1,4527 por litro, correspondente a uma alíquota de 27%. Esse valor levaria a uma alta de 0,5 ponto percentual na inflação de julho, para quando originalmente estava prevista a medida.

No entanto, os estados desistiram desse valor mais alto após após encontro, no dia 31 de março, entre os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) André Mendonça e Gilmar Mendes e os secretários da Fazenda. Em contrapartida ao valor mais baixo (de R$ 1,22), os estados conseguiram antecipar a vigência da nova alíquota em um mês, de julho para junho.

Sbardelotto estima que, com o novo ICMS, os estados terão um ganho de R$ 7 bilhões na arrecadação em 2023. A decisão ajuda a compensar as perdas após a aprovação da Lei Complementar (LC) 194, de junho de 2022, que determinou que produtos e serviços como combustíveis, energia elétrica, telecomunicações e transporte público são essenciais e não podem ter alíquotas superiores às das "operações em geral", que eram de 17% ou 18% na maioria dos estados. Como na época o ICMS da gasolina era próximo de 30% em vários estados, o teto derrubou as alíquotas e, portanto, a arrecadação dos estados.

Um acordo entre a União e as unidades da federação foi homologado em dezembro pelo STF. O principal ponto acertado na conciliação foi a manutenção da essencialidade do diesel, do gás de cozinha e do gás natural, com ICMS uniforme (igual em todos os estados) e monofásico (cobrado em apenas uma instância).

Parte das perdas das unidades da federação foi resolvida em um acordo fechado com o novo governo. Em março, Haddad anunciou que chegou a um acordo com os 27 governadores para compensar as perdas de arrecadação do ano passado. A União vai desembolsar R$ 26,9 bilhões.

Em julho, reoneração do PIS/Cofins deve levar a novo aumento no preço da gasolina

Outro impacto sobre a inflação deve acontecer em julho, com a recomposição do PIS/Cofins. Até serem zerados temporariamente em meados do ano passado, ainda no governo de Jair Bolsonaro (PL), os tributos federais somavam cerca de R$ 0,69 por litro de gasolina e R$ 0,24 por litro de etanol.

Em março, o governo federal começou a restabelecer a tributação, determinando PIS/Cofins de R$ 0,47 na gasolina e R$ 0,02 no etanol. Na mesma ocasião, para tentar mitigar o efeito sobre os preços, a Petrobras reduziu os preços da gasolina nas refinarias.

Caso o governo decida restabelecer os patamares originais da tributação, portanto, será preciso elevar em mais R$ 0,22 por litro o PIS/Cofins, tanto da gasolina quanto do etanol.

A desoneração promovida por Jair Bolsonaro – que inicialmente valeria até 31 de dezembro de 2022, e foi prorrogada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) até fevereiro de 2023 – serviu para derrubar os preços dos combustíveis, que acumulavam forte alta.

Mesmo com a reoneração parcial, os preços ainda estão abaixo dos praticados há um ano: segundo o IBGE, no acumulado de 12 meses até março os preços recuaram 22,1% no caso da gasolina, 19,3% para o etanol e 4,6% para o diesel.

A economista Cláudia Moreno, do banco C6, enxerga que, com os efeitos da redução de imposto saindo de cena, a inflação em acumulada em 12 meses volte a subir a partir do segundo semestre. A expectativa é de que o IPCA anualizado caia para cerca de 4% até junho depois chegue a 6% até o fim do ano.

Mesmo com alta no petróleo, situação internacional está indefinida

A Opep e seus aliados anunciaram, no início do mês, um "corte surpresa" na produção, de 1,6 milhão de barris de petróleo ao dia. O movimento foi uma resposta ao governo dos Estados Unidos, que está atrasando a recomposição dos estoques estatais de óleo.

O analista de petróleo da hEDGEpoint Global Markets, Heitor Paiva, avalia que ainda não se sabe se a medida irá criar um persistente aumento nos preços do petróleo. “As expectativas de recessão permanecem elevadas à medida que os juros estão elevados mundialmente”, informa em relatório.

Por trás da alta está a intermediação de um acordo, liderado pela Arábia Saudita, com outros países, para cortar voluntariamente a oferta em 1,1 milhão de barris por dia a partir de maio, complementado por um corte de 500 mil barris diários por parte da Rússia a partir deste mês.

"Eles querem manter elevados os preços da commodity em meio a um cenário em que União Europeia e Estados Unidos planejam políticas para restringir a produção de veículos a combustão", diz Medina.

Também há dúvidas no ar. Paiva afirma que ninguém sabe se todos os membros da Opep e seus aliados seguirão a orientação saudita para realizar o corte. Mesmo assim, a Administração de Informação de Energia dos Estados Unidos (EIA, na sigla em inglês) elevou suas previsões do preço do petróleo tipo Brent para 2023 em 2,5%, para US$ 85 o barril.

Um impacto, entretanto, é conhecido. “Os mercados financeiros estão revisando suas expectativas de inflação a curto prazo, já que os preços do petróleo subiram significativamente com as notícias”, diz o analista da hEDGEpoint.

Ele ressalta que há dúvidas de que a mudança de postura por parte da Opep e de seus aliados será capaz de manter os preços do petróleo elevados no curto prazo. Há duas razões para isso:

  • a intenção do cartel do petróleo não era criar um rali das cotações, mas sim, um piso artificial para os preços do petróleo. Os Estados Unidos tinham se comprometido a reabastecer os estoques estatais quando os preços atingissem US$ 70 por barril, mas adiaram, na semana passada, essa estratégia em um ano. Os sauditas se sentiram traídos;
  • as expectativas de recessão nas principais economias globais estão mais evidentes. Depois de um crescimento de 2,7% no ano passado, a expectativa do Fundo Monetário Internacional (FMI) é de que elas cresçam 1,3%, em 2023, e 1,4%, em 2024. Para este ano, a projeção é de retração nos PIBs da Alemanha (-0,1%) e do Reino Unido (-0,3%).

O chefe de pesquisa econômica do banco suíço Julius Baer, Norbert Rücker, acredita que o evento, provavelmente, representa um elemento que parece destinado a moldar o período atual do mercado de petróleo: “A intenção é sustentar os preços e, consequentemente, a receita em petrodólares”.

O especialista aponta que o mercado de petróleo parece bem equilibrado e sem necessidade de intervenção. “As tensões geopolíticas entre o Ocidente e as petronações se intensificaram em consequência da guerra na Ucrânia, sanções contra a Rússia, antipatias entre os líderes e outros motivos”, diz.

Para ele, essas tensões mais parecem trazer comportamentos “erráticos, míopes e egoístas” de ambos os lados. “A geopolítica é antes um elemento de choque de curto prazo, semelhante ao clima”, diz Rücker.

Outra questão é que a China, como um dos maiores importadores, está exposta negativamente aos preços do petróleo. E estados "párias", como Irã e Venezuela, estão aumentando as exportações, à medida que mercados emergentes buscam preços mais em conta, o que contribui para desafiar a hegemonia das principais nações produtoras de petróleo.

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