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Siona Boiko Alves da Silva, diretora e proprietária da escola de educação infantil e ensino fundamental Santo Anjo, que atualmente tem três sedes e cerca de 200 funcionários | Aniele Nascimento/Gazeta do Povo
Siona Boiko Alves da Silva, diretora e proprietária da escola de educação infantil e ensino fundamental Santo Anjo, que atualmente tem três sedes e cerca de 200 funcionários| Foto: Aniele Nascimento/Gazeta do Povo

Virtudes

O relacionamento depende da confiança

De todas as atividades exercidas por um diretor no dia a dia, o atendimento aos pais, alunos e professores é certamente a que exige mais tempo e é também de onde surgem os conflitos mais relevantes. Se a capacitação técnica é indispensável para o bom andamento dos processos administrativos, são as qualidades individuais que fazem diferença no relacionamento com públicos tão distintos.

O doutor em Educação e pesquisador pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) João Malheiro aponta alguns elementos essenciais para quem deseja se tornar um diretor virtuoso. "O principal é merecer a confiança de seus subordinados, fruto da boa autoridade, que é o saber publicamente reconhecido", explica Malheiro. Segundo o pesquisador, um diretor consegue mais cooperação quando mostra que entende do que fala do que quando lembra às pessoas ao seu redor o que pode fazer com sua autoridade. "A sabedoria é a grande qualidade de quem deve mandar. E ela não vem só dos anos de vida, mas do hábito de refletir sobre os problemas e encontrar soluções verdadeiras", diz.

A habilidade do diretor no relacionamento com sua equipe é testada principalmente em momentos de crise, quando surgem divergências em relação a métodos de trabalho ou linhas de pensamento. De acordo com Malheiro, ao lidar com situações tensas é indispensável a quem tem autoridade manter o respeito por aqueles que pensam do forma diferente. "A base de qualquer diálogo amistoso é sempre a humildade intelectual e a moderação das paixões", afirma. Ele acrescenta que boa parte dos impasses pode ser evitada se houver clareza nos princípios e objetivos educacionais que regem a escola.

O desafio de sempre agir com justiça também é citado como a maior preocupação de Siona Boiko Alves da Silva, diretora e proprietária da escola de educação infantil e ensino fundamental Santo Anjo. Com apenas 11 anos de existência, o projeto que começou como um pequeno centro de educação infantil, com uma só professora, hoje tem três sedes. Atualmente são cerca de 200 funcionários e desde o início deste ano a escola passou a ser bilíngue. "Uma dificuldade a ser enfrentada é atender expectativas diferentes, desde o casal jovem cheio de insegurança que traz o primeiro filho até aqueles que exigem qualidade e profissionalismo", diz Siona, que entre todas as obrigações que o cargo lhe impõe, admite dar prioridade ao relacionamento com os pais. "Eu me envolvo em tudo, mas não me afasto das crianças. O atendimento às famílias está em primeiro lugar", afirma.

  • Renato Casagrande, pró-reitor de graduação e professor de Gestão de Instituições Educacionais da UP: a administração de escolas no Brasil ainda é amadora

Saiba como a discussão sobre o tema evoluiu e qual o impacto que tem na vida dos estudantes

Ele está à frente de professores, pedagogos e funcionários, é o principal receptor de reclamação dos pais, precisa lidar com alunos indisciplinados, cumprir prazos de processos burocráticos, representar a instituição em entidades de classe e responder às autoridades públicas por tudo o que acontece na escola. É difícil elencar todas as atividades exercidas por um diretor, mas facilmente se conclui que a qualidade de uma escola está diretamente vinculada à capacidade de quem a dirige.

São muitos os fatores que explicam por que a educação no país ainda apresenta índices tão ruins, mas especialistas são enfáticos ao afirmar que a profissionalização do cargo de diretor no Brasil demorou a ocorrer, e a falta de bons gestores é uma das causas essenciais para uma série de problemas.

A Gazeta do Povo ouviu analistas e diretores das redes pública e privada que falaram sobre capacitação, dramas cotidianos e o desafio de se equilibrar entre temas pedagógicos, administrativos e de relacionamento. Confira a seguir o que eles têm a dizer.

Profissionalizar a gestão ainda é um desafio

Há cerca de 20 anos, termos como visão estratégica ou excelência em gestão eram completamente estranhos à área de educação no Brasil e os próprios profissionais do setor os vinculavam a ambientes empresariais. Com o aperfeiçoamento dos índices de medição de aprendizagem, o lento desenvolvimento da educação brasileira ganhou números, foi comparado e superado por sistemas de países em condições semelhantes. A evidência dessa fraqueza aproximou profissionais da área de ferramentas administrativas para a superação de resultados, alcance de metas e objetivos.

Hoje a gestão escolar enfim se tornou tema frequente nas discussões da área, mas sua aplicação concreta ainda deixa a desejar. Segundo Renato Casagrande, pró-reitor de graduação e professor do curso de especialização em Gestão de Instituições Educacio­nais da Universidade Positivo, a administração de escolas no Brasil, especialmente na rede pública, ainda é bastante amadora. "Os gestores eleitos raramente têm preparo, são escolhidos por serem populares e as ações tomadas funcionam na base da tentativa e erro, sem profissionalismo", constata o professor. Para Casagrande a própria legislação é uma das causadoras do problema, já que impõe às escolas que escolham o diretor entre os membros do corpo docente, sem a possibilidade de trazer alguém capacitado de fora.

Mandatos curtos e trocas constantes na direção são outros problemas que tornam mais difícil a prática de uma gestão eficiente na rede pública. "Às vezes um diretor que fez oposição ao anterior assume, então começa tudo do zero, sem rotina, sem método e sem sistema. Isso compromete o cargo", diz Casagrande.

Treinamento

Capacitar um professor comum para assumir funções administrativas é o objetivo dos cursos fornecidos por secretarias de educação em todo o país, mas uma recente pesquisa promovida pelo Centro de Desenvolvimento Humano Aplicado (Cedhap) e divulgada pela revista Nova Escola revelou que os diretores entrevistados consideram os conteúdos tratados excessivamente teóricos, pouco úteis para ajudar a enfrentar demandas do dia a dia e que, nestes treinamentos, falta espaço para troca de experiências.

Mesmo nas universidades, somente aqueles que chegam à especialização obtêm formação necessária para a direção escolar. Os cursos de graduação em Pedagogia, que já foram os prediletos por quem almeja o cargo, dão pouco espaço a conteúdos mais voltados à administração em seus currículos. De acordo com a professora de Pedagogia da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) Romilda Teodora Ens, essa é uma questão levantada com frequência na área. "O curso já formou administradores escolares, mas hoje é bastante voltado para a docência, com uma ênfase muito pequena para a gestão", conta Romilda.

Para quem pretende ir além da capacitação formal em cursos, as fundações Lemann, Victor Civita e Carlos Chagas oferecem considerável material de apoio, mas o empenho individual de aperfei­çoar a própria atividade faz toda a diferença. É o que defende Heloísa Lück, diretora do Cedhap e autora de diversas obras na área de gestão educacional. "Uma iniciativa pessoal nesse sentido começa pela construção de um portfólio, com observações de trabalho e reflexões sobre o que funciona ou deixa de funcionar", sugere.

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