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Pesquisadores mostraram – e os professores já sabiam – que crianças em idade escolar expostas à violência na vizinhança podem ter um aprendizado mais difícil, experimentando mais estresse e depressão do que colegas que vivem em bairros seguros.

Mas um sociólogo da Universidade Johns Hopkins descobriu que as consequências da violência no bairro chegam mais longe do que se sabia anteriormente, atingindo até mesmo estudantes que vêm de bairros seguros. Usando dados sobre criminalidade e estudantes de Chicago, Julia Burdick-Will ligou a exposição à violência nos bairros a uma queda em resultados das provas, um efeito que se estendeu aos estudantes vindos de comunidades que sofreram pouca ou nenhuma violência. 

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“Os efeitos individuais podem realmente ser a ponta do iceberg ... poderíamos ver esse efeito nas escolas em mais do que apenas o garoto que vivia na esquina de onde aconteceu um homicídio”, diz Burdick-Will, uma professora assistente que estuda escolas urbanas.

Suas descobertas foram publicadas no periódico Sociology of Education. “Você pode detectar o que parece ser o efeito de exposição de um colega de classe à violência em todos na sala de aula.” 

As escolas reconhecem cada vez mais o trauma como um fator que pode estar atrapalhando o aprendizado, com mais distritos treinando educadores sobre como ensinar alunos que podem estar lidando com eventos traumatizantes. E não é apenas a violência que pode trazer consequências: a vida familiar instável e os desastres naturais que afetam a vida de um estudante cobram seu preço. 

Alex King, um ativista de 17 anos de Chicago, sabe em primeira mão como a violência na comunidade pode tornar o aprendizado desafiador. King cresceu cercado pela violência armada. Um ano, o seu sobrinho foi morto no primeiro dia de férias. King ajudou a organizar a Marcha pela Paz do Fim de Ano Escolar em Chicago com sobreviventes do tiroteio na escola em Parkland, na Flórida, e descobriu naquela noite que um amigo havia sido morto. 

“Fui baleado várias vezes. Perdi família e amigos para a violência”, conta King. “Isso meio que se tornou parte da vida, violência. É algo do qual você não pode escapar”, continua. 

Recém graduado no ensino médio, ele planeja ir para a Universidade Grand Valley State, em Michigan. 

King conta ter sido baleado enquanto caminhava com um grupo de amigos, um incidente que o deixou deprimido e assustado. Ele relembra que alguns professores foram compreensivos, mas sentiu que outros não tinham empatia. 

“Foi difícil me concentrar. Minha mente estava no incidente que ocorreu e não na escola na época. Pensava muito o dia todo sobre o que tinha acontecido”, diz. 

Burdick-Will analisou dados de calouros nas escolas públicas de Chicago entre 2002 e 2010 e examinou os resultados dos testes deles ao longo do tempo. Levando em conta outros fatores, ela descobriu que classes com maior proporção de alunos de bairros violentos tiveram desempenho pior do que as classes com menos desses alunos.

Por causa das políticas de escolha escolar de Chicago, os alunos de uma mesma escola podem vir de bairros muito diferentes, permitindo que Burdick-Will examinasse os efeitos de frequentar uma escola com uma alta proporção de estudantes de bairros violentos. 

Ela levantou a hipótese de que esse “efeito de pares” ocorre porque estudantes que vivem no meio da violência podem ser mais desordeiros e menos engajados, problemas com os quais os professores têm de lidar com pouca assistência dos conselheiros. 

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“Quando você tem jovens que estão estressados e potencialmente respondendo de forma exagerada ou apenas chateados e traumatizados e precisando da atenção dos professores ... isso afeta todos os alunos da sala de aula”, explica a pesquisadora.

Burdick-Will diz que espera que seu trabalho incentive as escolas a concentrarem mais recursos nos estudantes que retornam aos bairros violentos quando saem da sala de aula, oferecendo apoio de longo prazo, em vez de apenas responder às tragédias. Mas ela também espera que isso não force os distritos a isolarem esses estudantes, algo que só amplificaria o impacto do trauma. 

“Há muitas crianças neste país e crianças nesta cidade que estão expostas a essas coisas todos os dias. O que elas realmente precisam é de muito apoio social constante”, afirma. 

King quer que os educadores sejam mais empáticos ao lidar com estudantes que possam estar sofrendo de estresse relacionado ao testemunho da violência. Ele tinha um conselheiro diferente a cada ano do ensino médio, e às vezes sentia que seus professores não entendiam o que estava passando. 

"Quando alguém é impactado por um evento traumático, a melhor coisa que você pode fazer é estar lá", pondera. 

Burdick-Will espera que seu trabalho leve os formuladores de políticas de todos os tipos de comunidades – incluindo as seguras – a lidar com a violência urbana. 

“Se os efeitos da violência podem ser sentidos nas escolas de toda a cidade, então reduzi-la deve se tornar algo que é importante para os moradores e formuladores de políticas em todos os bairros, não apenas aqueles com as maiores taxas de criminalidade. De fato, reduzir a violência na cidade pode beneficiar um número muito maior de estudantes do que poderia parecer superficialmente”, escreveu a pesquisadora em seu relatório. 

“É isso que eu quero que as pessoas aprendam com isso – que um problema em outro lugar afeta a todos", conclui Alex King. 

Tradução: Helen Mendes 

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