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Entrevista com Eduardo Chaves, Professor de Filosofia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e consultor de Educação da Microsoft.

O método de ensino tradicional todo mundo conhece. Na hora marcada, os alunos são agrupados em sala de aula, onde o professor explica os conteúdos de forma igual para todos. Os assuntos são divididos por disciplinas e ao final do período escolar, os estudantes retornam para casa e só no dia seguinte voltam a aprender. Para o professor Eduardo Cha­ves, consultor em educação da Mi­­crosoft, esse modelo de instrução foi construído para servir à sociedade industrial e não funciona mais para as crianças e os jovens de hoje, que pertencem à chamada sociedade da informação.

Chaves afirma que a educação não se esgota no período de permanência na escola, defende a diminuição dos conteúdos ensinados e diz que o ensino deve se focar na vocação de cada estudante. Confira os principais trechos da entrevista concedida pelo professor ao caderno Educação e Ensino.

No livro Tecnologia e educação: o futuro da escola na sociedade da informação, o senhor afirma que a escola ainda está adaptada à sociedade industrial, um modelo que não existe mais. Que características deveria ter uma educação considerada inovadora?

Passamos por uma série de mudanças que encerraram aquele modelo industrial da sociedade e introduziram a sociedade da informação. Não está muito claro ainda quais são as características que vão prevalecer, mas está claro que aquele modelo antigo não vai funcionar na situação atual. A vida da gente foi estruturada durante a sociedade industrial em estágios: até os 7 anos nós brincávamos, dos 7 aos 21 aprendíamos, e até os 65 trabalhávamos. Mesmo durante o dia, havia as horas em que nos divertíamos e as horas em que tínhamos de trabalhar. Dentro da escola, temos o momento das aulas, em que supostamente aprendemos, e temos o intervalo. O que aconteceu na sociedade é que esses limites entre diversão, trabalho e aprendizado ruíram. Temos de encontrar fórmulas para que os jovens aprendam fazendo coisas que para eles são interessantes. A escola inovadora também terá de ser um lugar onde façamos coisas reais, e não problemas inventados por professores. Precisamos lidar com questões que nos preocupam, que nos interessam.

Muito se fala sobre a necessidade de uma educação personalizada. Como é possível colocar em prática esse modelo de ensino?

Somos diferentes, temos interesses diferentes, estilos de aprender diferentes. Na educação personalizada você tem de perguntar para o estudante o que ele gosta de fazer e sobre o que gostaria de saber mais. Você pode até não parar nesses interesses, mas tem de levá-los seriamente em conta, porque é o interesse que promove a diversão. É preciso construir em cima dos pontos fortes da criança. Na escola tradicional, todo mundo tem de ser mais ou menos igual, saber as mesmas coisas. Se eu sou bom em português e literatura, mas sou ruim em matemática, o professor fala assim: não estude tanto Português e Literatura, vá estudar um pouco mais de Matemática, porque é aí que você é fraco. A educação personalizada é aquela que leva a sério o projeto de vida de cada um.

Mas as crianças quando entram na escola não são muito novas para fazer essa escolha?

Nunca é cedo para você trabalhar essas coisas. E a gente sempre pode mudar. Eu mesmo mudei de interesse muitas vezes. Iria ser pastor e acabei virando professor universitário. A vida inteira estamos fa­­zendo mudanças de rumo no nosso projeto de vida. Às vezes elas são mais drásticas, às vezes menores. O principal desafio da educação é nos ajudar a definir um projeto de vida e a transformar esse projeto em realidade.

No caso de uma mudança drástica de rumo profissional, a educação personalizada, direcionada, não poderia atrapalhar?

Eu fiz o curso clássico de antigamente (há aproximadamente quatro décadas, o ensino médio era dividido em três cursos, de acordo com a área de interesse do estudante: científico, normal e clássico), que quase não tinha conteúdo de matemática e física. Eu estudei Português, Inglês, Francês, Latim, lógica, Psicologia, História. Para mim, foi algo extremamente positivo. A Matemática e a Física que eu não estudei nunca me fizeram falta, porque eu nunca me interessei por coisas em que essas disciplinas fossem importantes. Se tivessem me obrigado a estudar física desde cedo, pode até ser que eu tivesse me interessado. Mas acredito que as pessoas têm dons, talentos em determinadas áreas e elas não são totalmente flexíveis para eu dizer que qualquer um pode se tornar um grande físico se for criado um ambiente favorável.

O currículo escolar deveria ser modificado?

A escola hoje dá aulas separadas de Língua Portuguesa, Mate­mática, História, mas tem que trabalhar temas transversais e competências. E dificilmente dá certo. Não há tempo disponível e os professores não estão preparados. O currículo, não há a menor dúvida, tem de mudar. E tem de mudar esquecendo essas disciplinas e se focando em competências. O que eu preciso para ser bem-sucedido no modelo de sociedade que temos hoje? Preciso saber conviver com os outros, respeitar seus direitos, ouvi-los, negociar objetivos, resolver conflitos, administrar o tempo, preciso me comunicar com razoável fluência na língua materna e em mais uma ou duas línguas. Tudo isso é competência.

Não se está jogando responsabilidade demais para a escola?

Estão jogando responsabilidade demais nas escolas porque elas não se livram do que vinham fa­­zendo e não precisam mais fazer. A escola gasta 75% do seu tempo dando informações que os alunos podem achar hoje com facilidade na internet.

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