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Ministro da Educação, Mendonça Filho | José CruzAgência Brasil
Ministro da Educação, Mendonça Filho| Foto: José CruzAgência Brasil

Em julho de 2016, o Escola sem Partido encaminhou ao MPF de Pernambuco uma representação para que fosse apurada a prática de ato de improbidade administrativa pelo reitor Anísio Brasileiro e outros professores da UFPE, tendo em vista a realização, nas dependências da universidade, de um evento intitulado “Volta, Dilma”. Na época (17/06/2016), o portal G1 noticiou:

O auditório lotado (240 lugares) parecia ser regido a cada pontuação de Dilma. Eram gritos de ‘Fora Temer’, ‘Temer golpista’, ‘Dilma guerreira da pátria brasileira’ e ‘Fora Mendonça’. Quem não conseguiu entrar, acompanhou todo o discurso em um telão montado do lado de fora.

Segundo reportagem do Diário de Pernambuco, o reitor foi o primeiro a discursar, e pediu a volta da presidente afastada. “Que a coragem que lhe marca nunca lhe falte, e seja sempre sua companheira’, disse o reitor. 

A representação, todavia, foi arquivada. A despeito do caráter obscenamente político-partidário do evento, o MPF não viu nada de errado no “Volta, Dilma”. A Procuradora da República Silvia Regina Pontes Lopes entendeu que a manifestação a favor da “ex-presidenta” (sic) estava amparada pela autonomia didático-científica da universidade (!), e a participação do reitor e demais professores, pela liberdade de expressão (!). 

O Escola sem Partido recorreu, mas o arquivamento foi mantido pela 5ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF. Relator do caso, o Procurador da República Renato Brill de Goes afirmou:

Não vislumbro que a participação do Reitor, bem como a dos professores da UFPE, no evento denominado ‘Volta, Dilma’, bem assim a disponibilidade das instalações da Universidade para realizar o mencionado evento, tenham dado azo a condutas ímprobas (...) Ademais, tenho que a disponibilização do Centro de Ciências Sociais Aplicadas (CCSA) da UFPE para a promoção daquele evento não se consubstancia em patrimonialismo, uma vez que o referido episódio decorre da autonomia didático-científica daquela repartição pública. 

Pois é. Difícil saber o que é mais grave: o uso escancarado de uma universidade pública em benefício de um partido político, ou o vergonhoso acobertamento desse uso pelo Ministério Público Federal. 

Na semana passada, foi a vez do Ministro da Educação, Mendonça Filho, recorrer ao MPF contra outro episódio do gênero: a criação, no departamento de Ciência Política da UnB, de uma disciplina intitulada “O Golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil”. Como se vê pelo título, corroborado pela ementa, o objetivo da disciplina é promover a narrativa petista do impeachment dentro da universidade e falar mal dos adversários do PT. Um escândalo. Novamente, porém, o princípio da autonomia universitária e a liberdade de cátedra foram invocados na defesa do indefensável. 

Ora, a autonomia de que gozam as universidades é didática e científica (CF, art. 207), não política e partidária. E é para servir à ciência, não ao extravasamento de paixões políticas, que existe a liberdade de cátedra. A Constituição não permite que a máquina do Estado seja usada para favorecer ou prejudicar esse ou aquele partido ou grupo que disputa o poder na sociedade.

Esse uso ameaça o regime democrático ‒ que o MP tem o dever constitucional de defender ‒, na medida em que desequilibra o jogo político em favor de determinados competidores. O artigo 117, V, da Lei 8.112/90, aplicável a todos os professores das universidades federais, estabelece que é vedado ao servidor público “promover manifestação de apreço ou desapreço no recinto da repartição”. Mais claro, impossível. E, para terminar, é evidente que nenhum funcionário público desfruta do direito à liberdade de expressão no exercício do cargo. 

Mesmo assim, é possível antever claramente a gaveta do MPF já aberta, à espera da representação de Mendonça Filho. O próprio ministro, ciente do aparelhamento da instituição, cuidou de provocar também a AGU, a CGU e o TCU, para ver se, afinal de contas, alguém toma alguma providência contra mais essa afronta à Constituição e à democracia. 

Seja como for, não deixa de ser auspicioso ver Mendonça Filho tentando coibir o uso político e partidário de uma universidade. É só isso o que nós, do Escola sem Partido, também queremos: que a Constituição e as leis sejam respeitadas dentro dessas diminutas mas importantes frações do território nacional que são as escolas e as universidades.

*Coordenador da Associação Escola Sem Partido

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