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Edson Neves, fundador do Instituto de Mediação e Arbitragem de Curitiba | Antônio More/ Gazeta do Povo
Edson Neves, fundador do Instituto de Mediação e Arbitragem de Curitiba| Foto: Antônio More/ Gazeta do Povo

Experiência

"Não há perdedores ou vencedores"

O psicólogo Edson Januário Neves é um experiente mediador de conflitos. Já trabalhou com o juizado especial de Curitiba e passou por poucas e boas para conseguir mostrar que uma desavença pode ser resolvida com a vitória de todos os lados. Hoje, ele trabalha com a Fundação de Ação Social, principalmente em divergências familiares, e no Sindicato da Habitação e Condomínios do Paraná. Fundador do Instituto de Mediação e Arbitragem de Curitiba, desde 1997 atua na área.

Segundo ele, o trabalho difere da atuação de um advogado ou juiz. "Na mediação, ambas as partes podem sair satisfeitas", conta.

"O maior problema é cultural. As pessoas estão configuradas para a briga e às vezes não compreendem que podem ganhar sem o outro perder", explica.

Em uma de suas mediações, uma idosa pediu na Justiça para receber dos filhos uma pensão. Na petição, a advogada teria indicado com detalhes a suposta negligência da família com a mãe. "Eles queriam até agredir a defensora pública. No final, resolveram sentar e conversar. Facilitei o diálogo. A mãe, na verdade, não queria pagamento. Ela queria é o reconhecimento dos filhos. No fim, todos se abraçaram e choraram", conta Neves.

Resultados

Minas tem programa semelhante

Um projeto em Minas Gerais conseguiu montar 11 núcleos com delegados conciliadores: oito em Belo Horizonte (BH) e três na região metropolitana. Implantado em 2007, o programa já tem resultados visíveis, de acordo com a coordenadora do Projeto Mediar, da Polícia Civil mineira, Letícia Gamboge. "A gente tem percebido uma queda grande de crimes de pequeno potencial ofensivo e em tentativas de homicídios", afirma.

Para suprir a necessidade de profissionais capacitados, a Academia da Polícia Civil mineira incluiu em sua grade curricular a matéria de mediação de conflitos. "Os policiais não aceitaram bem no começo, mas foi promovida uma mudança cultural com oficinas de sensibilização", conta a delegada. A ideia agora é expandir os núcleos para o interior e ampliá-los na região de BH.

O Projeto de Lei n.º 1.028/2011, em análise na Comissão de Segurança Pública da Câmara Federal, tem a pretensão de ser um marco no país na aproximação da polícia com a comunidade. A proposta concede a atribuição de mediador de conflitos, uma espécie de conciliador, ao delegado de polícia. Carregada de polêmica mesmo antes de ir à votação, a nova função pode conter a abertura de ações contra crimes de menor potencial ofensivo, como brigas e ameaças, que abarrotam as mesas das delegacias e dos juizados especiais. Mas tende a aumentar a sobrecarga de trabalho dos policiais.Segundo o relator do projeto, deputado federal Fernando Francischini (PSDB-PR), a ideia é colocar o delegado como uma figura que antecipe a solução do problema, para evitar que um pequeno conflito vire uma ação criminal ou um termo circunstanciado – procedimento para crimes com pena máxima de dois anos. "Às vezes demora meses ou anos para ocorrer uma audiência no juizado", afirma Francischini, ex-secretário municipal Antidrogas de Curi­­tiba. De acordo com ele, e com a própria Polícia Civil do Paraná, os pequenos delitos representam a maioria dos casos registrados no estado e no país. São problemas que poderiam não ter virado caso de polícia.

Se houver uma briga de vizinhos, por exemplo, um policial poderá ir até o local fazer o atendimento. Lá, terá a possibilidade de realizar um pré-termo circunstanciado – um documento de fé pública –, registrando o episódio, de acordo com Fran­­cischini.

Esse documento seria levado para a delegacia, evitando que os envolvidos precisassem se deslocar até a repartição. O caso seria analisado pelo delegado, que chamaria as partes para resolverem o conflito. A conciliação só começaria se todos os envolvidos concordassem com a intermediação do profissional. Resolvido o caso, o acordo seria validado após parecer do Mi­­nistério Público e homologação do juizado especial.

Polêmica

A Associação dos Magistrados do Paraná posiciona-se contra o projeto. O presidente da entidade, Gil Guerra, argumenta que a proposta apenas criará mais uma instância para resolver questões da alçada do juizado especial. "A polícia não tem es­­trutura nem para investigar. Além disso, esse projeto tem um aspecto inconstitucional", explica. Segundo Guerra, toda questão de conflito deve ser resolvida pelo Judiciário.

Para o psicólogo Edson Januá­­rio Neves, mediador de conflitos em Curitiba, o delegado não é a pessoa mais adequada para atuar na mediação: ele acredita que as pessoas enxergam esse profissional como alguém que pune e não que pode conciliá-los. "O delegado é uma autoridade do estado. Ele jamais será imparcial. As pessoas não abrirão os casos para eles", avalia. No dia 9 de novembro, a Comissão deve votar o relatório final do projeto, que seguirá para a Comissão de Constituição e Justiça e a votação em plenário.

Iniciativa auxilia na prevenção de crimes

O coordenador do Centro de Estudos da Violência da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Pedro Bodê, vê no projeto de lei uma boa possibilidade de aproximar o delegado de polícia da comunidade e prevenir que pequenos delitos se transformem em crimes. A ideia é que o mediador possa intervir antes que ameaças e brigas cresçam e virem tentativas de homicídios, lesões corporais graves ou até assassinatos. "É uma saída boa, desde que todos os envolvidos não tenham seu direito à defesa cerceado", avalia.

Outra ressalva é sobre o efetivo da polícia. Segundo Bodê, qualquer medida nova terá de ser acompanhada por investimentos em estrutura. "Só faz sentido se criar condições para que o projeto seja efetivo. Se não, será mais uma sobrecarga para o delegado", explica.

O delegado-geral da Polícia Civil, Marcus Vinicius Miche­­lotto, também aprova a iniciativa. "A polícia sempre foi o primeiro conciliador. Já chegamos a ser advertidos pela Justiça (por promover mediações informalmente), mas esse projeto vai aliviar o trabalho de todos", diz. A Asso­­ciação Paranaense dos Juízes Federais também considera que toda medida que desburocratize a conciliação é bem-vinda. "Va­­mos suprimir o aumento da demanda de procedimentos e audiências, que demoram muito", afirma o presidente da entidade, Anderson Furlan.

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