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Com Mauro Madureira à frente, a comemoração por um gol do Colorado: o ambicioso Seleboca deu poucos motivos para a torcida comemorar | Arquivo/ Gazeta do Povo
Com Mauro Madureira à frente, a comemoração por um gol do Colorado: o ambicioso Seleboca deu poucos motivos para a torcida comemorar| Foto: Arquivo/ Gazeta do Povo

"Era uma seleção", garante o ex-centroavante Geraldão. "Um time muito bom, técnico e unido", lista o ex-atacante Jaiminho. "Foi uma experiência excepcional para mim", confessa o ex-lateral Dida. "Sem dúvida, está entre os grandes momentos do futebol paranaense", diz o ex-zagueiro Caxias.

Somente com adjetivos acima o Seleboca – apelido dado ao Colo­­rado, graças às inúmeras contratações de impacto para o Estadual de 1984 – acha justo ser lembrado. Mas há exatos 25 anos, depois da última partida do lendário time, a imagem guardada se apega à frieza dos números: um fracasso.

No dia 6/12/84, com apenas 121 pagantes no Estádio Couto Pereira, a trajetória do time recheado de me­­dalhões, idealizado para ga­­nhar fácil o regional, terminava de forma melancólica – abandonado pela torcida, sem o sonhado tí­­tulo e com a pecha de fiasco. Fi­­cou de legado o enorme passivo financeiro pela aventura frustrada.

Sob o comando dos já falecidos dirigentes Aziz Domingos, Enzo Scaletti e Hélio Alves (nesta ordem de importância), investiu-se na formação do escrete – segundo relatos de jornais da época – 800 mi­­lhões de cruzeiros. À época, um apartamento no Água Verde com 130 metros quadrados custava na faixa de Cr$ 40 mil.

Desembarcaram então na Vila Ca­­panema, entre outros, o goleiro Marolla, vice-campeão brasileiro pelo Santos; o lateral Orlando, destaque do Atlético-MG; Carlão, do Palmeiras, Mauro Pastor e Geral­­dão, ambos do Internacional; Júlio César, Flamengo; Jaiminho e Gassen, São Paulo; Eudes e Mauro Madureira, Cruzeiro; e até o uruguaio Anzorena, que tinha o cartaz de ter defendedido o selecionado celeste.

Após 39 partidas, as estrelas do Boca-Negra, a alcunha oficial do Colorado, contabilizaram resultados minúsculos: 17 vitórias, 13 empates e 9 derrotas, com 41 gols marcados e 28 sofridos. A alegria solitária acabou sendo a conquista do segundo turno. No adeus, perdeu por 2 a 0 para o Coritiba e terminou o ano na terceira posição – atrás do Coxa (segundo) e do surpreendente Pinheiros (campeão).

Mas as estatísticas não traduzem em nada o significado do ‘Seleboca’. Cansado de tropeços (o Tricolor havia sido vice do regional em 74, 75, 76, 79 e 82, além de dividir o título de 80 com o Cascavel), os dirigentes decidiram agitar o cenário local. E conseguiram. Em alusão ao ‘Selebota’ de 71, grande time do Botafogo, a imprensa logo batizou o time de boleiros conhecidos.

Na estreia, um amistoso com o América-RJ, no Alto da Glória, em 18/5, vitória por 1 a 0, registrou-se um público de 8.496 (renda de Cr$ 24.691,00). Graças à empolgação do momento, os jogadores re­­ceberam Cr$ 300 mil de bicho logo no vestiário.

"O ‘Seleboca’ causou um im­­pacto muito grande", lembra Ge­­raldão, 60 anos, um dos grandes investimentos para a montagem do elenco, agora professor de futebol para crianças em São Paulo. "Nossa equipe era sensacional. Até hoje encontro ex-companheiros e não esquecemos 84. Foi um grande momento, mesmo."

"Um time com atletas renomados era raridade em Curitiba. Apenas o Atlético, décadas antes, com Belline e Djalma Santos, campeões mundiais, havia arriscado dessa forma", compara Ca­­xias, 51 anos, trazido junto ao Bo­­tafogo. "Eram jogadores de muita qualidade, mesmo em fim de carreira, fazendo a curva para baixo", pondera Dida, 44 anos, um dos poucos pratas da casa.

O são-paulino Jaiminho, 49 anos, também instrutor de escolinhas na capital paulista, toca na ferida do badalado grupo. "Minha maior lembrança é a perda do título. A equipe era muito boa. Não foi à toa que acabou com o apelido de ‘Seleboca’. Perdemos numa bobeira", cita ele, famoso entre os colegas por entre um jogo e outro flertar com a chacrete Rita Cadilac. "É verdade. Uma musa da época", con­­firma, orgulhoso.

A referência é o jogo da penúltima rodada contra o Pinheiros, também no Couto Pereira. Na­­que­­la semana, choveu praticamente todos os dias, assim como na hora da partida decisiva do quadrangular final. Os jogadores pediram para não entrar em campo, mas não tiveram voz. O presidente Aziz Domingos teria sido o responsável pelo não adiamento do duelo – a versão tem controvérsias.

"Perdemos um jogo que jamais deveria ter acontecido. No fim, com o campo todo alagado, não tivemos chance", assegura Dida. "Demos azar. Foi um jogo bobo. A semana toda choveu, mas quem quis a realização do confronto foi o nosso treinador, um cabeça oca, o Diede (Lameiro)", contesta Ge­­raldão.

A falta de uma volta olímpica maculou a ousadia do time da Vila. Uma pretensão que não ocorria só dentro de campo. Chegou-se a anunciar um amistoso com o Bar­­celona, da Espanha. Os catalães jo­­­­gariam na Colômbia e depois com o Palmeiras. Se encontrassem espaço na agenda, viriam a Curi­­tiba. O sonho virou manchete dos jornais – não mais do que isso.

Para bancar esse complexo de grandeza, a diretoria tinha um trunfo: a promoção Cartelão de Ouro, um sorteio mensal de um Ford Del Rey, principal carro de luxo da época. Devido à estratégia, manteve-se praticamente em dia com a remuneração dos jogadores.

Com a dissolução do ‘Seleboca’, o Colorado entrou em um período pré-falimentar. Pouco ganhou de dinheiro com a venda de atletas e algumas apostas até foram desvalorizadas. No ano seguinte, a associação disputou o rebaixamento do Paranaense. Muito da culpa seria da piada-pronta (ou coragem) que virou 84. O fim anunciado veio no dia 19/12/89, após a fusão com o Pinheiros e a criação do Paraná.

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