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Conheci muitos torcedores apaixonados, mas poucos com a inocência, a sinceridade e o amor que Ivan Pereira dedicou ao Atlético.

Vizinho da Baixada desde cedo, ele passou a frequentar os treinos e, em seguida, a jogar de goleiro na base, muitos anos no aspirante, até que se tornou titular com a aposentadoria dos lendários Caju, "A Majestade do Arco" e Laio, "A Fortaleza Voa­­dora". Chegou a ser convocado para a seleção paranaense: "O técnico era o uruguaio Félix Magno, do Coritiba, meu faixa na noite, pois jogávamos baralho juntos e me chamou porque não confiava nos outros goleiros".

Assim foi Ivan, simples, brincalhão, conhecedor de futebol e eternamente apaixonado pelo Atlético, cujos personagens ilustres marcaram a sua vida: "No meu tempo o clube tinha muita gente de classe, como os Guimarães, os Viana, os Maeder, Capitão Manoel Aranha, Itaciano Marcondes, Aníbal Requião, Abílio Ribeiro, Silzeu Pereira Alves, mas também tinha muita porcaria metida a besta. Por isso, passamos tanto tempo sem títulos, mesmo gastando rios de dinheiro. Muito amadorismo e incompetência".

Boêmio inveterado, como jogador armou muitas dentro de campo, como torcedor acompanhou o Furacão por todos os cantos. Até poucos dias antes de adoecer, marcava presença nas cadeiras da Arena da Baixada sempre com os mesmos companheiros do jogo de palitos na Boca Maldita. Bem, a Boca Maldita foi a extensão do seu lar, já que morava no edifício Tijucas e descia para tomar café e fofocar como se estivesse no jardim ou no quintal de sua casa.

Joia rara como figura humana, Ivan ajudou muita gente e enriqueceu o folclore do futebol e da cidade. Há muitos anos, com uma dorzinha no peito, queixou-se para os amigos médicos que foi encontrando nos cafés da rua XV naquela manhã ensolarada. Falava do incomodo e recebia receitas de médicos do nível de Félix Rego Almeida, Julio Gomel, doutor Tarlê e outros. No dia seguinte lhe perguntaram se havia tomado o medicamento e, distraidamente, respondeu: "Ah deixa pra lá, a dor passou. Tomei um chá que o Pernambuco me indicou. É receita da avó dele...". Pernambuco era o principal engraxate da Boca Maldita.

Tendo mudado de cama, queixou-se de que ainda não estava acostumado com o colchão e de madrugada caia no chão. O inseparável Caibem alertou que ele precisava tomar cuidado, afinal já havia passado dos 80 anos: "Sou malandro, sei cair, eu fui goleiro!"

O professor Tupy Pinheiro, diretor do Atlético, mesmo não enxergando direito, ia ao vestiário palpitar depois dos jogos. Após uma derrota para o Ferroviário, o professor puxou Ivan pelo braço e cochichou: "Guará, você não acha que o Ivan falhou no gol deles?" Sempre gentil, ele respondeu: "Acho que sim professor, o Ivan anda mesmo meio fora de forma".

Adeus amigo Ivan. Foi um privilégio tê-lo conhecido.

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